Do amor recebido,
sinto-me
vestido!
Num tecido
forrado,
em cetim e
veludo,
com ternura
bordado
e em mimos
tecido.
JORGE C.
CHORA
30/12/22
Do amor recebido,
sinto-me
vestido!
Num tecido
forrado,
em cetim e
veludo,
com ternura
bordado
e em mimos
tecido.
JORGE C.
CHORA
30/12/22
Qualquer um se
julga apto a pescar a garfo, no prato, uma boa posta de pescada, ou mesmo a
caçar um naco de javali.
Não é disso que
se trata, nem de fanfarronices abstrusas que versa a crónica.
O sr. João
Brás, quando era jovem, morava na Carvoeira, próximo do rio Lizandro, mais propriamente,
da foz do rio Lizandro.
Quando a
maré estava baixa e a água do mar não invadia o rio, andava-se a pé no leito do
rio, levantavam-se as pedras no seu leito e podiam encontrar-se enguias. Estas
eram então pescadas com um simples garfo.
Em dias de
maré cheia, o rio também se enchia de robalos, tainhas e outros peixes e esses,
não podiam ser pescados à garfada,
mas com
tarrafas, redes feitas pelo seu pai que entre os múltiplos ofícios a que se
dedicava, se contavam o de fazer redes e de pescador.
E era assim
que ainda se podia pescar, à garfada, na década de sessenta
e deliciarem-se
com enguias bem frescas e saborosas.
Hoje não sei
se isso ainda é possível, mas hei de averiguar, pois uma caldeirada de enguias
nunca é de enjeitar, ainda por cima pescadas à garfada!
Jorge C.
Chora
27/12/2022
Há quem acredite
e sacrifícios aceite,
como sendo graus
para ascender degraus
na escadaria celeste,
para alcançar o céu.
As malfeitorias seriam
um mal necessário,
e quiçá, contribuiriam
para a santificação:
bênçãos seriam
de celeste ascensão,
e o olimpo garantiriam!
Ah! Um simples pormenor,
se assim é, serão os russos,
sob a batuta e a soldo de Putin,
a garantia de subida ao céu
dos ucranianos assassinados?
Cirilo benzerá como mártires
os que já morreram e também
os que morrerão neste Natal?
Jorge C. Chora
25/12/2022
Lugar para parquear era algo inexistente no local. O idoso circulou quase meia hora no sítio, mas sem qualquer sucesso.
De repente,
surgiu uma vaga. O idoso estava impedido de a apanhar de imediato, porque havia
um sinal de proibido e foi obrigado a tornear todo o parque.
Quando
estava a cerca de 20 metros, apareceu uma viatura em sentido contrário e num
ápice ficou com o lugar. O usurpador saiu ufano da viatura, olhando de modo
sobranceiro para o atónito condutor que ficara sem o sítio.
Ainda mal se
afastara da viatura, quando um polícia lhe solicitou os documentos.
A
contragosto mostrou-os, não sem que perguntasse:
- Documentos
para quê se estou apeado e não fiz nada?
O jovem agente,
percebeu que estava perante um sabichão, pois tinha-o visto entrar em sentido
proibido e a abotoar-se com o lugar.
-O senhor
sabe a manobra que fez ou já se esqueceu?
- Manobra?
que manobra?
-O Jovem
sorriu e perguntou-lhe:
-Quer que eu
pergunte àquele condutor, a quem tirou o lugar, o sinal de trânsito que não
respeitou?
- Olhe
senhor agente, não vi sinal nenhum… -desculpou-se o espertalhão.
-Então os
seus documentos não estão atualizados e isso dá direito a…
O esperto
não o deixou acabar a frase:
-Estão sim
senhor. Eu moro mesmo aqui em frente…
-Bom, então
sabia que existia o sinal. Vou ter de lhe passar uma multa e olhe que é bem
pesada…
A conversa
mudou imediatamente de rumo.
-Bem… não há
outra maneira de resolver o assunto…- arriscou o prevaricador.
