sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

UM SIMPLES SORRISO


O simples sorriso
que desenhei no vidro
embaciado da janela
do meu quarto,
é leve como uma pena,
valioso como uma pérola,
precioso como a fita
de seda que envolve amor.

Jorge C. Chora


29/12/17

sábado, 23 de dezembro de 2017

A CORNETA DOURADO DO PAI NATAL



O menino pediu tantas prendas que na noite em que o Pai Natal foi a sua casa entregá-las, ficou preso na chaminé.

Os presentes não chegaram a nenhuma parte do mundo e os meninos interrogavam-se:

-O que está a acontecer…?

- Esqueceram-se de mim?

E em todas as casas a surpresa foi a mesma.

Foi de madrugada que o menino, em cuja casa o Pai Natal estava preso na chaminé, deu por isso, ao ouvir uns gemidos.

- Pai Natal o que fazes aí? Porque não desces?

E o Pai Natal respondeu-lhe:

-Olha… os pedidos que fizeste todo o ano foram tantos, que os brinquedos entupiram a chaminé e poucos sobraram para os outros meninos…

-E agora?

-Se me disseres que posso dá-los, consigo empurrá-los, libertar-me e com alguma ajuda, ainda fazê-los chegar a casa dos outros meninos…

-Claro que sim…se precisares de ajuda é só dizeres…

-Muito obrigado, vai à rua e sopra nesta corneta, com toda a força que tiveres… -e deixou cair uma pequena corneta metálica dourada.

Na rua, cumpriu o pedido feito. O céu encheu-se de auxiliares do Pai Natal, uns magros e outros gordos, sendo uns muito altos e outros baixos, vindos da mesma terra daquele que acabara de sair da sua chaminé.

E nesse Natal não houve meninos sem presentes, embora nenhum tivesse recebido uma linda corneta metálica dourada igual à sua.


Jorge C. Chora

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

UM COPO DE LEITE PARA O PAI NATAL



Em casa dos meus netos, os presentes natalícios vão sendo colocados ao lado da árvore de natal, à medida que os pais os vão recebendo, sem que aqueles os vejam lá arrumá-los.
Os pais justificam tal facto, dizendo que o Pai Natal está sobrecarregado e só pode trazê-los aos poucos.
Este ano, o Francisco estranhou que a dez dias do Natal houvesse ainda tão poucos presentes.
- Há muitos presentes para ele transportar… -recordou-lhe a mãe.
Ontem surgiram mais alguns presentes, os pequenos rejubilaram e o Francisco desabafou:
- Até que enfim….
-“infim”…- secundou a pequena Caetana.
Francisco olhou de relance para os embrulhos e sugeriu à mãe:
-Não era melhor deixar ao pé da árvore, um copo de leite e um pacote de bolachas para o Pai Natal? Ele está um pouco fraquinho…

Jorge C. Chora

19/12/2017

sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

MEU AMOR,MINHA FLOR



A teus pés nasceu uma flor
cujo nome não sei qual é,
sei que é amarela
e que talvez seja um girassol.
O que sei,
isso sim,
é que a esperança
floresceu em ti,
e pouco importa que a flor
fosse uma rosa ou um girassol
pois a verdadeira flor,
é a dona dos pés,
 à beira dos quais nasceu a flor
que não sei se era rosa ou girassol.

Jorge C. Chora

15/10/2017

domingo, 10 de dezembro de 2017

A MAGIA DOS TEUS OLHOS



Reflectem os teus olhos,
uma noite de luar,
um convite para bailar,
 envolvendo a lua
 e as estrelas
que há no céu.
 Ao raiar o dia,
surge o sol
que encadeia,
encanta e dança
com a lua,
e os teus olhos quentes
cintilam e derretem
qualquer resistência
à magia do teu olhar.

Jorge C. Chora


 10/12/2017

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

A SENHORA DA CABELEIRA AMARELA



 A senhora da cabeleira amarela, tem 93 anos e fuma, à janela, três maços por dia. Perdida e achada é à janela que ela está. Cumprimenta e fala com muita gente enquanto fuma.
O fumo sobe e assenhoreia-se-lhe do cabelo que, ao longo dos anos e envolto em fumaça, se tornou amarelo.

Uma filha, com paciência de santa, ainda não desistiu de a aconselhar a deixar o tabaco e a outra, rendeu-se à evidência e traz-lhe os cigarros. Enquanto a divergência perdura, a senhora aproveita a brecha e fuma, uns a seguir aos outros. Vai poupando em perfumes, impregnada de cheiro a fumo e também na coloração do cabelo, que se tornou amarelo desde que os vizinhos se recordam da Dona fumar à janela e dos mais novos julgarem que ela já nasceu debruçada naquele peitoril.

Pode haver quem passe por ela e lhe possa sugerir que aquilo lhe faz mal à saúde? Talvez e a resposta, se não é dada é pensada e devolvida:

-Peça a Deus que lhe dê a idade e a saúde que eu tenho.

-Mas se não fumasse, vivia mais tempo e com mais saúde… -podiam dizer-lhe.

-Acha que sim … - responderia de forma sarcástica.

Antecipando o conselho, ninguém lhe pergunta nada, antes que a senhora da cabeleira amarela, as convença a seguir a sua receita de longevidade.


Jorge C. Chora

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

O SACRIFÍCIO DOS SAPATOS APERTADOS



A senhora arrasta-se, por assim dizer. Pernas e pés, só por mero acaso lhe obedecem.

-E pensar eu que com estas e com estes-  e aponta para as pernas e pés - ia a todo o lado, descalça ou calçada, conforme me deixassem ou melhor, me autorizassem…

Fala para quem está ao pé. Faltam-lhe as forças. Devagar e em voz muito baixa, desfia o rosário para quem a ouve ou finge ouvi-la. Embora idosa, sente-se que a senhora está sobretudo cansada.
Aproveita o facto de se ter queixado dos pés e recorda a história que tem em mente, lá do seu Alentejo:

- Houve um dia um baile lá na minha terra. Resolvi ir, mas não podia comparecer descalça. O único par que tinha apertava-me de tal modo que era já um suplício pensar em usá-los. Ainda por cima estavam todos molhados, devido à chuva que tinham apanhado.  Foi necessário secá-los ao calor da lareira. Ficaram duros, muito duros, mas nada de alargarem: encarquilharam-se. À força, consegui calçá-los e dirigi-me ao baile.

-Então aí é que se fartou de dançar… - arrisquei.

-Qual quê…a minha mãe passou ocasionalmente pelo local, viu-me e mandou-me ir para casa.

-Então todo o esforço foi inútil?

-Não…pelo contrário…

Nesse momento fiquei confuso. Dores nos pés, regresso a casa sem usufruir o momento e tinha valido a pena?

-Sim…foi lá que vi, o homem que viria a ser o meu marido! Não dancei, mas ficou debaixo de olho…

É caso para se dizer que desejo de alentejana é só um querer adiado, à espera de ser concretizado. Bem concretizado, digo eu, que ainda conheci o felizardo-catrapiscado.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 30 de novembro de 2017

O SENHOR MARQUÊS/CRIANÇAS



Era uma vez um marquês
que adorava peúgas de xadrez,
 desprezava os camponeses,
 era muito pouco cortês,
e senhor de grande desfaçatez.

