quinta-feira, 28 de julho de 2016

ROMA NÃO PAGA A TRAIDORES OU A SAGA DE JULIA STEPANOVA

                            
Li no DN de 27 e 28 de Junho,um resumo sobre a denúncia de Julia Stepanova e do seu marido Vitaly, sobre o caso de dopagem em grande escala, no atletismo russo, levado a efeito pelas próprias autoridades desse país.

A luta que levaram até conseguirem denunciar a situação trouxe-lhes consequências, desde a perseguição no seu próprio país, até ao terem de se esconder durante anos na América do Norte.
O que Julia não esperava é que o próprio Comité Olímpico Internacional, ao arrepio do que tinha sido decidido pela Federação Internacional de Atletismo, que permitira a sua participação nos jogos como atleta neutral, colocasse a condição de só autorizar a participação de atletas russos que nunca tivessem sido castigados por doping.

O mais grave é que inúmeros atletas de outras nacionalidades, que não russas, tenham sido autorizados a competir nos jogos, depois de terem sido castigados por doping!

É caso para se dizer que Stepanova é tratada como se fosse uma traidora, é punida em público perante o mundo e que, por este andar só falta o cartaz, semelhante ao que os romanos fizeram quando os assassinos de Viriato, embora a soldo do império, pretenderam receber a recompensa prometida: foram executados e ao seu lado um cartaz anunciou  ”Roma não paga a traidores”.

Como o exemplo vem do alto, aí está o aviso: come e cala. Não há lugar para queixinhas pé de salsa… manda quem pode obedece quem deve….


Jorge C. Chora

quinta-feira, 21 de julho de 2016

O CENTRO DE CULTURA E ARTE DA BEIRA HÁ CINQUENTA ANOS

                  
Ainda era pequeno quando os meus pais decidiram colocar-nos, a mim e ao meu irmão, a aprender desenho à vista, no Centro de Cultura e Arte da Beira.

O centro funcionava num casarão, à beira do campo de golfe e se a memória não me falha, na Ponta Gêa. Para além de várias salas, era dotada de grandes varandas fechadas, com redes nas janelas. Os cavaletes eram dispostos de modo a que cada aprendiz não constituísse um obstáculo visual e eramos distribuídos pela sala e pelo dito corredor/varanda. Cheirava a tintas e a líquido fixador. No centro, um pedestal onde o professor colocava o que devíamos desenhar.

Aprendemos a tirar medidas aos objectos, fechando um olho e, com o outro, de braço estendido,com um lápis na vertical e na horizontal, apontando para o objecto, definíamos as proporções e marcávamos os contornos e desenhávamos.

As aulas eram por volta das 17h30 e acabavam cerca de hora e meia depois. Nessa altura, quer eu, quer o meu irmão, estávamos esfomeados, já que naquela época jantávamos pelas 18/18h30, o mais tardar. Desenhávamos a carvão e apagávamos os desenhos com miolo de pão. Quando completávamos a obra utilizávamos o fixador, pulverizando a obra.

E o estômago a dar horas e nós a pensar que bem nos saberia ter ali o enorme pão com “jam” que deitávamos fora à socapa, quando nos levavam o lanche à praia, duas horas após sermos obrigados a comer o colossal “mata-bicho” à moçambicana, que enfartaria um elefante e deixaria K.O. um leão!
E a fome continuava a apertar e, como quem não queria a “coisa”, íamos ao miolo de pão, abocanhávamos um pedaço que não tivéssemos usado e depois outro e ainda outro, até que marchava, por vezes, o que estava sujo de carvão. A fome era negra! E acompanhados pelas notas musicais que nos chegavam das aulas de ballet, íamos devorando o pão que nos sabia infinitamente melhor que o caranguejo, o bife, a lagosta e o camarão, a que torcíamos o nariz em casa.

Os pais, esses sábios, tinham jantares sossegados, sem lamúrias do “não me apetece” “estou satisfeito” e “não há mais nada?”…

As minhas aulas continuaram pelas férias dentro até que um dia estiveram quase a ser interrompidas. Ao chegarmos a casa, a minha mãe mostrava sempre um grande interesse pelas obras-primas dos seus “artistas”. Um dia trouxe-lhe um desenho ao qual não achou graça nenhuma: eram uns seios descomunais.

-Oh! Jorge Alberto…o que é isto? Tu deves fazer os desenhos que o professor te manda! E olhava toda triste, mas de uma forma meiga, para o seu rebento desencaminhado.

-Ó mãe, foi o professor que colocou um busto no pedestal… -respondi-lhe.

Puxou-me para si, beijou-me e disse:

-Bom, assim está bem… mas deves estar mais atento…umas maminhas assim seriam um castigo de Deus!


Jorge C. Chora

segunda-feira, 18 de julho de 2016

O JARDIM EPISCOPAL DE CASTELO BRANCO E O DEVANEIO SOBRO O GIOCHI



Em maio deste ano visitei o jardim do Paço Episcopal de Castelo Branco. Melhor dizendo, revisitei-o, pois já na adolescência por lá tinha passado com a família e há cerca de trinta anos, com a minha mulher.

A vantagem destas visitas espaçadas no tempo é a de que nos podemos maravilhar com pormenores que nos tinham escapado na altura.

Desta vez, fomos integrados num grupo (círculo cultural Artur Bual, da Amadora, presidido por Luís Teixeira Alves) e tivemos a sorte de ter como guia, em Castelo Branco, o arquitecto José Paulo Leite.
Escusado será dizer que a visita foi óptima e abarcou desde o museu Cargaleiro ao Centro Cultural, passando pela parte medieval da cidade e o Jardim Episcopal.

Imaginei os bispos no jardim deliciando-se com as vítimas do giochi à italiana (jogos de água), que surpreenderiam as convidadas, esguichando jactos de água e causando gritinhos de “ai Jesus.. ai Jesus” e suas excelências, solicitas, acorrendo com os seus lenços de seda a secar-lhes os tornozelos e convidando-as a sentarem-se nas conversadeiras. Refeitas do susto, ser-lhe-ia eventualmente proposto um passeio de batel ou de canoa, no tanque grande, que armazenava a água para a rega do jardim…

Eis que me puxam pelo braço. Os membros do círculo adiantaram-se e a minha mais que tudo repreende-me:

-Lá estás tu a pensar na morte da bezerra…acorda…não me digas que já estás a imaginar-te no lugar dos bispos!

-Que ideia a tua… -resmungo- apanhado, como sempre, por quem me conhece como às suas próprias mãos.


Jorge C. Chora