terça-feira, 30 de maio de 2017

A FRUTEIRA



Transportava a fruteira de cristal, encostada ao peito e segura com ambas as mãos. Estava na sua família há muitos anos. Era como que uma jóia, cuidada e transmitida de antepassado em antepassado. Podia dizer-se que o objecto era o único de valor em sua casa.

João, de dez anos, transportava-a a pedido de sua mãe, a caminho da casa de penhores. Já com a mãe à vista, esta acenou-lhe e sorriu-lhe, com o coração nas mãos, pois se havia pessoas desastradas e azaradas, João era seguramente um deles. O estabelecimento fechava daí a dez minutos. Acelerou o passo e a progenitora receou que João tropeçasse, que viesse alguém e lha roubasse ou algo do género. E foi com os olhos abertos que viu concretizar-se o seu receio.

Viu a fruteira estilhaçar-se no passeio e não percebeu o sucedido. Ouviu-se uma travagem e viu o João com uma criança de dois anos ao colo. Acabara de salvá-la de ser atropelada. O pequeno saíra a correr de uma loja, vizinha da de penhores.

-Desculpa-me mãe…

-Não tens de desculpar-te, salvaste aquele pequenino … - e, comovida, abraçou o João.

Sem o dinheiro da renda na mão, ouviram o comentário do funcionário da agência:

-Que historieta é que me vão contar?

Jorge C. Chora


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