Por mérito e honradez,
ao título de senhor fez jus,
o filho do camponês,
o que o marquês nunca fez,
por falta de qualidade e lucidez.


Jorge C. Chora

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

A REACÇÃO DA CAETANA



Caetana, a minha pequena neta, tem tanto de anjo como de pequeno demónio.
Mexe-se o dia inteiro e só se cala quando tem a boca cheia, de comida ou de frases que se atropelaram e ficaram retidas, à espera de vez para saírem.

Há uma semana, a avó afadigava-se, sem sucesso, para lhe mudar a fralda. Em cima da cama, saltava e esperneava furiosa, pois não queria mudá-la.

-Ó Caetana, tu és marota… -dizia-lhe a avó.

Sacudiu os caracóis louros, aborrecida com a cantilena, os seus olhos verdes a faiscarem, respondeu prontamente:

-Não…não “avójinha”… a Caetana é fofinha…

E não sossegou enquanto a avó não disse, de modo convincente:

-A Caetana é fofinha…muito, muito fofinha…

E aí a doce Caetana, pactuou:

-Um beijo avó …

  A avó, enquanto a foi beijando, ela foi repetindo:

-A Caetana é fofinha…


Jorge C. Chora

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

NINHO


De norte a sul,
uma troca de olhares,
um afago na alma
e um beijo na mão,
tecem um ninho
entre quem se quer bem,
com os fios do cuidado
de quem muito bem se quer.


Jorge C, Chora

domingo, 19 de novembro de 2017

A PALMADA DO TROGLODITA



No início da década de sessenta, tinha eu acabado de fazer 10 anos, viajei sozinho entre a Beira(Moçambique) e Lisboa.

A viagem durou uma imensidade de horas, até porque aterrámos em diversos aeroportos antes de chegarmos ao destino. Embora estivesse habituado a andar de avião, pois nas férias voava entre a Beira e Lourenço Marques, foi a primeira vez que andei no “Super Constellation”. Este modelo da TAP, era um quadrimotor, bem maior do que os “Dakotas”, mais silencioso do que este, embora também algo ruidoso.

Um tio foi buscar-me e levou-me para casa de uma tia avó, na Estrela. As novidades não cessavam. O bairro espantou-me. Nunca tinha visto casas tão antigas e ruas tão estreitas. O cheiro a sardinha assada e a peixe frito, sentia-se um pouco por todo o lado. Ambientei-me rapidamente.

A família incentivou-me a conhecer o local e, principalmente, o Jardim da Estrela, já que era ao lado da rua onde estava. Aproveitei e fui. Gostei e senti-me em casa ao ver alguns pequenos relvados.
Deitei-me de barriga para baixo num dos relvados, usufruindo a tranquilidade existente. De repente senti uma dor numa perna, semelhante a um súbito escaldão. Levantei-me num pulo sem perceber o que estava a acontecer. À minha frente estava um homem que me tinha dado uma enorme palmada na perna nua, pois estava de calções, e me disse:

-O relvado é para descansar?

Revoltado e meio aparvalhado com o sucedido, ainda olhei para o chão à procura de algo com que me pudesse defender, mas o homem desapareceu. Era um guarda do Jardim!

Acabrunhado, ao chegar a casa, explicaram-me que os relvados, serviam só para descansar, não o corpo, mas os olhos e reforçavam:

-Só os olhos, meu menino!

Era assim naquela época.


Jorge C. Chora

sábado, 18 de novembro de 2017

A FEBRE DA CAETANA



A minha neta Caetana gosta mais de colo do que eu de chocolate. Tem vinte e dois meses e saltita, como é seu hábito, em redor da avó, sempre à procura daquilo que sabemos. Há dias, procurou chamá-la à atenção, pois ela estava ocupada momentaneamente a arrumar já não sei bem o quê:
-Avó…avozinha, tenho febre…
-Tens febre?
-Sim…sim… -respondeu em tom pesaroso.
-Tens febre onde? -perguntou com voz de mimo a avó.
-Aqui…no “cajaco” - e apontava para o lado direito do seu casaquinho cor-de-rosa, recheado de pequenas estrelas, com um ar muito sério.
E a avó pegou-a ao colo e passado um bocado perguntou-lhe:
-Ainda tens febre?
-Não…já passou avozinha.
Quem sabe, sabe !


Jorge C. Chora

quinta-feira, 16 de novembro de 2017

UM BEIJO A MEU GOSTO



A poesia é um
vai-te embora sufoco,
um beijo a meu gosto,
um agasalho de inverno,
uma brisa de verão,
a correria de uma ema,
um mergulho em seios
turgidos de leite e liberdade.



Jorge C. Chora

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

OS SAPATOS DO SEFUNTO


É muito raro utilizar o táxi como transporte. Nestas duas semanas usei-o mais do que nas últimas décadas, em virtude de estar impossibilitado de conduzir, por alguns dias, por motivo de saúde.

Ao passar num terreno anexo ao cemitério de Benfica, o motorista contou-me uma história curiosa que aconteceu com o seu falecido pai.

Ao velório do pai compareceram as várias mulheres que ele teve, num clima de paz e pesar colectivo. O condutor calou-se em relação à prole do falecido, mas qualquer coisa me disse que o progenitor era capaz de ser do tipo Abraão, pai de uma multidão.

No dia do funeral, ao chegar ao local do velório, achou qualquer coisa de esquisito, parecendo-lhe que o cadáver tinha sido mexido. Foi investigar e descobriu o que havia de estranho: o pai estava sem sapatos.

Indagou o que estava a acontecer e respondeu-lhe a viúva:

-Os sapatos são novos. Ele não vai precisar deles para o sítio onde vai!

Ia perdendo a cabeça. Ordenei-lhe que os fosse buscar:

-Vá buscá-los imediatamente.

E o velho motorista, pesaroso concluiu:

-Está a ver… no dia da ressurreição, o coitado a comparecer sem sapatos!

- Inconcebível! - concordei eu, pensando que alguém ficara, na época, sem a herança e que continuaria a andar descalço por essas ruas fora.

Felizmente, nos dias de hoje, ninguém fica à espera dos sapatos do defunto como outrora
porque, tal como neste caso  ”quem espera por sapatos de defunto morre descalço”.


Jorge C. Chora

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

MÃES

     
Mães são elos
de puro amor,
divindades ofertadas
ao mundo por Deus,
nos dias em que a felicidade
se une à responsabilidade
e a ternura está presente.


Jorge c. Chora

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

O PRESENTE DA LUA



-A Lua avó?
-Está no céu,
escondida por ainda ser dia…
-Vai buscá-la …
E a avó ergue os braços ao céu,
abre uma mão e traz um
seixo mais branco
do que a lua cheia,
 dá-o à neta e diz:
-A Lua não pôde vir
mas pediu à sua neta
que viesse brincar com a minha.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

A MINHA BELA FEITICEIRA



Oh! Que feitiço é o teu,
minha bela feiticeira,
que eu não passo sem ti?
Promete-me, por favor,
 nunca o esqueceres,
 repeti-lo sempre que quiseres,
até ao dia em que te apetecer.
Oh! Minha bela feiticeira,
nunca esqueças o feitiço
que me colocou a teus pés.


