À porta de
casa, após ter perdido a mãe há um mês, Júlia recebeu duas cartas carimbadas e
registadas: uma, a anunciar-lhe ter sido despedida e a outra a dar-lhe um
pequeno prazo para abandonar a casa onde tinha nascido, em virtude de o
contrato estar em nome da sua mãe, que falecera, ou caso contrário, a pagar o
quadruplo da renda.
Saiu
desvairada de casa, cirandou sem rumo por essa Lisboa, sem conseguir pensar em
nada ou em qualquer solução.
À medida que
se cruzava com pessoas ia dando os bons dias, ainda que por puro hábito.
Ninguém lhe respondeu.
Num jardim
povoado de gente, achou uma corda no chão, fez um laço corrediço, lançou-o a um
tronco forte e à vista de todos enforcou-se.
Ninguém a
demoveu ou sequer se moveu. Levantaram-se e foram-se embora, exceto uma velha
peixeira que por ali passava. Correu a agarrá-la pela cintura, tentando
suportar o seu peso para evitar que se enforcasse.
Gritou por
ajuda pois, sozinha, não tinha forças para sustentar a jovem, mas sem auxílio
não conseguiu aguentá-la por muito tempo e o enforcamento deu-se.
Rezou-lhe uma
Avé Maria, ainda agarrada à cintura da jovem.
Uma lágrima de
desespero e raiva escorreu-lhe pela cara, por não ter conseguido evitar aquele
desfecho.
Pagou o
funeral da jovem e na lápide mandou inscrever o seguinte dizer:
AQUI JAZ UMA
JOVEM, QUE NINGUÉM QUIS AJUDAR.
OXALÁ NÃO
VOS ACONTEÇA O QUE A ELA ACONTECEU.
Jorge C.
Chora
25/11/2023