-Mau, agora
está a tentar fazer o quê… isto vai de mal a pior…
-Peço-lhe
desculpa… e se eu tirar o carro?
-A falta já
foi cometida, mas pelo menos mostra arrependimento e vontade de emendar o erro…
E o esperto
tirou o carro e com tanta sorte que bem perto viu um livre. Quando ia parquear,
apareceu outro carro, em sentido proibido, que o ocupou. Desta vez não havia
polícia à vista.
Não sei se
ainda hoje anda à procura de estacionamento no local!
Claro que
tudo isto só aconteceu na cabeça do idoso, que ficou pura e simplesmente sem o
lugar e que sonhava que o caso se deveria ter passado assim!
Jorge C.
Chora
23/12/2022
Eram poucos os que não o consideravam um ser execrável. A sua forma de andar era, no mínimo, de um exibicionismo bacoco. Cada passo seu, assemelhava-se a um estranho passo de dança, a uma espécie de salto de onda mal surfada, a um espetáculo a solicitar palmas.
A sua fala
arrastada, pedante e muito afetada, desagradava até às mais irritantes
desocupadas da classe alta.
Um belo dia,
quatro das suas fiéis inimigas, viram uma mulher, mal trajada e bastante suja,
a querer beijar-lhe a mão e ele a retirá-la, de um modo delicado e afável.
O mal-estar
do cavalheiro era notório.
-Olhem só o
estupor… coitada da mulher… afastada como uma leprosa…- comentaram as mulheres.
Não quiseram
perder a oportunidade de se aproximarem da andrajosa para colherem mais umas
achas para a fogueira.
-Então a
senhora foi escorraçada pelo homem? É um mal-educado…tem a mania que é mais do
que os outros…
-Não digam
isso minhas senhoras! A minha neta deve-lhe a vida, se ele não tivesse pagado a
operação…
-Ele é um vaidoso,
já viu como ele anda e fala…
-Ó minhas
senhoras, eu conheço-o desde bebé… ele nasceu com uma perna mais curta e
disfarça…
-E a fala…
já viu…
-Por amor de
Deus… em criança ele viu o pai morrer atropelado e ficou gago… é uma forma de
ninguém notar… Ele só não ajuda quem precisa, se não puder… faz das tripas
coração…
E as
desocupadas, mal isto ouviram, gritaram, furiosas em uníssono:
- A mulher é
louca! Só nos faltava agora apresentar-nos o Execrável como um ser amoroso!
Jorge C.
Chora
19/12/22
Se a tua chama esmorecer,
não aquecer
como aquecia,
nem alumiar
como alumiava,
algo contigo
está a acontecer:
consumes-te
com ninharias!
Respira e
reativa a tua chama,
exige a tua
quota de oxigénio,
aquece-te a
ti e aos outros,
retoma o teu
viver e a alegria,
dá-te o
prazer de voltares a ser!
Jorge C. Chora
16/12/2022
Com pompa e circunstância, foi inaugurada na terra uma piscina e os seus modernos apoios.
Nesse dia as
entradas eram gratuitas para todos os habitantes, independentemente da idade,
após os longos e enfadonhos discursos do presidente, vice-presidente, e de uma
séria infindável de autarcas, agravado pelo facto de nenhum ter o discurso
escrito.
Terminadas
as ladainhas laudatórias, foi uma correria para os balneários.
D.
Ermelinda, uma nonagenária cheia de vitalidade, foi atrás dos ansiosos
banhistas, embora mais lentamente, porque as pernas já não eram tão jovens como
ela desejava.
Quando por
fim entrou no balneário, ouviu um coro de protestos:
- Isto é o
balneário dos homens, minha senhora!
D. Ermelinda,
abriu bem os olhos, deu uma gargalhada e exclamou:
- Abençoado
engano. Assim recordo-me como vocês são… - e deu meia-volta e foi à procura do
balneário das senhoras.
No diário
que mantinha, escreveu: Não me importava que todos os dias fossem como o de
hoje.