Jorge C. Chora

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

PEDIDO


Junta as tuas mãos
em concha, às minhas,
e matar-te-ei a sede
tal como tu a minha.
Se for sôfrego,
perdoa-me, só desejo
que também o sejas comigo.
Sê desavergonhadamente minha
como eu sou teu.


Jorge C. Chora

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

OS CIÚMES RESIDEM NO INFERNO



Se os ciúmes residem no inferno,
nem todos os amores moram no céu.
Banidos estão os amantes do alheio,
assim como os adoradores do vil metal,
sem esquecer os invejosos,
os que amam as guerras,
e os que fingem amar a mulher dos outros.
Afinal se são muitos os quereres
que moram no inferno
e só os amantes no paraíso,
onde moram os que desconhecem
a doce alquimia do amor?


Jorge C. Chora

domingo, 8 de outubro de 2017

VIDA DE PAGÃO,ESPERANÇA DE CRISTÃO



Em Albufeira descobrimo-nos pagãos,
adoradores(as) de deusas(es) de pele dourada,
enxotadores de faunos,
apreciadores(as) de bosques frondosos,
frequentadores(as) de capelas
onde em vez de preces, missas e sermões,
acedemos à cerveja e ao mel
que bebemos, desde já,
à saúde da nossa futura e mais do que certa conversão,
na senda dos nossos sapientíssimos servidores do Divino,
que notam e bem, tal como disse o Padre Tolentino de Mendonça:
 “Em todo o cristão, há um pagão” .


Jorge C. Chora

quinta-feira, 28 de setembro de 2017

DESEJO


Se tu queres,
o que eu quero,
fica sabendo, seres tu   
a quem desejo beijar.
Não há nada
que possamos fazer
de mais acertado,
do que selarmos
com um beijo o nosso desejo,
quando acabar de contar até três:
um. dois…hum que bom
é o nosso beijo.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 21 de setembro de 2017

O MICRO CÃO



O cão era tão, mas tão pequeno, que apodá-lo de micro cão seria mais do que adequado. A sua dona, sempre receosa de que o pisassem, não o deixava andar no chão:  levava-o sempre ao colo.

Os medos que a dona padecia só de imaginar o que poderia suceder ao bicho, produziam-lhe poderosas enxaquecas. Sofria como poucas sofreriam e mais ainda do que qualquer outra, porque era por antecipação que acusava os males de que o bichano podia vir eventualmente a ter ou a acontecer-lhe.

Compadecida do fraco ladrar da amostra, tomou a resolução de o ajudar nessa urgente tarefa.
Ei-la que no meio da multidão, ladrava e torna a ladrar, demonstrando ao pequenote a urgência e a arte de ladrar, poupando-o ao esforço e à chacota dos seus semelhantes.

Neste exacto momento, rodeada por uma multidão, rosna com quanta força tem, pretendendo ensinar-lhe o modo de se fazer respeitar no mundo canino. E o seu empenho é tal que em seu redor se abriu uma clareira e passado algum tempo, surgiram três possantes homens trajando batas brancas. Enfiam-na numa camisa de forças, e apertam-na cada vez mais, à medida que o seu rosnar se intensificava.

Meus amigos, nunca tentem ensinar os vossos animais de estimação de quatro patas a rosnar!

Jorge C. Chora


domingo, 17 de setembro de 2017

DANÇAS FOLCLÓRICAS



Ao som de concertinas
e do toque- toque das socas
das bailarinas,
ondulam os corpos,
serpenteiam  as saias
que se estreitam nas cinturas,
a compasso de castanholas
e de saltos catrapuns,
intercalados pelo toque -toque
das socas das bailarinas,
 que ao som das concertinas,
explodem em cores e sons
de viras, chulas e canas-verdes.


Jorge C. Chora

segunda-feira, 4 de setembro de 2017

VIR,O CAVALO



Ao vê-lo luzidio, nervoso e belo, baptizaram-no de “Vir”. Foram cinco os homens que o viram. Os cinco eram importantes mas um superava o estatuto dos outros, tal o estatuto sócio -económico que detinha.

Todos se sentiram com direito a tomar posse do cavalo negro luzidio. Nenhum decidiu abdicar do magnífico alazão.

Dois deles propuseram o voto, como meio de decisão. O terceiro e o quarto recusaram.

-Se não nos entendemos, eu decido! - declarou o mais poderoso- tenho o voto decisivo, o do desempate, já que ninguém se entende.

Acataram a decisão. Não tinham força para o contestar e aceitavam a alegada superioridade como argumento válido e imbatível.

Decidida a contenda, o poderoso vencedor, aproximou-se do belo cavalo. Levou um coice que o colocou às portas da morte.

Um a um, todos tentaram montá-lo. A todos, sem excepção, aconteceu o mesmo.

Vir, o cavalo, entendia a linguagem humana. Fora há muito aconselhado pelos seus antepassados a fingir que não a entendia. Hoje em dia “ Vir”, o cavalo, toma as decisões pelos humanos quando estes não entendem ou não querem entender o que se passa à sua volta.


Jorge C. Chora

sábado, 2 de setembro de 2017

O JARDIM


Centro de prazeres
sem fim,
pão de Alfeizerão,
alimento de famintos,
loucos e amorosos,
loca de adoráveis
fios d’ouro,
paraíso secreto
e sem igual,
chamam-lhe imensos nomes,
mas a verdade é que és,
o canteiro de prazeres
sem fim,
fonte de sucos divinos,
e de eternas subidas ao céu.


Jorge C. Chora

sábado, 26 de agosto de 2017

O PEIXE JOE



O velho pescador olhou-o e disse-lhe:

-Tu és bom rapaz. Está na altura de conheceres o Joe…

Morava nas margens do lago desde que nascera e fazia anos. A sua prenda de anos, pelo visto, era conhecer Joe.

-Mas quem é o Joe?

-Entra no bote e verás… - convidou-o o pescador.

Entrou e avançaram, em silêncio e a remos, para a margem oposta do lago. Ao aproximarem-se de terra, pararam. O marinheiro colocou as duas mãos em forma de concha e soprou. Ouviu-se uma suave e bela melodia.

As águas do lago agitaram-se e surgiu um peixe com uma enorme cabeça. O rapaz tremeu de medo.

-Nada receies. Joe reconhece os amigos. É o mais antigo habitante do lago. Não há nenhum dos actuais pescadores que seja mais velho do que ele. Quando aqui chegaram já Joe cá estava.

-Mas Joe é um nome…

-Sim, é um nome estrangeiro….foi-lhe dado por um americano há muitos, muitos anos….que tinha esse nome e um dia caiu ao lago e foi salvo, dizia ele, por um grande peixe dotado de uma enorme cabeçorra…

-E essa história é verdadeira?

-Mas não estás a vê-lo?

E nesse momento Joe, lançou-lhe um esguicho de água certeiro que o deixou encharcado.

-Joe sabe que és como S. Tomé… está a dar-te o certificado da sua existência embora o estivesses a ver…

Todos os dias, pela tardinha, Joe aparecia e esguichava-o, deixando-o encharcado e pronto para o banho antes do jantar.

