Alice achou
estranho a importância dada ao castelo naquela localidade. Volta meia-volta, as
pessoas diziam que tinham de ir ao castelo.
O mais
curioso é que Alice, por muitos esforços que fizesse, não conseguia vislumbrar
castelo nenhum.
Caía a tarde
quando a pequena Joana pediu à mãe para ir com ela ao castelo.
-Outra vez?
Já foste de manhã e depois do almoço!
Alice tomou
atenção ao pedido. Desta vez desvendaria o mistério do castelo invisível.
Seguiu a mãe
e a Joana pelos caminhos pedregosos da aldeia. Sempre a subir, por uma calçada
constituída por pedras irregulares, quer na forma quer no tamanho e na altura,
tropeçou a cada passo. O pior foi depois, quando deixou de haver calçada e
seguiram morro acima, derrapando a todo o momento.
Joana e a
mãe, ao verem a estranha atrás de si perguntaram-lhe:
- Também vai
ao castelo?
-Sim quero
ir, não se importam que vá convosco?
-De nada,
assim fazemo-nos companhia umas às outras, não vá aparecer-nos uma alma penada,
que se está a fazer tarde!
E a escalada
continuou por um bom bocado mais. Chegados ao topo do morro, encontram três
pessoas, dois homens e uma mulher, agachados.
Se quer vá
ali atrás da moita e alivie-se. Se não tiver papel, há ali umas folhas…
Estava
explicado o mistério das idas ao castelo. Mas castelo por que razão?
A mãe de Joana,
após o respetivo alívio explicou-lhe:
- Dizem que
aqui houve, em tempos idos um castelo dos mouros… enquanto não fizerem lá em
baixo, uma casa de alívio, temos de continuar a vir aqui. Mas nem tudo é mau.
Olhe, foi aqui que escolhi o meu marido…
Eis senão
quando Alice vê um jovem adulto do qual não conseguiu despregar os olhos. Do
lugar onde ela estava, ele não a conseguia vê-la. Achou-o maravilhoso ao lusco-fusco.
Ficou encantada, mas recordou-se do fiasco do seu relacionamento anterior. Ficara
hipnotizada, na altura, ao vê-lo surgir, numa noite de estúrdia estudantil,
todo nu das águas do mar, como um belo ser mitológico e afinal, acabara muito
mal porque era tudo menos isso.
Resolveu conhecer este Adónis, antes de se
render. Dirigiu-se -lhe, quando ele já estava composto, pediu-lhe imensa
desculpa e formulou-lhe um pedido:
- Estou
cheia de medo, posso pedir-lhe para depois me acompanhar até à casa onde estou
alojada?
Ele olhou-a
surpreso. Deu-lhe o braço e pediu-lhe que tivesse cuidado ao descer porque
podia escorregar e aleijar-se.
Inconscientemente,
Alice decidira ficar naquele fim de mundo. Era enfermeira e haveria onde
trabalhar.
Em conversa
com o seu cavaleiro andante, soube que ele era o presidente da Junta local.
Referiu-lhe o seu propósito de ficar lá a viver.
- Aqui? Não
lhe aconselho, embora fosse muito bom para nós todos!
Se decidir,
farei o possível por lhe arranjar alojamento condigno! E uma sala na Junta para
trabalhar! Mas pense bem, nem casas de banho públicas temos e a maioria das
casas privadas também não! Estou a construir uma casa de alívio que só estará
pronta daqui a um mês.
Alice não
resistiu. Era impulsiva demais e confiou num segundo sentido que esperava estar
certo desta vez:
-Gosto de
si, acho-o verdadeiro e gostei ainda mais do que vi lá no castelo…
Mateus,
assim se chamava o Presidente, enrubesceu, gaguejou e foi incapaz de dizer uma
só palavra que fosse…
À despedida Alice
beijou-o na face e disse-lhe.
-Amanhã vou
ter consigo para combinarmos melhor a minha permanência…
Dez anos
depois, já com três filhos, sempre que Alice se cruzava com a mãe de Joana,
piscava-lhe o olho e cumprimentavam-se:
- Abençoado
Castelo…
- Abençoado
seja!
Jorge C. Chora
23/02/2022