segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

AS PIRANHAS

 

De longe surgiu

um estranho ser,

vindo das terras de Cabral,

veio ao beija-mão

ao pequeno Czar,

sem Cabral saber.

Trazia para oferecer

uma barrica de piranhas.

Julgava o povo,

ser destinada ao banho

do pequeno Czar!

Afinal era para banhar

os opositores, fossem russos

ou ucranianos!

Pena foi não ter o estranho ser,

ter sido convidado a experimentar

tão delicioso e delicado banho.

 

      JORGE C. CHORA

         28/02/2022

domingo, 27 de fevereiro de 2022

DOMARO VENTO


O vento é caprichoso

vem quando quer,

e quando preciso,

nem me liga sequer.

Mas quando vem,

sempre me convém.

Subo ao terraço

estendo a esteira,

tiro a roupa

e o desenvergonhado,

faz-me festas onde quero!

E aí, meu Deus, o vento,

esse arrogante, o pode tudo,

é domado e aproveitado,

mesmo sem ele querer,

como meu massagista particular.

    Jorge C. Chora

     27/02/2022

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

O PEQUENO CZAR

 

Dorme o pequeno Czar

numa cama carunchosa

e de pés de barro,

rodeado de fantoches

por si controlados,

governando povos,

forçados a ser vassalos.

Tem-nos acorrentados,

esperando revoltas

a todo o momento,

decretando passaportes

para a morte, aos soldadinhos

e aos opositores ainda sem idade

para saberem amar,

privados das delícias do amor,

impedidos de ascender ao céu terreal.

Triste realidade, numa Europa,

de regresso à barbárie, aos joguinhos

do agora mando eu, depois

nem penses em mandares tu,

onde a História nunca é passado

e está sempre e cada vez mais presente,

e as elites não aprendem nada,

e os povos continuam a sofrer tudo.

         Jorge C. Chora

       25/02/2022

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

A IMPORTÂNCIA DO CASTELO


Alice achou estranho a importância dada ao castelo naquela localidade. Volta meia-volta, as pessoas diziam que tinham de ir ao castelo.

O mais curioso é que Alice, por muitos esforços que fizesse, não conseguia vislumbrar castelo nenhum.

Caía a tarde quando a pequena Joana pediu à mãe para ir com ela ao castelo.

-Outra vez? Já foste de manhã e depois do almoço!

Alice tomou atenção ao pedido. Desta vez desvendaria o mistério do castelo invisível.

Seguiu a mãe e a Joana pelos caminhos pedregosos da aldeia. Sempre a subir, por uma calçada constituída por pedras irregulares, quer na forma quer no tamanho e na altura, tropeçou a cada passo. O pior foi depois, quando deixou de haver calçada e seguiram morro acima, derrapando a todo o momento.

Joana e a mãe, ao verem a estranha atrás de si perguntaram-lhe:

- Também vai ao castelo?

-Sim quero ir, não se importam que vá convosco?

-De nada, assim fazemo-nos companhia umas às outras, não vá aparecer-nos uma alma penada, que se está a fazer tarde!

E a escalada continuou por um bom bocado mais. Chegados ao topo do morro, encontram três pessoas, dois homens e uma mulher, agachados.

Se quer vá ali atrás da moita e alivie-se. Se não tiver papel, há ali umas folhas…

Estava explicado o mistério das idas ao castelo. Mas castelo por que razão?

A mãe de Joana, após o respetivo alívio explicou-lhe:

- Dizem que aqui houve, em tempos idos um castelo dos mouros… enquanto não fizerem lá em baixo, uma casa de alívio, temos de continuar a vir aqui. Mas nem tudo é mau. Olhe, foi aqui que escolhi o meu marido…

Eis senão quando Alice vê um jovem adulto do qual não conseguiu despregar os olhos. Do lugar onde ela estava, ele não a conseguia vê-la. Achou-o maravilhoso ao lusco-fusco. Ficou encantada, mas recordou-se do fiasco do seu relacionamento anterior. Ficara hipnotizada, na altura, ao vê-lo surgir, numa noite de estúrdia estudantil, todo nu das águas do mar, como um belo ser mitológico e afinal, acabara muito mal porque era tudo menos isso.

 Resolveu conhecer este Adónis, antes de se render. Dirigiu-se -lhe, quando ele já estava composto, pediu-lhe imensa desculpa e formulou-lhe um pedido:

- Estou cheia de medo, posso pedir-lhe para depois me acompanhar até à casa onde estou alojada?