Nunca houve naquele lago quem morresse afogado: todos disseram que o seu salvador tinha sido um peixe com uma enorme cabeçorra.

O sítio tornou-se famoso, atraiu investimentos de vulto e construíram um enorme empreendimento turístico, tendo os primitivos habitantes sido afastados do local.

No dia da sua inauguração, serviram um peixe muito grande, com uma enorme cabeçorra que já ninguém sabia ter-se chamado Joe e ter sido a alma desse lugar.


Jorge C. Chora

terça-feira, 22 de agosto de 2017

A SEMENTE DA "MAIS VELHA"


“A Mais Velha”, assim era conhecida pela miudagem do bairro, parecia não conseguir andar, mas o certo é que colocava um pé a seguir ao outro. Quem estivesse atento e tivesse algum tempo, percebia que ela, embora lentamente, progredia.

Houve quem reparasse, que para além da peculiar marcha da” Mais Velha”, que ela transportava, todos os dias, uma pequena jarra de plástico, com água.

Demorava uma eternidade a atravessar a rua. Impacientes com a demora, os condutores buzinavam. Ela levantava a mão e pedia desculpa. Quando repetiam as buzinadelas, ela sorria e murmurava: oxalá chegues à minha idade …

Chegada ao passeio que dividia a faixa de rodagem, deitava os pingos de água que tinham sobejado após a atribulada travessia, numa pequena clareira onde nem sequer havia uma flor.

Curiosos com a persistente acção da “Mais Velha”, resolveram um dia ver o que ela tanto regava e a surpresa estampou-se-lhes no rosto: a senhora não estava boa da cabeça!

No dia seguinte, ela fez-lhes sinal para que se aproximassem. Receosos, acabaram por aceder ao pedido.

- Estão surpresos por eu estar a regar um local sem nada? Se me ajudarem acabarão por ver ali nascer uma árvore que dará frutos. De que frutos gostam mais?

E fartaram-se de discutir e concluíram que a maior parte gostava de pêssegos.

-Pois meus amigos, nem é tarde nem é cedo, basta que me ajudem a regar e ali nascerá um pessegueiro, pois os vossos desejos são ordens para mim -e sorriu, porque lá tinha semeado caroços de uns belos pêssegos que comera.

E quando o pessegueiro nasceu e surgiram os primeiros pêssegos, a “Mais Velha” foi considerada um prodígio da natureza.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

O BALOIÇO



Pé ante pé a septuagenária aproximou-se do parque infantil situado no jardim. Perscrutou as proximidades com o seu olhar arguto. Só após ter obtido a confirmação de que não se via ninguém, entrou. Descalçou os sapatos altos, soltou os cabelos que lhe caíram em cachos, levantou ligeiramente as saias e sentou-se no baloiço.
Baloiçou-se devagar, de início, e depois de forma cada vez mais enérgica, cantando a plenos
pulmões:

_” Fui ao jardim da Celeste, girofflé  girofflá…”

De súbito vê, ao fundo, alguém a entrar no parque. Salta do baloiço, calça-se, apanha o cabelo e sai, queixo levantado e mala no braço. Cruzou-se com quem tinha entrado e cumprimentou-a:

-Muito bom dia.

-Para si também minha senhora.

Jorge C. Chora



terça-feira, 15 de agosto de 2017

A MINHA ADUFEIRA/ FEITICEIRA



Gosto d’uma adufeira,
autêntica feiticeira,
senhora de palavras e ritmos,
que tem o poder de despertar,
o melhor que há em mim.
Oh, como é bom gostar
desta adufeira, que é feiticeira,
e me dá o melhor de si,
e acorda o que há de melhor em mim.


Jorge C. Chora

quarta-feira, 26 de julho de 2017

AVÓS


De bengala ou sem ela,
ei-los que se metamorfoseiam
em futebolistas, monstros e fadas;
 também povoam os parques
na companhia dos netos,
que os deixam de cabeça
perdida quando correm
a mil à hora:
-Cuidado, vão devagar…não se aleijem…
E os netos, na flor da vida, circulam
nos seus ritmos próprios,
 brincam, penduram-se, gritam
 e quando algo corre mal,
ai vão eles de braços estendidos
e lágrimas a ensopar vestidos,
em busca dos seus portos seguros:
-Avô…avó
E no meio da choradeira e dos
copiosos beijos que recebem,
lá se acalma a petizada,
partindo para outra aventura,
 sob os olhares atentos dos avós,
 que com o coração na boca,
 vão pedindo a Deus
 que nada lhes aconteça.
Suspiram de alívio
ao regressarem com eles sãos e salvos,
carregando-os ao colo,
invocando todas as forças,
e até os santinhos de pau oco,
 para que consigam subir
àquele último andar sem elevador.


 Jorge C. Chora 

terça-feira, 25 de julho de 2017

BLI


Morreu a minha Bli,
uma amiga
pequena e amarelada,
que sorria miando
e acariciava com
as patas tocando.
Não regateava um carinho,
roçava-se e retribuía
os afagos que recebia.
Morreu cumprindo
os rituais de mimo
que oferecia,
já sem miados
que não conseguia emitir.
Morreu hoje, pelas 11h45,
aquela a quem chamei Bli,
diminutivo de Blimunda,
a noiva do Sete-Sóis,
que tal como ela,
tinha poderes de
ver por dentro e encantar.
Adeus Bli.


Jorge C. Chora

sábado, 22 de julho de 2017

AO MEU NETO FRANCISCO



Sete são as cores do arco-íris,
tantas quantos anos fazes,
os mesmos sete que Deus
levou a criar o mundo,
e que agora, esperemos,
seja cada vez mais teu,
sob a magia desse arco
e o encanto das suas cores.

       Jorge C. Chora

         22/o7/2o17



quinta-feira, 20 de julho de 2017

DIA DOS AMIGOS


Não passamos sem eles
 nem eles sem nós,
embora possamos estar
sem vê-los,
nem tê-los
ao pé de nós,
sem qualquer hipótese
de esquecê-los
ou sermos esquecidos,
pois amigos
são como irmãos
desde sempre.


Jorge C. Chora

sexta-feira, 14 de julho de 2017

SEMPRE MENINA


Ver-te no arraial
envolta em
música de feira,
ora acima ora abaixo
a andar no carrossel,
faz-me ver
a criança que
há em ti,
alegre e descontraída,
entregue ao jogo e a
ti própria,
num bailado imaculado,
entre a inocência e o mundo.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 6 de julho de 2017

CAETANA


Doce Caetana
de olhos verde-mar,
dizes olá e acenas
a toda a gente,
rainha como és
da ternura e da simpatia.
Ei-la que vai no seu carrinho,
cabelos louros em grandes
rolos esvoaçantes,
acenando e dizendo olá a toda a gente
e enviando beijinhos
aos meninos e aos idosos que vai vendo,
comemorando os seus dezoito meses
e apontando com a mão direita
a direcção do parque e o motivo
da sua saída de casa:
-“Balouxos…balouxos…”
E aí vai ela,
a doce Caetana
de olhos verde-mar,
convicta do que quer,
repetindo a espaços
o que deseja:
-“Balouxos…balouxos”
Não vão os vovós,
esquecerem-se do que
a menina quer e dizerem não
ao que a Caetana já disse sim.


