quarta-feira, 6 de março de 2013

Nos tempos que correm!


Olhava em redor, como que avaliando a possibilidade de encontrar, escondida, bem escondida, a falcatrua que procurava. Os olhos pareciam saltar-lhe das órbitas, tal a velocidade a que se deslocava , da direita para a esquerda, de alto para baixo e para todos os cantos do quarto.

Na mão trazia um metro articulado, de madeira, que ia abrindo e fechando, brandindo no ar, apontando em todas as direcções como se de um ponteiro se tratasse. Todas as residentes naquele quarto, assim como  as dos outros,  sabiam do que se tratava. Ninguém ignorava o que se ia passar dentro de pouco tempo. Pelo arfar audível, cada vez mais intenso, sabiam as presentes de que estava para breve, muito breve mesmo, o desencadear da acção.

O momento aconteceu. A senhora lançou-se para o chão, de modo atlético, fazendo uma flexão, sustendo o seu peso num só braço, levantando com o outro a colcha da primeira cama, do lado direito do quarto.

-Ah! Cá está a malandra! - exclamou vitoriosa – Puxando a extensão eléctrica do aparelho de aquecimento, guardada em baixo da cama.

Capturada a extensão, puxava-a para si, esticava o fio e media-o com todo o cuidado. Do bolso da enorme saia, até aos pés,  que trajava, retirava um lápis, melhor dizendo, um coto de lápis, e anotava religiosamente os metros que media a extensão.

-Vocês sabem perfeitamente que quanto maior é a extensão, maior é o consumo de electricidade!

Calavam-se as presentes. Estavam cansadas de lhe dizerem que não era assim.

-Eu é que sei!- respondia, zangada.

De cama em cama, de quarto em quarto, o tamanho dos fios das extensões era anotado, de modo fervoroso e sem qualquer engano.

No final do mês, quando as residentes iam  fazer as contas, lá estava a senhora, acompanhada do seu caderninho de notas:

-Tens a extensão mais pequena. Faço-te um desconto de dez tostões na tua conta.

-Tu e tu …tendes as maiores extensões. Não posso fazer-vos nenhum desconto. Dou-vos estes santinhos de STª Bárbara, para ver se ela vos alumia…

Não vou prosseguir esta história, não vá dar-se o caso de chegar aos ouvidos de algum membro do governo ou da direcção da EDP e…truca, nascer mais um imposto: o do comprimento das extensões.

Nos tempos que hoje correm!

Jorge C. Chora

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