Ele olhou-a surpreso. Deu-lhe o braço e pediu-lhe que tivesse cuidado ao descer porque podia escorregar e aleijar-se.

Inconscientemente, Alice decidira ficar naquele fim de mundo. Era enfermeira e haveria onde trabalhar.

Em conversa com o seu cavaleiro andante, soube que ele era o presidente da Junta local. Referiu-lhe o seu propósito de ficar lá a viver.

- Aqui? Não lhe aconselho, embora fosse muito bom para nós todos!

Se decidir, farei o possível por lhe arranjar alojamento condigno! E uma sala na Junta para trabalhar! Mas pense bem, nem casas de banho públicas temos e a maioria das casas privadas também não! Estou a construir uma casa de alívio que só estará pronta daqui a um mês.

Alice não resistiu. Era impulsiva demais e confiou num segundo sentido que esperava estar certo desta vez:

-Gosto de si, acho-o verdadeiro e gostei ainda mais do que vi lá no castelo…

Mateus, assim se chamava o Presidente, enrubesceu, gaguejou e foi incapaz de dizer uma só palavra que fosse…

À despedida Alice beijou-o na face e disse-lhe.

-Amanhã vou ter consigo para combinarmos melhor a minha permanência…

Dez anos depois, já com três filhos, sempre que Alice se cruzava com a mãe de Joana, piscava-lhe o olho e cumprimentavam-se:

- Abençoado Castelo…

- Abençoado seja!

   

     Jorge C. Chora

       23/02/2022

terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

O JARDIM DA MARIA

 

O JARDIM DA MARIA

 

Deu a florista Maria,

três rosas

à minha Maria,

por ambas se chamarem

Maria Adelaide,

gostarem de flores,

e a minha Maria

não ser florista como ela,

razão pela qual ofereceu três flores,

duas pelos nomes que têm em comum,

e a terceira pelo gosto que tive

em escolher uma Maria Adelaide.

 

              Jorge C. Chora

               22/02/22

sábado, 19 de fevereiro de 2022

OS OSÓRIOS

Manuela e Guida encomendaram um babá e um chá. A pastelaria estava repleta e elas ocupavam uma pequena mesa de canto com duas cadeiras vagas.

Elas eram amigas de longa data. Frequentaram desde pequenas o mesmo colégio interno, onde partilhavam o mesmo quarto e se habituaram a partilhar a mesma cama, às escondidas, pois ninguém as incomodava porque só lá entravam, após baterem à porta e receberem autorização prévia para entrarem. Formaram-se ambas com distinção, moravam no mesmo bairro e encontravam-se quase todos os dias.

Nesse dia decidiram tomar chá juntas. Serviram-lhes o chá e o babá e enquanto cortavam o bolo para o dividirem entre si, dois irmãos que viriam a saber serem gémeos, pediram-lhes para se sentarem à sua mesa.

-Façam o favor de se sentarem – autorizaram.

- Muito obrigado… a pastelaria está repleta… pedimos-vos desculpa.

-Não faz mal, estejam à vontade – e ato continuo, cortaram o bolo e cada uma deu à outra, o pedaço do babá que tinha cortado.

Os gémeos apresentaram-se como Luís e João.

Nos dias seguintes, com o estabelecimento cheio, os gémeos foram convidados pela Manuela e pela Guida a sentaram-se à sua mesa. Em breve Manuela demonstrou interesse pelo Luís e a Guida pelo João. Sem revelarem qualquer estranheza, João e Luís retribuíram-lhes a afeição demonstrada.

Algum tempo depois passaram a viver todos na mesma casa, já que essa foi a condição colocada pela Manuela e pela Guida. João e Luís já moravam juntos na casa grande da quinta onde viviam, e não foi difícil aceder ao pedido.

Todas as tarefas eram divididas e à medida que iam nascendo os filhos, três da Margarida e dois da Manuela, elas tomavam conta indiferentemente dos seus e dos sobrinhos. Só uma coisa elas não partilhavam: os gémeos. Como eles eram idênticos, elas não estiveram com meias medidas: mandaram tatuar-lhes os nomes delas nos braços esquerdos dos seus respetivos gémeos. Uma coisa era os miúdos saberem que as mães deles eram como uma só mãe, e outra, completamente diferente, era não saberem se eram primos ou se eram irmãos!