Jorge C. Chora

sábado, 1 de julho de 2017

O DESANIMADO



Três vezes consecutivas olhou para o relógio. Um minuto depois, olhou-o de novo. Era quase meio-dia e todos os dias era assim. O reformado desabafou:

-Está quase na hora do sacrifício…

-Como assim? - questionaram alguns conhecidos que nunca tinham percebido o motivo da agitação àquela hora.

- São horas de almoço e espera-me uma panela de massa que ando a comer há três dias…

-Mas, por que não faz menos?

-Não sei controlar as doses…desde que a minha santa morreu … ando nisto… se ao menos tivesse companhia, ajudava-me a comer…

-E qual é o problema em arranjar companhia?

-Sabem lá vossemecês! Já desisti. As três primeiras com que contactei, perguntaram-me quanto tinha de reforma, se tinha carro, casa de praia, qual o montante de depósito bancário e que países costumava visitar nas férias!

- E desistiu?

-Não, o pior estava para vir. A única de que gostei e me atraía, foi um balde de água fria. Era mesmo interessante e tão atraente era que até me passou pela cabeça dar-lhe um leve toque no rabinho…

-E… -incentivaram os ouvintes, curiosos.

-Não me largou. Contou-me tantas, mas tantas desgraças …até que finalizou com um pedido:
precisava com urgência de cinquenta mil euros!

-E?

-Não vos conto mais nada. Só vos digo que, para mim, a busca de companheira é coisa do passado: não quero nenhuma.

Uma idosa que estava no bar, franziu o sobrolho e desabafou:

-E eu que não me importava de ser cozinheira…sobra-lhe alguma coisa no banco?


Jorge C. Chora

quinta-feira, 29 de junho de 2017

O MEL E O FEL


Um pouco de
mel e outro tanto
de fel, todos nós
 desejamos ter:
mel para atrair
e o fel para repelir,
em doses certas,
ajudam-nos a viver
e a acertar.
O pior é quando
a harmonia se quebra
e o desequilíbrio se instala
e passamos a atrair
o que queríamos repelir
e a afastarmos o que
desejávamos possuir.

Jorge C. Chora


quinta-feira, 22 de junho de 2017

OS BOMBEIROS E AS PRECES À CHUVA


Quando castelos de chamas  
desfiguram tudo o que encontram,
vislumbram-se nas clareiras,
pequenas figuras que bailam,
açoitando e combatendo
 o fogo traiçoeiro e vil,
com tudo o que têm à mão.
Floresta dentro,
heróis e heroínas
emergem das labaredas,
sem dar tréguas,
repletos de determinação,
e só param para orar:
amiga chuva,
vê se te apressas,
há aqui vidas
de simples mortais,
e é preciso salvá-las…
esquecendo-se que
eles também,
para além desta vida
não possuem mais nenhuma.



Jorge C. Chora

quinta-feira, 15 de junho de 2017

NÃO TE VÁS!



Não te vás meu amor
 quero-te ao pé de mim.
Moras em mim
tal como eu em ti
e gosto que seja assim,
mão na mão,
a ampararmo-nos um ao outro,
trocando beijos e juras de amor.
Não te vás meu amor,
que te quero ao pé de mim,
mão na mão,
trocando palavras de amor.

Jorge C. Chora


sábado, 10 de junho de 2017

TITO E OS XIXIS PUNITIVOS

                                                   
De olhos esbugalhados, aproxima-se de modo sorrateiro dos fregueses da churrascaria. Roça-se até que a sua presença seja notada. Senta-se e olha para o cliente e amigo. Funga de modo delicado e lambe os beiços. Já disse ao que vinha: quer que partilhem consigo uns bocados do pitéu que estão a saborear.

Até há pouco tempo, a estratégia do Tito, um cão arraçado de pequinês, resultava em cheio. Ossos, pedaços de carne e pipas eram acepipes do seu agrado e que recebia sempre que pedinchava.
A idade e alguns abusos, trouxeram-lhe problemas cardíacos e respiratórios que aliadas à obesidade, lhe interditaram, a pedido expresso do dono, a continuação das comezainas e as doações dos fregueses.

Tito não quer saber de desgraças. Continua a rogar, a seu modo, as iguarias a que se habituou.
Quando não lhas dão, aproxima-se dos sapatos de quem lhe negou os petiscos, alça a perna e urina-lhe o calçado.

É curiosa a dança executada pela clientela quando o Tito está por perto. Esconder os sapatos, desviá-los das mijocas punitivas é o grande objectivo. Nem sempre é conseguido. O que vale é que o cachorro só faz uns pingos já que passa o dia inteiro a alçar a perna.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 1 de junho de 2017

PÓZINHOS DE ADUBAR MENINOS


De colo e de beijinhos
vivem as crianças 
de bochechas reluzentes.
Juntem-se-lhes as batatas,
a educação e o respeito,
por elas e pelos outros,
adicionando-lhes alguma
liberdade, temperada de
responsabilidade, e eis
que os teremos, tudo indica,
lhanas, livres e felizes,
como podem ser,
todas as crianças.


Jorge C. Chora

terça-feira, 30 de maio de 2017

A FRUTEIRA



Transportava a fruteira de cristal, encostada ao peito e segura com ambas as mãos. Estava na sua família há muitos anos. Era como que uma jóia, cuidada e transmitida de antepassado em antepassado. Podia dizer-se que o objecto era o único de valor em sua casa.

João, de dez anos, transportava-a a pedido de sua mãe, a caminho da casa de penhores. Já com a mãe à vista, esta acenou-lhe e sorriu-lhe, com o coração nas mãos, pois se havia pessoas desastradas e azaradas, João era seguramente um deles. O estabelecimento fechava daí a dez minutos. Acelerou o passo e a progenitora receou que João tropeçasse, que viesse alguém e lha roubasse ou algo do género. E foi com os olhos abertos que viu concretizar-se o seu receio.

Viu a fruteira estilhaçar-se no passeio e não percebeu o sucedido. Ouviu-se uma travagem e viu o João com uma criança de dois anos ao colo. Acabara de salvá-la de ser atropelada. O pequeno saíra a correr de uma loja, vizinha da de penhores.

-Desculpa-me mãe…

-Não tens de desculpar-te, salvaste aquele pequenino … - e, comovida, abraçou o João.

Sem o dinheiro da renda na mão, ouviram o comentário do funcionário da agência:

-Que historieta é que me vão contar?

Jorge C. Chora


quinta-feira, 25 de maio de 2017

O TEMPO REAL


Pendurei-me nos ponteiros
quando eles estavam sobrepostos.
Era meio-dia,
e acreditei
que os tinha parado.
Eis senão quando,
breves segundos passados,
sessenta para ser exacto,
fui empurrado
e projectado para
o tempo real,
aquele que não
se compadece com relógios
parados, com o dizer
bom-dia a quem se desconhece.
Era meio-dia e acreditei…
Helás!


