Sentou-se à porta do supermercado e tirou do bolso uma
sandes esborrachada. Com todo o vagar do mundo, retirou o celofane que a
embrulhava. Preparava-se para lhe dar a primeira dentada, quando um cão
escanzelado e peludo se aproximou. Partiu um bom bocado à sandes e deu-o ao
cão.
Ao seu lado, um homem elegante, olhou-o com ar de
certo desprezo e de algum nojo. O jovem
sentado sorriu-lhe, embora de testa enrugada, devido à repreensão visível que
lhe estava a ser dirigida.
-Eu vi-o a tirar a sandes da prateleira do
supermercado. Sei que não a pagou…ao menos não a tivesse desperdiçado e deitado
metade fora … mas percebo, foi à borla…
-O senhor acredita, que de barriga cheia, sou tão ou
mais moralista do que o senhor? -respondeu-lhe o jovem.
-Se não a tem cheia, rouba e ainda tem a lata de
lançar metade fora? Afinal tem ou não tem fome?
-Sim tenho…mas ele também tem… - e apontou o cão.
E o homem, voltou ao ataque:
-Será que não percebe que roubar é indigno e que mesmo
com fome isso não se faz?
-Volto a dizer-lhe que de barriga cheia é fácil ser
moralista, mas não deixa de ter razão.
O senhor enervou-se. Um ladrão com aquela lábia era
demais. Entrou no supermercado e regressou com um segurança. Apontou para o
jovem e denunciou-o:
-Roubou uma sandes e não pagou. Ainda por cima deu
metade àquele cão sarnento…
E o segurança disse ao denunciante:
-É o dono do supermercado, ou melhor, é o filho do
dono do estabelecimento. Está na sua hora de lanche e depois regressa ao
escritório.
E o herdeiro do negócio, sem perder a boa disposição
pede ao segurança:
- Senhor João, veja se o denunciante tem a factura do
perfume que colocou no bolso, pois não o vi pagá-lo, quando passei pela caixa e
me vim aqui sentar.
Não tinha!
Jorge C. Chora
6/5/2018