Confusão por confusão, já bastava a balbúrdia reinante numa casa habitada por nove pessoas.

Nessa tarde deslocaram- se todos ao restaurante da vila. Margarida e Manuela entraram de mãos dadas, com os filhos formando uma fila lateral e os maridos na retaguarda.

Os olhares dos presentes chispavam de curiosidade e uma certa recusa, pois era voz corrente a situação da família Osório.

João e Luís notaram o clima de adversidade reinante, dirigiram-se ao Fernando, um habitante local e perguntaram-lhe, bem alto:

-O que é que se passa convosco? Foram alunos destas duas irmãs, que são nossas mulheres e foram corridos a negativas? Se foi assim não devem queixar-se! Elas foram profissionais bondosas, mas exigentes! Olhem que elas não são muito boas de assoar!

Um silêncio sepulcral instalou-se, de imediato. Irmãs? Então o aldrabão do Humberto, inventou tintim por tintim, a história da família Osório? Pensaram furiosos, todos os presentes que sabiam da história.

O restaurante despovoou-se. Pela vila ecoaram, durante toda a noite, gritos pouco amistosos:

-Por onde andas tu, Humberto de uma figa!

 

 

    Jorge C. Chora

     19/02/2022

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

AMORES E DESAMORES

Andam cidadãs

e cidadãos também,

arrolhando

palavras de amor,

de olhos cerrados

ou semicerrados,

nas ruas, nas praças

e nos recantos deste país.

Ainda se preza o namoro

e as pessoas rendem-se ao amor,

com promessas nem sempre cumpridas,

transportadas pelos bandos de pombos,

por estas terras, onde ainda se morre d’amores,

e também se mata em seu nome, 

como se quem ama, pudesse,

 algum dia, matar o seu verdadeiro amor!

 

           Jorge C. Chora

           16/02/2022

domingo, 13 de fevereiro de 2022

O NAMORO

 O namoro acontece quando dois seres se abraçam e sentem as palpitações cardíacas do outro, como sendo suas.

O namoro renasce todos os dias, quando o primeiro ser, ao acordar, agradece a Deus, poder dizer:

- Bom dia, meu amor!

Jorge C. Chora

13/02/2022

sábado, 12 de fevereiro de 2022

CONTRASSENSO

As pessoas são como os frutos:

primeiro sementes,

depois frutos;

têm de crescer,

evoluir de verdes até ao estado de maduros

e então, estão no ponto, para serem colhidos,

ao contrário das pessoas:

ninguém as quer colher maduras!

Isto é ou não um contrassenso? 


Jorge C. Chora

   12/0272022

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

CARLOS E IVONE OU UM AMOR INTERESSEIRO

Ivone olhou com tristeza para a pastelaria que herdara do seu avô. Com um ar desolado, lembrou-se daquele espaço nos tempos áureos.

Era um lugar quase de frequência obrigatória para as pessoas de bom gosto e para uma certa elite da cidade. Agora era uma sombra do que fora.

Ainda a conservava aberta, mas mais tarde ou mais cedo teria de a fechar.

Estava nestes pensamentos quando entrou um homem que teria aproximadamente a sua idade. Tinha cerca de quarenta anos, cabelo comprido e um rabo-de-cavalo, mas com aspeto limpo e aparentando uma certa distinção. Aproximou-se do balcão e pediu-lhe, em português, com uma pronúncia marcadamente francesa, um café e um bolo.

Ivone simpatizou com o cliente e palavra puxa palavra, ficou a saber que ele se chamava Carlos, tendo-se também ela declinado o seu nome. Carlos era pasteleiro, estava farto de viver em Paris e queria conhecer a terra dos seus pais que eram portugueses. Ivone, no decurso da conversa, queixou-se da situação da pastelaria e estrategicamente, foi colocando a mão de Carlos na sua. Carlos não a retirou e colocou a sua outra mão por cima da dela.

Nos dois dias seguintes Carlos visitou o café e Ivone recebeu-o com agrado visível. Ao terceiro dia, Ivone convidou-o para trabalhar na secção de pastelaria a confecionar os bolos do estabelecimento.