Jorge C. Chora

quarta-feira, 24 de maio de 2017

UM AMOR ASSIM


 Ai se soubesse
que o amor era assim,
juro,
ter-me-ia esforçado
 por nos termos conhecido
mais cedo,
talvez a partir
da maternidade,
ou o mais tardar,
da classe infantil.
Ai se soubesse que
o amor era assim…


Jorge C. Chora

sexta-feira, 19 de maio de 2017

UM ABRAÇO



Um abraço
funde dois corações,
permite senti-los bater
a compasso,
conjuga o verbo amar
ao ritmo de um tique-taque:
eu amo-te,
tu amas-me.
Nos braços um do outro,
dois seres dão testemunho
do seu amor,
sem que tenha sido dita
uma só palavra,
embalados ao
ritmo do tique-taque.



Jorge C. Chora

domingo, 14 de maio de 2017

A CUNHA AO DEMO



Pediste ajuda
ao diabo
e ele não ta recusou,
agora que ele
te pede a mão,
como lha podes negar?
Dizes que ele pede
o quádruplo do
que te deu?
Espera e talvez ele
te exija o décuplo
e sejas incapaz de lhe
dizer não,
 pela vergonha
de se saber que
lhe pediste
ajuda
e ele não ta recusou.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 11 de maio de 2017

SAUDADES DE TI


Mal te vi
e ainda estava
perante ti,
já a vontade
de te rever
se tinha apossado
de mim
e transformado
em saudade
de te ter
ao pé de mim.


Jorge C. Chora

sábado, 6 de maio de 2017

OS BEIJOS DAS MÃES


Os beijos das mães aquecem a alma aos filhos.  Os abraços apertados que lhes dão, retiram-lhes a respiração: são dados àqueles, que nunca deixaram de ser os seus meninos.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 4 de maio de 2017

DIA DA MÃE



Mãe é aquela pessoa em cujo coração os filhos moram em permanência. É a garantia de amor incondicional.


Jorge C. Chora

terça-feira, 25 de abril de 2017

A HERANÇA



José teve seis filhos e qual deles o pior. As pessoas mais crédulas acreditavam que algo de bom deveriam ter, mas acabaram por desistir de tal crença, por acharem a tarefa demasiado hercúlea e infrutífera.

Unia-os uma cobiça avassaladora, o fingirem-se humildes com os fortes, serem velhacos com os fracos e dotados de uma inveja sem tamanho, para além de desprezarem o pai por ser pobre. Alvo de vilanias, calava as infâmias e só pedia uma graça a Deus: que lhe saísse a sorte grande. Caso ela lhe coubesse na sorte, tinha a certeza que eles o tratariam de outro modo e talvez se dessem bem entre eles.

O tempo foi passando e a sorte nunca lhe bateu à porta. Um dia José morreu. Vasculharam-lhe os míseros aposentos e nada acharam. Na ânsia de herdarem qualquer coisa, inquiriram os seus companheiros de infortúnio, que lhe indicaram um amigo que recebera um documento com instruções, acaso ele morresse antes.

Depressa chegaram ao depositário do documento. Este informou-os de que só poderia dar-lhes conhecimento do “testamento” quando estivessem todos presentes, no quarto onde o pai falecera.

No dia aprazado, o amigo do José, abriu a porta do quarto, na presença de todos os filhos. No chão uma grande campânula em prata, tapava um prato também em prata.

O fiel depositário da carta do José, abriu-a e iniciou a sua leitura:

Caras(os) Filhas(os)
Tudo o que tenho e vos deixo, está à vista. Estes objectos em prata maciça, devem ser partilhados por vós e tal tarefa incumbe…

E a leitura foi interrompida, porque os seis filhos iniciaram uma luta pela posse dos objectos.

Quando se acalmaram, a leitura foi retomada: …e tal tarefa incumbe ao filho mais sensato, àquele que não lutou por eles. Caso todos tenham participado, aos meus filhos destino o conteúdo oculto pela tampa e ao meu amigo os objectos em si.

Acorreram os filhos a levantarem a tampa e depararam com um horroroso achado: um enorme cócó do José.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 13 de abril de 2017

NO DIA DO BEIJO



Há beijos de amor,
de amizade
e até de traição.
Colocando de lado
os de Judas,
restam-nos os
dois primeiros,
sendo os de amor
os melhores,
e os outros
os mais fraternos.
Mas como o
verdadeiro amor
é fraterno,
qualquer beijo
 é de amor,
pelo que vale
sempre a pena
dar e pedir um
beijo, nem que seja
 de amizade.


Jorge C. Chora

O OVO DE PÁSCOA



Era obcecado pelo essencial. O que lhe interessava era o sumo, o importante, o estritamente necessário: o restante era superficial, conversa mole para se deitar fora. Alcunharam-no de “Essência”.

A sua secura, não cativava quase ninguém. Os que com ele conviviam, faziam-no profissionalmente e tinham-lhe um profundo respeito. Muitos chegavam a receá-lo.

Pórcia, uma jovem colega, que nunca mostrara qualquer animosidade ou receio na sua relação com o “Essência” deu-lhe uma prenda na Páscoa:

-Uma Páscoa doce - desejou-lhe.

Ele olhou para a prenda. Era uma caixa de papel que se assemelhava a um pequeno caixão. Arrepiou-se. Abriu-a e viu o interior repleto de fragmentos de chocolate. Num canto, um pequeno cartão rezava assim:

Para quem ama a essência e despreza a forma, divinos pedaços de chocolate do que foi um belo ovo de Páscoa.
Beijos da Pórcia.

O “Essência” agradeceu, beijou-lhe a mão e disse:

-Em suma, mostraste-me que a aliança perfeita é entre a forma e a essência. Obrigado Pórcia.


Jorge C. Chora

terça-feira, 4 de abril de 2017

O INESQUECÍVEL BOOGIE


Este fim-de-semana, quando visitava a feira de Belém, ouvi um casal de certa idade a chamar o seu cão:

-Anda cá Boogie … vem cá Boogie

O nome trouxe-me recordações de há muitas décadas. Elas não se prendiam com o reino canino mas com alguém que conheci, cuja alcunha era exactamente essa: Boogie.

O Boogie era um homem de estatura meã, dotado de uma grande barriga, parecendo dançar com ela. Fazia-se anunciar antecipadamente pela sua proeminente barriga, sobre a qual cruzava os braços, entrelaçava as mãos e fazia circular os dedos polegares como se manuseasse um rosário de contas imaginário entre eles...

Boogie, pelas nossas contas, era mais velho do que Matusalém. Diziam e ele alimentava a lenda, de ter vivido, não me recordo bem se por esta ordem, trinta anos em França, vinte na China e quarenta na Conchichina, fora os que não contara no Brasil, em Portugal e o ror de anos que vivia no ultramar: tudo somado podia ter sido pai do próprio e vetusto Matusalém.

Boogie era também um verdadeiro criador de montes, montanhas, colinas e cordilheiras no cocuruto da gaiatada: ofertava caroladas de modo democrático, à direita, à esquerda e ao centro.

Era também um verdadeiro apreciador dos lóbulos das orelhas que puxava e torcia a seu bel-prazer, como castigo, acompanhado em geral pela expressão:

-Ena rapazola! – e esfregava o dedo indicador no polegar, de modo enojado, queixando-se de que escorriam gordura  -Tens de lavar as orelhas…Esquecendo, de propósito, a temperatura elevadíssima, típica de um clima tropical quente e húmido. Os “rapazolas” até se esqueciam da dor, com os ditos do Boogie. Só por mera acaso não levei carolos ou puxões de orelhas.

