quinta-feira, 29 de junho de 2023

O CHEFÃO

 

  O CHEFÃO

O chefão arengava há mais de duas horas, em pleno verão, num recinto ao ar livre.

Ao sol, os funcionários tinham deixado há muito de escutar fosse o que fosse. Pensavam em resistir e rezavam para que o orador, a discursar sem papel, acabasse com aquele insuportável tormento.

Inesperadamente o tempo mudou. Começou a chover, embora de modo ligeiro, mas o chefão continuou, impávido a massacrá-los.

Meu Deus, quando é que isto acaba, pensaram, derreados de todo, os ouvintes.

De súbito ouviu-se um grasnar e uma enorme gaivota a pairar sobre a cabeça do chatarrão.

Um silêncio sepulcral tomou conta da assembleia. A esperança em que aquilo terminasse de vez instalou um sopro de esperança.

E no meio do silêncio começou a escutar-se um murmúrio: Ave Maria…

Mal a oração terminou, a gaivota despejou os intestinos mesmo na cabeça do chefão.

Este não se desmanchou:

- Peço desculpa da interrupção. Vou só lavar-me e já volto.

Quando voltou, nem vivalma lá restava e até os passarinhos tinham abandonado o local.

Jorge C. Chora

29/6/2023

terça-feira, 27 de junho de 2023

O GOSTO DA TUA BOCA


A tua boca

tem gosto

agridoce;

nada insossa,

mais doce do que salgada,

à qual regresso,

todos os dias,

sem horas marcadas,

em busca do teu sabor,

e da tua língua bailarina.

 Jorge C. Chora

  27/6/2023 

domingo, 25 de junho de 2023

SONHO BOM

 


O olhar hipnotiza-me,

os braços imobilizam-me,

apertas-me de tal modo

que sinto, a compasso,

o bater dos nossos corações.

Apossamo-nos um do outro,

somos um só,

espremes-me com tal vigor,

que entre ais e uis ,

acordo estremunhado

e com o pijama,

totalmente encharcado!

 

        Jorge C. Chora

        25/6/2023

sexta-feira, 23 de junho de 2023

O REGRESSO DAS FESTAS JUNINAS

 

 Murchavam os manjericos,

tão saudosos das marchas,

dos petiscos e das sardinhas,

dos aromas e dos namoricos.

         Jorge C. Chora

          23/6/2023

O MISTÉRIO DA RUA PIMPINELA

 

Em dias quentes, chovem pedidos de atestados, no centro de saúde, quer de homens quer de mulheres, todos provenientes da mesma rua.

No centro de saúde local, foram muitas as hipóteses colocadas para este fenómeno. Uns médicos inclinavam-se para a poluição atmosférica, outros para as intoxicações alimentares, devido a abastecerem-se em algum estabelecimento local, entre outras hipóteses.

Uma jovem médica, recente naquele centro, ao saber do que se passava perguntou:

-Em que rua isso se passa? Será na rua Pimpinela?

Os colegas entreolharam-se, surpresos, questionando-a logo de seguida:

- Como sabe? Mora lá?

A jovem deu uma enorme gargalhada que deixou ainda mais perplexos os colegas mais velhos.

- Não, não moro, mas conheço um casal que lá vive e em dias de calor, fazem nudismo à varanda, cuja proteção é de vidro transparente.

- E como sabe disso?

-É a minha irmã mais nova e o companheiro, ambos adeptos do nudismo!

Daí em diante, todos os pedidos de atestados da rua Pimpinela, coincidentes com dias de grande calor, foram recusados.

 

Jorge C. Chora

23/6/2023

quinta-feira, 22 de junho de 2023

AS BRISAS

 

As tuas palavras,

são como as brisas

frescas de verão:

refrescam-me o pensamento,

libertam-me da asfixia,

deliciam-me

e são presença indispensável

junto de mim, tal como

no inverno o são,

porque são quentes e calorosas

e aquecem-me o coração.

   Jorge C. Chora

      22/6/2023

quarta-feira, 21 de junho de 2023

O ÓDIO EO MANDO

 

O ÓDIO E O MANDO

Odiar

e não amar,

é moda de quem no Mundo

quer mandar, e países anexar.

Qualquer réstia d’amor,

é vírus a exterminar,

e quando do mundo

pouco ou quase nada sobrar,

oxalá não sejam os do ódio

a sobreviver, para que alguém

possa dizer:

-É obvio que odiar não era o caminho!

JORGE C. CHORA

21/6/2023

segunda-feira, 19 de junho de 2023

AS TUAS LÁGRIMAS

 

As tuas lágrimas

sabem a mel,

resultam da alegria

e da doçura

de que és feita.

Nunca as provei,

acres ou agridoces,

e espero nunca as provocar,

pois adoro-as como são:

doces e a saber a mel.

  Jorge C. Chora

    19/6/2023

sábado, 17 de junho de 2023

O DIA A DIA DO CRAVA

 


Alcunhavam-no de Crava, mas ele corrigia de imediato:

- Chamo-me Cravo e não, Crava- E repetia, cheio de si: Cravo e não, Crava!

- E a propósito, adiantas-me 20 euros? pago-te amanhã.

-Como me pagaste os cinquenta euros de anteontem?

