quarta-feira, 11 de setembro de 2013

A árvore encantada

Cresceu sem ninguém dar por ela, ao fundo do jardim, num piscar de olhos. Perguntaram ao jardineiro que árvore era aquela e quando é que fora plantada.

-Não faço a mínima ideia, não fui eu que a plantei.. – ele bem suspeitava de quem tinha sido, mas não  se atrevia a dizê-lo - nunca vi nenhuma igual…Sei que é encantada e mais nada…

-Como assim? -  espantou-se a directora do refúgio infantil.

- Quando as crianças se acolhem à sua sombra e lhe fazem pedidos, ela escuta-os… -respondeu o jardineiro

A directora olhou-o, incrédula. Afastou-se dois passos e tornou a olhá-lo, certificando-se de que ele estava mesmo à sua frente e que o ouvira bem.

-Está a dizer-me que ela ouve as crianças?

-Sim…

Sempre achara aquele jardineiro um bocado estranho. Ela sabia que ele fora ensinado por uma antiga professora que repreendia os trovões, ralhava com o diabo e a quem os deuses temiam quando saiam da linha. Já o vira a falar com as plantas, fazer-lhes festas, cantar e colocar-lhes música para que a escutassem. Agora ele queria convencê-la de que a árvore escutava as crianças e acedia aos seus pedidos!?

No dia seguinte, ao ver os gaiatos protegerem-se do sol sob a frondosa copa, foi, pé ante pé, colocar-se à escuta.

-Com o calor que está, sabia-me bem uma laranja… - disse um dos miúdos.

E a árvore inclinou-se um bocado e apresentou-lhe uma enorme e suculenta laranja.

-E a mim, um morango, imaginem só… – disse a medo outro.

A directora arregalou o olho. Um morango!? Em Agosto e sem ser de estufa!? Uma árvore que não é uma laranjeira e dá laranjas?

E o morango surgiu, grande e limpo, ao alcance da mão do petiz.

A senhora sacudiu a cabeça. Beliscou-se, certificando-se que estava acordada. Mas o que se passa aqui? Interrogou-se e resolveu tirar a limpo a situação:

-Eu queria uma banana… - pediu com uma vozinha, imitando os petizes, escondida dos seus olhares.

E a árvore inclinou-se e ofereceu-lhe uma enorme banana.

A directora estendeu a mão e quando ia colher o fruto pedido, um ramo juntou-a aos pequeninos e disse:

-Junto deles conseguirá tudo…

E o jardineiro sorriu e disse para os seus botões:

-Será que consigo enxertá-la noutros jardins? Isto só pode ser obra da minha tutora. Até tremo quando me lembro do trovão, que teve que engolir o som, para não assustar os seus meninos! Do diabo que fugiu a sete pés quando quis intrigar e, da corrida que deu aos deuses da discórdia, quando se quiseram instalar na escola sob o pretexto de ser o melhor caminho!

E nesse mesmo dia, o jardineiro só parou depois de enxertar todas as árvores das escolas da cidade.

Na tua escola há alguma árvore que fale?

Não deixes que a cortem!


Jorge C. Chora

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

A decisão

Ameaçaram-no e ele reagiu construindo uma muralha à volta da sua torre. Ao verem as medidas que implementara,  tornaram a fazê-lo, aumentando o tom e a dimensão da ameaça.

Respondeu o visado construindo uma muralha ainda mais forte e alta do que a anterior. Sempre que era intimado, a resposta era imediata: Construía defesas mais altas e eficazes.

Um dia, os sitiantes, decidiram retirar-se e deixar de proferir os truculentos avisos. Acharam que tinham isolado o sitiado sem gastar um cêntimo em acções bélicas.

No interior da fortaleza,  as críticas não se fizeram esperar: eles próprios tinham-se enclausurado e agora estavam perdidos e sem saída. Acabariam por morrer à míngua!

Riu-se o castelão dos dislates que ouvia. Mandou que abrissem a 24ª porta da muralha.
Um pelotão executou as ordens e, ao abrir a referida porta, deixou à vista o pano da muralha.

-E então agora?- surpreenderam-se os habitantes.

O castelão chamou a criança que brincava no pátio e entregou-lhe um martelo, dizendo-lhe:
-Se deres uma martelada naquele muro, ganhas um presente e darás uma grande alegria a todos os que aqui estão.
Olharam os habitantes da fortaleza com certa piedade o seu castelão.

-Coitado, perdeu o juízo com o disparate que fez!

Eis senão quando, a criança desfere uma grande martelada e faz um enorme rombo que deixa ver com toda a nitidez o exterior do castelo.

Fez-se um silêncio sepulcral, só quebrado por uma voz tonitruante e furiosa vinda do lado oposto do castelo:

-Então o inimigo podia invadir o nosso castelo por esse ponto fraco nas muralhas?


Jorge C. Chora