O Boogie era assim e acredito que haja quem dele tenha saudades, pois o tempo pode levar ao esquecimento ou tornar simpático e cómico personagem daquele calibre. Outros tempos. Livra!



Jorge C. Chora

domingo, 2 de abril de 2017

PUXAR O LUSTRO ÀS MAÇÃS



A ordem foi seca e peremptória:

-Vão puxar o lustro às maçãs.

E os dois jovens dirigiram-se à cesta, onde elas estavam e iniciaram o cumprimento escrupuloso da instrução recebida.

De pouco ou nada valia dizerem que elas já brilhavam, que já tinham executado a mesma tarefa no dia anterior. Limparam as mais brilhantes pois sabiam que o patrão daí a minutos surgiria para a costumeira fiscalização. Mal tinham acabado de pensar nisso quando o proprietário os interrogou:

-A tarefa está pronta?

-Quase! Já encerámos estas doze- e apontavam para as mais lustrosas.

-Muito bem…continuem… -  e dirigia-se para o seu cadeirão colocado no fim da loja, donde vigiava a totalidade do espaço.

No dia seguinte, logo de manhã, o cesto das maçãs lustrosas era ladeado por dois cabazes de maçãs normais, a metade do preço em relação às que brilhavam .

-Tanto trabalho para ninguém as comprar! -resmungaram os jovens.

E o patrão respondeu, sonolento e de olhos semicerrados:

-Parecendo que não, cumprem várias funções da maior importância. A primeira a de atrair a atenção de quem passa; a segunda é a de realçar o baixo preço das que estão ao lado; a terceira, é que não há quem passe sem as apalpar, o que não lhes dá saúde mas dá prazer aos que lhes mexem, o que explica porque ninguém as compra.

- Quem sabe, sabe! -exclamam os jovens, puxando vigorosamente o lustro às maçãs que rodopiam nas suas mãos.


Jorge C. Chora

sexta-feira, 24 de março de 2017

O MÚSICO DA BUZINA



Os olhos quase lhe saltam das órbitas: gravitam a uma velocidade ímpar, seguindo tudo o que tem rodas e mexe. Mal um carro surge na rua, entra em frenesim.

Postado no passeio, até rezaria se estivesse com as contas em dia com o Sereno. Não vale a pena fazê-lo. Receia correr o risco de ver o pedido atendido e cobrado por Satanás e desse tem ele medo . Tem esperança de que o incauto acabado de chegar, estacione em frente ao portão da sua garagem. O condutor abranda, mas não encontra um lugar.

Percorre o local duas vezes e à terceira, estaciona frente ao portão colectivo da garagem, sob o nariz do agitado observador.  Apressado, corre em direcção ao seu carro, estacionado no interior. Liga-o e sobe a rampa a toda a pressa. Trava uns centímetros frente ao que lhe impede a saída e buzina, buzina e torna a buzinar. Minutos depois surge alvoroçado o dono da viatura que lhe bloqueia a entrada, retira-o e pede-lhe mil desculpas.

Dá uma pequena volta à praça, para que não digam que não precisava de sair e regressa à garagem. Deixa-se ultrapassar por alguém que chega. Pede a todos os santinhos que o “transgressor” lhe impeça a entrada. Nada acontece porque surge uma vaga. Sopra desiludido. Parecendo que não, é menos uma oportunidade de buzinar.

Retorna ao seu posto no passeio. Segue com os olhos outro carro acabado de chegar. Saliva. Pode ser que tenha sorte e passe mais um bom bocado da manhã a tocar à buzina.

 Ultimamente anda até a pensar em aperfeiçoar os seus toques de buzina e a aprender a tocá-la por pauta.



Jorge C. Chora

terça-feira, 21 de março de 2017

OS POEMAS SÃO...



Os poemas são flores
com cheiros, sabores
e variedade de cores.
De um poema que se gosta,
se diz que é uma flor
e dela, quando é bela,
que é um verdadeiro poema!
Ora digam lá se não há
poemas-flor quando
alguém ambos ama,
e agita na mão direita um poema-flor
e na esquerda uma flor-poema!


Jorge C. Chora

sábado, 18 de março de 2017

DÃO-SE DORES


Tenho saudades do tempo
em que não tinha dores
e caminhava ligeiro,
tal e qual um andarilho.
Quem me dera ser
banqueiro e delas
me poder livrar,
como se fossem acções de
grande valia, a título
de antevisão futura,
de experimentarem
andar como os cágados,
numa sociedade de aves de rapina,
sempre pronta a elevá-lo
aos céus para vos
deixarem cair em zonas alcantiladas,
estilhaçando-vos a carapaça,
para vos comerem
de forma fácil e pouco
ou nada trabalhosa.
Quem me dera ser banqueiro
e livrar-me das dores,
como se fossem títulos
de grande valia…


Jorge C. Chora

quinta-feira, 16 de março de 2017

UMA GATA À JANELA



Há uma gata que passa
o dia à janela,
a cumprimentar quem passa:
-Bom dia bonitona…bom dia
bonitão…
Mas não há quem
lhe responda ou
lhe conceda um simples
sorriso, a troco de nada,
só embrulhado em simpatia.
A troco de nada,
já ninguém dá nada,
nem que seja
 um simples sorriso,
só embrulhado em simpatia,
excepto a gata,
que à janela,
cumprimenta quem passa:
-Bom dia bonitona…bom dia
bonitão…


Jorge C. Chora

quinta-feira, 9 de março de 2017

REQUIEM PARA A MULHER SEM CHETA



Morreu de vergonha
a mulher sem cheta
a quem nem a sede nem a fome
 tinham conseguido vencer.
Resistiu até ao fim,
escondeu a miséria,
silenciou o ruído
 do seu estômago vazio,
dos sonhos traídos,
dos vexames sofridos.
Morreu de vergonha
ao ser-lhe penhorado
o último refúgio,
por ser pobre e não ter cheta.
Aos aristocratas d’outrora,
assistia-lhes o privilégio
de se suicidarem por
vergonha de terem
cometido actos infamantes
ou de lesa-majestade.
À mulher de agora,
restou-lhe morrer
de vergonha, unicamente
por ser pobre e não ter cheta.


Jorge C. Chora

terça-feira, 7 de março de 2017

MULHERES


As mulheres
são a metade solar
da humanidade,
 rosas que medram
 cercadas de espinhos,
sem deixarem de exalar
 o seu perfume inebriante.
Fazem soar bem alto as suas vozes,
sempre que as querem calar,
retirar-lhes o direito de opinar,
negar-lhes o direito
de serem quem são,
a capacidade de dizer não.


Jorge C. Chora

sábado, 4 de março de 2017

A MORTE DO VELHO QUE AMAVA A POESIA


De luto não está a cidade
pela morte do velho
que amava a poesia
e bebia copos- de- três.
Os sinos não repicaram
a assinalar a sua morte
e poucos sentiram a falta
do Zé Ninguém
que amava a poesia
e bebia copos-de-três.
Amou quase toda a gente,
excepto os crápulas, os reles,
os vaidosos sem qualquer razão
para o serem,
os seres desprezíveis
e aproveitadores das
misérias humanas.
Está-se nas tintas
para quem ignora a sua morte
e paga-lhes na mesma moeda:
passa por eles deitado,
sem lhes ligar nenhuma,
o homem que amava a poesia
e bebia copos-de-três.
Morreu como viveu:
amando os que mereciam,
desprezando os que,
pouco ou nada valiam.