Jorge C.
Chora
14/12/2022
Os sapatos bicudos e extremamente longos, impediam a normal circulação no corredor, por quase ocuparem a totalidade do espaço. Caso alguém quisesse passar, era preciso que o homem que os calçava, encolhesse as pernas ou as descruzasse para que as pontas dos sapatos desimpedissem o caminho.
O seu
proprietário, o dos sapatos é claro, nada tinha que o distinguisse de outro
homem qualquer, exceto a sua fealdade, o calçado invulgar, ainda realçado pelo
seu trajo apertado e o nariz adunco. Apesar disso, outra marca o distinguia: a
sua vaidade.
Dizia à boca
cheia, que as amigas o achavam parecido com um conhecido artista, por sinal
muito bem-apessoado e de talento mundialmente reconhecido: um tal Tony Cútis!
Os amigos
olharam-no de soslaio, pois já tinham ouvido falar em alguém de nome
semelhante, mas franziram o nariz porque algo lhes soava um pouco a falso.
O homem dos
sapatos bicudos, acabara de criar uma personagem, e passava incólume pela
fotografia que fazia de si próprio ou melhor, que dizia que as amigas faziam de
si próprio: Ele era o Tony Cútis, talvez o irmão gémeo, não identificado, do
artista Tony Curtis.
Coisas da
vida!
Por outro
lado, o caso da cútis presta-se a outras interpretações, como a de um velho
marinheiro, de pele curtida pelo sol e linguagem vernácula, um macho sem medo
de ondas e tempestades, perante quem o Adamastor pensaria duas ou três vezes
antes de o querer assustar.
Tendo-lhe
surgido um incómodo e doloroso furúnculo numa nádega, resolveu, muito a custo
ir ao médico, ainda que tivesse sempre pensado, que” homem que é homem dispensa
idas ao doutor”.
Vestiu-se de
modo cerimonioso para a rara visita ao dito cujo. Quando o médico lhe perguntou
ao que vinha, o velho marinheiro esmerou-se: à medida que baixava as calças foi
dizendo:
- Senhor
doutor, apareceu-me isto na cútis – e foi apontando o enorme furúnculo na
nádega direita.
O Físico não
se conteve e deu uma enorme gargalhada. O velho marinheiro ainda pensou
esborrachar-lhe a tola com uma punhada quando o homem se dignou explicar-lhe:
-Ó senhor, a
cútis não é a pele do rabo, mas da cara. Melhor ainda, a pele delicada da face
de uma dama…
O bom e
honrado marinheiro ficou entupido. Ele que se esmerara para falar caro com o
doutor, afinal cometera uma bacorada das antigas e ainda era gozado…
Jorge C.
Chora
12/12/2022
Rubro está o céu ucraniano,
tal como o solo, empapados
de sangue totalmente inocente,
das maternidades bombardeadas,
do assassínio de famílias
que repousavam nos seus lares,
de alunos das escolas destruídas,
do espichar de sangue das torturas
sanguinolentas dos esbirros
apaniguados de Putin,
assim como dos fuzilamentos.
Ainda não apaziguada
a sede de carnificina,
condenam a morrer de fome
e frio, milhões no inverno
ucraniano, a exemplo do
que os russos já fizeram
em 1923, privando-os, desta vez,
de abrigo, aquecimento,
água e alimento, enquanto
continuam a desmembrar,
à bomba, civis um pouco
por todo o lado, semeado
o terror, como terroristas,
já pelo mundo
identificados!
Isto tudo na época de Natal,
com a bênção do primaz
ortodoxo da Rússia!
Jorge C. Chora
11/12/2022
Quem não quer um pé-de-meia?
embora todos
tenham meias e até
não lhes
falte, pelo menos um pé.
só falta
mesmo, sabem o que é?
alguns
cêntimos ou meia dúzia
de notas de
cinco, embrulhada
numa, pelo
menos de mais-valia!