E o Crava, sem se atrapalhar, propôs:

- Se me emprestares setenta, pago-te já o que te devo e saldo a conta de anteontem!

Jorge C. Chora

17/672023

sexta-feira, 16 de junho de 2023

ALELUIA

 

Se acordar bem-disposto

e sem dor alguma,

é motivo de alegria;

ainda maior será ela,

se lhe juntar,

uma pitada de amor,

uns cêntimos no bolso,

e aí sim, terá um dia de aleluia!

Jorge C. Chora

16/6/2023

quinta-feira, 15 de junho de 2023

LIMITES

 

LIMITES

Foges de mim,

ao perceberes,

a minha vontade

de te mordiscar;

mas quando ela

também te dá,

só duas vezes

a podes usufruir,

porque à terceira,

andas tu atrás de mim

e eu a fugir de ti!

 

Jorge C. Chora

  15/6/2023

quarta-feira, 14 de junho de 2023

OBSESSÃO

 

Sinto, preciso,

e estou faminto,

dos teus carnudos lábios,

mas neles, vislumbro a traição.

O desejo é tão forte,

que prefiro mil vezes a traição,

do que ficar sem os beijar,

ainda que por breves segundos,

os teus traidores e magníficos

lábios carnudos.

 

Jorge C. Chora

14/6/2023

domingo, 11 de junho de 2023

PIROPO OU ASSÉDIO?

 

Um cavalheiro foi detido,

em flagrante delito,

por um piropo ter dito,

por sinal bem bonito.

Foi preso e acusado,

por abuso, condenado,

a pedido de uma jovem

que se sentiu assediada

e muito incomodada,

por ter sido chamada

de “verdadeira deusa terreal”

e não ter sabido ou querido,

dizer, simplesmente:

- Muito obrigada.

 

Jorge C. Chora

11/6/2023

quinta-feira, 8 de junho de 2023

O FADO DO MULHERENGO

 

Não sei o que aconteceu,

para escorregares

entre os dedos da minha mão;

se foi o beijo

que prometi dar-te

e dei à tua amiga,

ou as rosas oferecidas

à tua prima,

ou ainda por me teres encontrado,

três vezes na cama com outras,

sem seres tu.

Seja como for,

sinto-me enganado por ti,

não sei o que fiz para merecer

tal castigo.

Aí coitado de mim,

o fado que eu passo,

por ficar sem ti!

Jorge C. Chora

8/6/2023

quarta-feira, 7 de junho de 2023

A GIBOIA E O CABRITINHO

 


Nasceu fraco o cabritinho. Só por milagre e pelos cuidados da mãe conseguiu sobreviver. A mãe cabra, devido aos esforços feitos e à idade que já tinha, acabou por falecer.

Só e forcejando por se colocar em pé, o cabritinho viu aproximar-se uma jiboia que ofereceu os seus préstimos:

-Meu pequenino, estás cheio de frio, precisas de te aquecer. Queres que te abrace e te aqueça?

Agradecido pelo súbito socorro, o recém-nascido disse que sim, abanando a cabeça.

A jiboia aproximou-se devagar, encostando-se de modo suave, quase carinhoso, ao cabritinho, preparando o abraço oferecido.

E quando se preparava já para o abraçar, surgiu espavorido um enorme e carrancudo bode, que viera em busca da sua cabra preferida, a qual tinha dado à luz naquele pasto.

Os berros do bode, furioso ao presenciar a cena, atroaram os ares e ele atacou, pisando inúmeras vezes a jiboia, e corneou a cabeça dela com tal violência, que a separou do corpo já mutilado.

-Ela era minha amiga, ofereceu-se para me aquecer! -balbuciou – o cabritinho.

O bode, ainda ofegante, conteve a sua fúria para não assustar o cabritino e respondeu-lhe:

-Se ela te tivesse abraçado, já estavas morto. Ela ia comer-te! Não te esqueças do que vou dizer-te. Falsas ajudas como esta, vais recebê-las toda a tua vida. Podem não querer comer-te de imediato, mas vais pagá-las caro e em dobro do bem que achas ter merecido!

E o cabritinho, franzindo a testa, a custo agradeceu ao bode, ter matado a sua amiga cobra.

Jorge C. Chora

7/6/2023

sábado, 3 de junho de 2023

CIÚMES

 

Deste-me um beijo

e uma rosa,

e quando te disse,

que tinha um ramo para ti,

chamaste-me mentiroso,

e fugiste de mim.

Acabei por não te dar

o ramo que te tinha comprado.

Só tenho pena

de te não te ter dado,

o beijo para ti guardado,

mas dá-lo-ei a outra,

para não desperdiçar,

a compra que fiz para ti.

    Jorge C. Chora

        1/6/2023

quinta-feira, 1 de junho de 2023

NO DIA DA CRIANÇA

 


Entre abraços

e beijinhos,

ais de prazer,

e miminhos prazerosos,

faz-se nascer

um ou dois meninos(as).

Meninos não são bonecos

que se dão ou se emprestam,

são seres humanos,

criados com amor, cuidados

trabalhos e carinhos,

dos quais nos orgulhamos,

venham eles a ser,

o que quiserem ou deixarem ser,

taberneiros ou doutores,

são e serão sempre os nossos meninos.

 

       Jorge C. Chora

         1/6/2023