Entrou na
dependência bancária com uma dificuldade evidente: estava apoiada em duas
canadianas. De provecta idade, aguardou a sua vez de ser atendida.
Não durou
muito tempo a ser recebida, pese embora a casa estivesse repleta, pois teve
prioridade pela sua incontestável dificuldade na locomoção, agravada pela sua
corpulência.
Após se ter
conseguido sentar, disse ao que vinha: fazer a prova de vida.
Apresentou o
seu documento de identificação e obteve a seguinte resposta:
- Minha senhora,
o documento que prova que está viva é passado pela Junta de Freguesia e depois
terá de o trazer ao banco. Peço imensa desculpa.
-Mas eu
estou aqui, viva, a falar consigo, com a identificação nacional a provar que eu,
sou eu!
-Pois é,
mas…
Nada feito.
A corpulenta e idosa senhora, iniciou os seus esforços para se levantar, mas
tanta força fez que deu um sonoro e fedorento flato. A multidão presente no
interior da dependência, sentindo-se gaseificada, abandonou à pressa o espaço.
A velha
senhora, voltando-se para o balcão, disse alto e em bom som:
- Outra
prova de vida inegável!
Claro que
isto do flato não se passou, mas deveria ter acontecido. Não cabe na cabeça de um tinhoso, ter de ser
só a Junta de Freguesia a passar um documento a comprovar que a senhora que
está ali, presente, em carne e osso, está viva!
Não duvido que haja algum outro motivo para
ser a Junta a atestar o facto de a pessoa estar viva, mas do que não duvido
também, é de que a prova de vida podia ser aceite podendo a própria pessoa estar
presente.
Com o evoluir
da situação, não me surpreenderia que a pessoa tenha de ir ao médico, para de
seguida, com o papel passado, ir à Junta carimbá-lo e só após ser vista pelo
médico da instituição, ser aceite como pessoa viva, depois de outro papel
carimbado com o timbre da instituição, assinado pelo chefe e subchefe da agência,
com a impressão digital da pessoa que tem de apresentar a prova de vida, em
como está viva!
Não há
qualquer dúvida que só a espera pela consulta no Centro de Saúde, para
comprovar que essa pessoa estaria viva, livraria o país de uma multidão de
idosos: pois quando fosse chamada, poderia ser outro o documento a passar: a
certidão de óbito!
Cala-te boca,
não vá a ideia pegar e qualquer dia acontecer-me a mim o que não desejo aos
outros.
Jorge C.
Chora
21/4/2023