Jorge C. Chora
9/12/2022
O rapaz passeava o gato à trela, todos os dias, à mesma hora, no mesmo jardim. No lado oposto, também mais minuto menos minuto, uma rapariga passeava o seu cão. Nunca se tinham aproximado um do outro pois é consabido que cão e gato não são os melhores amigos.
Um dia o cão
soltou-se e correu na direção do gato. A dona, aflita, foi atrás dele. O gato
logo que viu o cachorro a aproximar-se, colocou-se em pé e, espanto dos
espantos, começou a ladrar em vez de miar.
Os animais
roçaram-se um no outro, o cão lambeu o gato e este encostou-se de modo meigo ao
cão que emitia latidos de agrado.
A dona, de
cabelo à escovinha, jeans rotos nos joelhos, olhos verdes, numa vozinha de gata
mimada, desculpou-se:
-Peço
perdão, o meu cão não tem o hábito de se soltar assim…
Mal acabara
de se desculpar quando o gato lhe saltou para o colo e se aninhou, ronronando
de prazer.
Logo de
seguida, o cachorro saltou para o colo do rapaz, escondeu o focinho na sua
longa cabeleira, abanando o rabo de satisfação.
Aproximaram-se
os donos, tentando que os seus respetivos animais retornassem a si.
Nem o gato
deixou o colo da jovem nem o cão o do rapaz. Às tantas a rapariga tinha a
cabeça tapada com a farta cabeleira do jovem e só se ouviam latidos e
ronronares, numa mistura harmoniosa, proveniente da cortina capilar que os
ocultava a ambos.
- Mas que
coisa assombrosa, os moços até ronronam…daqui a uns meses já estão separados…-
comentou uma jovem, que acabara de se zangar com o namorado
JORGE C.
CHORA
8/12/2022
Quem apanha sem merecer
e nada faz
para se defender,
tudo lhe
pode acontecer.
Arrisca-se a
muito padecer,
a tornar
sempre a suceder
e a acabar
por desfalecer!
Jorge C. Chora
6/12/2022
O jogo terminou bem perto da hora do almoço. Estavam atrasados. Tinham de comer a correr, antes disso tomar banho e apanhar o metro, a tempo de chegarem a horas ao serviço.
Foi uma correria. Cada um
calçou-se o mais rápido que podia, correram para o transporte e foram saindo
nas respetivas estações.
Na hora de regresso,
António, após calçar os sapatos achou algo de estranho. Olhou melhor e viu que
os sapatos, embora ambos fossem pretos, eram diferentes um do outro.
- Mau, um é meu, mas o
outro é do Fernando!
Apressou-se a telefonar ao
Fernando e a pedir-lhe que trouxesse os mesmos sapatos calçados pois um era
dele e trocavam.
Fernando ainda não tinha
dado pela troca:
-Tens razão! está
descansado.
Apanharam ambos o mesmo metro,
sentaram-se lado a lado, e perante o olhar espantado dos outros passageiros,
descalçaram-se e trocaram os sapatos.
Um jovem passageiro que
observava a cena, pediu desculpa da intromissão e disse:
- Gosto dos vossos
sapatos. Por acaso não querem trocar com os meus, que embora de marca, são
novinhos em folha, e não têm o toque de uso de qualquer um dos vossos?
Jorge C. Chora
5/12/2022
O amor é o chocolate
da existência, namoro
da vida, doçura bocal,
moleza do coração,
céu terreal, beijo divino
de sabor sem igual,
prolongado e
delicioso,
aconchego da existência,
sem o qual não se vive
e unicamente se vegeta.
Jorge C. Chora
4/12/2022
Quem não ama nem é amado,
está sempre desconfiado:
mesmo abonado, é indesejado,
só é engraxado, porque temido.
Vive iludido e aldrabado,
tem inimigos por todo o lado,
é cercado e armadilhado,
até ser derrubado e no final, pisado,
e de pouco lhe serviu, ser temido e abonado!
Jorge C.
Chora
1/12/2022