terça-feira, 11 de setembro de 2012

O gato das botas cardadas

Era um vez um menino pobre chamado Portugal. Calhou-lhe por herança um gato, enquanto os seus irmãos foram agraciados com fábricas e diversas riquezas. Portugal, entristecido, queixou-se amargamente da sua sorte. Os irmãos e os seus amigos logo criticaram a atitude de descrença, comentando que a sorte, cada um é que a fazia e a tinha na sua mão.

-Acredito no que me dizem, mas não me importava de trocar de posição convosco… - murmurou a medo o pequeno Portugal.

Os conselheiros dos irmãos, em amena cavaqueira, fizeram-no recordar-se da história do gato das botas que enriquecera o filho do moleiro e lhe trouxera uma enorme felicidade.

Animado com a lembrança, Portugal criou um a nova alma quando o gato lhe fez três pedidos, tal como o da história infantil: umas botas, mas estas tinham de ser cardadas; um barrete em vez de um chapéu; um saco de pano reforçado.

Qual não foi o espanto de Portugal, quando o gato lhe surgiu com uma mão cheia de coelhos, caçados nas suas próprias terras e lhe pediu, em troca, um saco cheio de dinheiro.

-Mas eu não te pedi coelhos e muito menos que os caçasses nas minhas propriedades…

-Eu melhor do que tu, sei das tuas necessidades. Vai lá buscar o que me deves, enche-me o saco e coloca-o neste carrinho de mão…-replica o gato.

A custo e a contragosto o pedido foi satisfeito. Passado um tempo o gato propõe que o seu amo vá banhar-se ao mar. Quando este está repimpado e feliz a chapinhar e a mergulhar, o felino surge-lhe com um magote de estrangeiros que o convencem de que está a afogar-se e necessita, com a maior urgência, de uma frota de submarinos para o salvar.

Desesperado com as dívidas que estava a acumular, o dono queixa-se ao gato da aflição em que se encontrava.

-Não te aflijas. Recorda-te que tens muitos amigos desejosos de te emprestarem dinheiro e de te socorrerem em tempo recorde. Eu próprio vou tratar disso. Vai enchendo esses sacos que aí estão, para garantir os primeiros pagamentos e deita-os aí no carro que eu levo-o ao sítio certo.

Executado o carregamento, o gato tira o barrete da sua cabeça e dá-o ao dono, dizendo:

-Ofereço-te. Bem o mereces. Ele não me fica bem e não o posso usar enquanto intermediário entre ti e os teus credores!

E desde aí Portugal enfia e usa o barrete, que ameaça tornar-se um elemento indispensável da sua farda.

Ainda hoje, o malandro do gato, com um ronronar doce, exigiu mais sacos, tantos quantos a voracidade o permite.

Jorge C. Chora

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