Carlos olhou-a e muito sério disse-lhe:

- Só aceito com certas condições…

-Claro que sim… se me disseres…- nesta altura já se tratavam por tu

 -Quero que trabalhes comigo… não há problema nenhum… -assentiu Ivone

-Não é só isso! Eu sou muito encalorado e como sabes, o calor é infernal na fábrica e por isso só trabalho despido…

Ivone olhou-o com atenção, antes de lhe dar qualquer resposta. Pouco depois, com um à-vontade inesperado respondeu-lhe:

- Não há problema nenhum, desde que eu também trabalhe despida, pois também sofro com o calor.

E naquela pastelaria surgiram novidades que tornaram a cativar os clientes e a fazê-la retornar aos tempos áureos. Para além dos bolos clássicos, ambos criaram uma nova linha: ela criou os arrebitados e os cabeçudos e ele as meias-luas, os peitos celestiais e as rachadinhas que se tornaram os bolos mais apreciados e vendidos.

Acabadas as fornadas, enfarinhavam-se ambos, rebolando-se nas bancadas, saciando a fome que ambos sentiam um do outro, e iam gritando:

- Vivam os negócios e o amor!

 

Jorge C. Chora

10/02/2022

domingo, 6 de fevereiro de 2022

PESCAR SEM ANZOL


Madalena gostava de Rodrigo. Ambos eram viúvos e em comum tinham o facto de terem gostado imenso dos respetivos falecidos.

Rodrigo, em linguagem comum, era um atado. Coibia-se de dar opiniões porque podiam ofender alguém. Era delicado por natureza, tudo estava bem para ele e admitia até as faltas de respeito, não por cobardia, mas porque achava que era impor-se aos que não tinham tido a oportunidade de aprender e assimilar as regras básicas. Em suma, Rodrigo era tido como um banana, por todos os abusadores.

Madalena ia aos arames ao presenciar a forma como tratavam o seu amor escondido. A aproximação ao Rodrigo era difícil, pois não sabia, como fora das horas de serviço era possível estar com ele, vir a abraçá-lo, dar-lhe apoio, apertá-lo, beijá-lo, fazê-lo sentir o amor que lhe tinha.

Um dia acabou por descobrir que aos fins de semana, Rodrigo ia à pesca.

Aproximou-se e disse-lhe:

-Ó Rodrigo eu passo uns fins de semana péssimos. Gosto de pescar, mas não vou, porque não tenho companhia. Soube que pescas e a tua companhia era ideal para mim!

Sem escapatória, Rodrigo convidou-a.

Compareceu Madalena no local combinado. Trouxera uma velha cana de pesca, que era do seu falecido pai, que por sua vez a tinha herdado já do seu avô.

Ao fim de algumas horas, Rodrigo estranhou que o peixe picasse na sua linha e nem sinal de interesse manifestasse pela de Madalena.

-Minha amiga não sei o que se passa, mas o peixe não pica o seu isco!

-Madalena não se fez rogada:

-Meu querido Rodrigo. O peixe que eu ardentemente desejo, não está no mar, está aqui ao meu lado… A minha linha não tem anzol …O isco sou eu e o peixe és tu!

Rodrigo roborizou-se, engasgou-se, encheu-se de coragem e disse-lhe:

-Adorava ser o teu peixe e tu a minha sereia…

E antes que Rodrigo pudesse dizer algo mais, Madalena tomou a iniciativa: agarrou-o, beijou-o, despiu-o e possuíram-se até à exaustão.

A partir desse dia, não houve um único fim de semana que não tivesse sido dedicado à pesca. A única diferença, é que a cana de pesca do Rodrigo deixou também de ter anzol para que ele não mais tivesse qualquer distração com a observação da linha e o picar dos peixes.

E durante a semana, enquanto não se mudaram para a casa de um deles, o que mais necessidade sentia do outro, enviava-lhe uma mensagem: Apetece-me pescar. E a ti?

 

Jorge C. Chora
&/02/2022

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

LAMENTOS


Quem vai às eleições,

sujeita-se a perder,

a muito sofrer,

e mesmo a desaparecer:

Até faz dó ver isso acontecer!

Ver o comboio passar,

e só poder voltar a apanhá-lo

daqui a quatro anos,

é um resultado difícil de suportar,

para quem tinha ambições.

O pior, meu Deus, é a desilusão,

de terem tirado o bilhete de ida,

e agora terem de comprar,

à cautela, um de ida e volta,

só válido daqui a quatro anos,

não vá o diabo continuar a tecê-las!

e serem os mesmos, a ganhar e a perder.

Em democracia é sempre possível reverter os resultados.

 

    Jorge C. Chora

       3/02/2022