Há cerca de cinquenta anos, os alunos internos do colégio de
S. José e Stª Maria em Mangualde, faziam as compras necessárias ao dia a dia,
na loja do senhor Nuno,(se a memória não me falha, era assim que se chamava)bem
próxima do colégio, quase na esquina que dava para a rua principal. Para além
dos sabonetes, pasta de dentes e desodorizantes, comprávamos o tabaco (Definitivos,
Porto, Português Suave e tabaco de enrolar…).
Quando as compras excediam a semanada, o sr. Nuno continuava
a fornecer-nos o que precisávamos, anotando num livro o valor daquilo que se ia
adquirindo.
À medida que íamos tendo dinheiro, pagava-se o que se devia
e o sr. Nuno riscava, à nossa frente, a dívida saldada. Melhor ou pior, o
método ia funcionando sem males de maior. Acontecia, no entanto, que o dono da
loja, para além da paciência que tinha em nos aturar, não revelava a mínima
pachorra, sendo mesmo intolerante, face às asneirolas que alguns colegas
insistiam em usar. Virava bicho, agarrava no metro com que media as fazendas,
saía do balcão e ai de quem permanecesse na loja. Ficava deserta num ápice.
Este puritanismo do sr. Nuno, em breve foi aproveitado por
alguns dos estudantes mais velhos e gastadores, nomeadamente os que tinham tido
azar à lerpa ou se tinham alargado nas despesas em relação às “moscas” aos bagacinhos ou aos” licores d’ouro” na
pousada. No dia de pagamento das dívidas, formava-se uma fila à porta do
estabelecimento. De repente, alguém proferia um chorrilho de asneiras bem alto.
Segundos depois, brandindo o metro, surgia o sr. Nuno, provocando uma debandada
generalizada.
Os alunos só compareciam na semana seguinte e as palavras
eram sempre as mesmas:
-Na semana passada estive cá mas tive de fugir…
-Pois é, peço desculpa, mas fico desorientado quando ouço
asneiras… -justificava-se, pesaroso, o sr. Nuno.
À porta, fingindo-se muito penalizados, os matulões da asneirada
perguntavam:
-Podemos entrar? Hoje já está bem disposto?
Jorge C. Chora