Jorge C. Chora

domingo, 26 de fevereiro de 2017

CARNAVAL



Loura desnuda
de alvas e rijas carnes,
tendo à ilharga uma morena
que se saracoteia
e se transforma num doce pecado,
reluzente e escorregadia,
saborosa enguia,
festim aos olhos de quem aprecia,
demónio para quem a inveja
e desdenha.
E como a igualdade tem de ser
defendida, também há matulões
despidos, regozijo de mascaradas
que ninguém vê se estão entusiasmadas.
Que siga o carnaval,
com as suas picardias
e as horrorosas matrafonas.
Divirtam-se que amanhã
é outro dia,
 o regresso à salgalhada
e ao cartapácio de malfeitorias.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

O ANDARILHO



Não houve terra onde
não fosse, local onde
não pisasse, sítio onde
não tivesse estado e onde
não quisesse regressar.
Não fosse esse alguém,
um andarilho português,
 sempre saudoso dos lugares onde esteve,
 ou mesmo daqueles em que
um dia imagina poder estar,
ninguém compreenderia
uma saudade do tamanho
do mundo inteiro.


Jorge C. Chora

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

É OU NÃO VERDADE?



Se aprenderes a conhecer
as estrelas do firmamento,
talvez te surpreendas
ao descobrires que sempre
tiveste uma a teu lado.
Repara e diz que não é verdade!


Jorge C. Chora

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

UM PAÍS COM DOIS DIAS DOS NAMORADOS



No doce calor de Junho,
comemora-se o Stº António,
santo casamenteiro
 e protector dos namorados,
que os embala e motiva
até aos rigores de Fevereiro,
em que os enamorados se enlaçam,
não vá o frio apartá-los
e a relação esfriar.
Que bom ter dois dias dos namorados,
um nos dias quentes e outro nos dias frios,
pois não há nada tão saboroso,
como um namoro bem temperado,
ou não vivêssemos em Portugal.



Jorge C. Chora

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

O MENINO DO CANTO


No canto estava, no canto ficava. Ocupava um dos cantos da sala, o da entrada à esquerda. Era raro de lá sair. Era conhecido como o menino do canto, o que não falava e do qual todos se queixavam:

-Ele bateu-me…

-Eu tenho medo dele…

E o menino que lá vivia, com o nariz torto e o lábio fendido, encolhia-se e nada dizia.
Provocavam-no os pequenos colegas:

-Ele não sabe nada! Nem sequer fala!

Um dia contrataram a Rosa, uma auxiliar com uma deficiência numa perna, a quem os outros meninos chamavam bruxa, mas que por dentro era tão doce como o mel.
E o menino do canto, passados uns dias, chamou-a para ao pé de si:

-Senta-te aqui ao pé de mim …

E Rosa abriu os olhos, surpreendida:

-Mas tu falas meu menino…

- Sim Rosa… mas eles querem acreditar que não…

Enquanto Rosa, incrédula, o ouvia, o menino desenhou, num traço trémulo, um enorme coração e ofereceu-lho:

-Para ti Rosa.

E no rádio de pilhas que Rosa tinha no bolso da bata, ouvia-se baixinho  “Oh love, love me do, you know I love you…”


Jorge C. Chora

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

GERVÁSIA E AS PRENDAS DA LUA



A avó Gervásia tem e teve sempre alegria para dar e vender. Ao pé de si ninguém está triste e os que estiverem deixam de estar.

Cruzou-se com a Amélia, de sete anos de idade, e achou-a chorosa. Chamou-a e disse-lhe:

-Minha doce Amélia, não estou a gostar de te ver triste!

Abriu a carteira e deu-lhe um belo espelho, com uma condição:

-Sê vaidosa contigo própria. Vê-te todos os dias ao espelho. Se não te estimares a ti própria, ninguém o fará. Começa agora.

E Amélia viu-se ao espelho e ao ver Gervásia franzir o nariz e fazer-lhe uma careta, sorriu divertida.

-Vês Amélia, quem sorri tem a aprovação da lua, do sol e das estrelas…

-Como assim avó Gervásia?

-É simples. Estás com um lindo sorriso de lua cheia, alegre e viva como sol e os teus olhos  cintilam como estrelas.

Amélia tornou a olhar-se ao espelho e concordou:

-É verdade avó Gervásia! -E descansou a sua pequena cabeça no ombro amigo da velha Gervásia.


Jorge C. Chora

domingo, 5 de fevereiro de 2017

TAL COMO OS PARDAIS



Tal como os pardais,
os portugueses estão
em todo o lado
e também voam,
como eles,
 em liberdade
 por esse mundo fora.
Tal como os pardais,
fazem o ninho em
distantes regiões,
adaptam-se a diferentes
viveres e culturas,
sem destoarem dos locais.
Sobrevivem em condições
adversas e não se atemorizam
por dá cá aquela palha,
que medo, medo,
 por assim dizer,
só o têm às corujas e falcões,
mas nem a esses os
portugueses temem,
contrariamente à saudade
que têm da terra que os viu partir.
Tal como os pardais,
em geral são pequenos,
mas só de tamanho.


Jorge C. Chora

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

O" MAMMA MIA"



Gabava-se de que Salomão ao pé de si, era um simples principiante, pois só teria mil mulheres, 700 das quais eram esposas e só trezentas concubinas. As legítimas não contavam, eram só esposas e isso, a seu ver, tirava-lhe a emoção, o sal da relação, o sabor do proibido, o adorado paladar do pecado.

Chamavam-lhe o “Zé das Mil”, tantas eram as mulheres que, no mínimo, reivindicava como tendo sido suas, acrescentando pormenores como se de troféus se tratassem, principalmente quando elas tinham maridos.

Um belo dia teve um encontro com um” bruto” que o viu a adejar, feito bailarina, junto da sua amada. Esta não se queixou, limitando-se a mostrar o seu desagrado, perante as estafadas e pouco nobres manobras do Zé das Mil.

E foi a partir daí que o antigo Zé se transformou em “Mamma Mia”, tal o apertão que levou, advinha-se onde e com que força. Mas o mais surpreendente para os” amigos”, é que ele passou a adorar” brutos”, mas desses não lhes gaba as façanhas, nem deles nem as suas.

 Limita-se agora a ser o ”Mamma Mia”, gosta de sê-lo e ninguém tem nada a ver com isso. E de facto não tem.

Jorge C. Chora



quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

UM AMIGO



Um amigo(a) é alguém
que podemos não ver há anos,
mas com quem falamos
e nos entendemos,
como se o tempo não tivesse passado.

 Também podemos ter estado
 juntos há bocado
 e dele já termos saudades.
Um amigo é isso mesmo:
alguém que está sempre presente,
 esteja perto ou mesmo longe
mas nunca se desfaz de nós.


Jorge C. Chora