Sentado à porta de casa, sacode a farta cabeleira suja e afasta as inúmeras moscas que esvoaçam em seu redor. Sorri a quem passa, mesmo aos que fingem não o ver.
-Estás à espera de quê? – interroga-o o vizinho com maus modos e sobranceria sobeja.
-De que me venham buscar o carro…
-Já perdeste a casa, agora é o carro … a seguir será…
-Aquilo que eles quiserem. Sem emprego e sem dinheiro estou sujeito…
-Pois é…quem te mandou a ti sonhar…ter casa, ter carro …onde é que já se viu? eu era o teu chefe e sempre vivi em casa alugada. Fartei-me de poupar. Até o carro era o do meu sogro… - e inchava o peito, sentenciando, de modo retorcido - vaidades que agora pagas caro!
E o da farta cabeleira suja, olhava António, que fora seu colega, bufo a tempo inteiro, chefe que lhe ia reduzindo o salário e que o despedira a mando dos verdadeiros chefes.
Ainda António não tivera tempo de se afastar dois passos, quando o carteiro o viu:
-Sr. António, tem aqui uma carta registada para si.
Abriu-a, leu-a e empalideceu.
As moscas largaram o homem da farta cabeleira e passaram a circundar o novo desempregado. O primeiro, chegou-se para o lado e criou um novo espaço.
Quem passar pelo local, vê agora dois homens que sacodem, à vez, as fartas cabeleiras sujas e que respondem, quando lhes perguntam o que estão ali a fazer:
-A ganhar calo de tanto ouvir que fomos os responsáveis pela crise!
E os que ainda não receberam a carta, seguem ufanos o seu caminho, respirando fundo e comentando com desdém:
-Pois é…viveram com o rei na barriga e agora…
Jorge C. Chora
quinta-feira, 1 de dezembro de 2011
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