sábado, 29 de junho de 2024

A RESPOSTA INESPERADA

 


Não era boa rês

e ela sacudiu-o de vez,

antes de sofrer qualquer revés.

Ele pediu-lhe uma foto como recordação

 ou algo que servisse de consolação.

 Contrariamente a qualquer previsão,

 ela tomou a seguinte resolução:

ofereceu-lhe à laia de consolação,

uma pequena caixa com um presente.

Anexo à oferta seguia a seguinte nota:

Aqui vai um pedaço de mim e o que recordo de ti.

Era uma proveta com as suas fezes,

sobrantes de uma análise que tivera de fazer!

                     Jorge C. Chora

                         29/6/2024

 

quarta-feira, 26 de junho de 2024

A ETERNA VIÚVA

 

 Deram-na como perdida

 e desenganada da vida,

com a morte anunciada.

Rei morte rei posto

e o marido disposto,

a escolher alguém a gosto:

Tem de ser de estatura meã,

de seios com aroma a maçã,

temente a Deus e boa cristã,

com um hálito a hortelã,

de saúde e alma sã

e na cama uma campeã.

Morreu o futuro viúvo,

sem dizer aí nem ui,

deixando bem viva,

a viúva de quem ia enviuvar.

Casou-se a anunciada moribunda,

com um homem com aroma a malva rosa,

um campeão na cama e com algo a saber a maçã,

que morreu esgotado nos braços

e na cama da eterna viúva.

 

           Jorge C. Chora

               26/6/2024

domingo, 23 de junho de 2024

SARDINHAS ABENÇOADAS

 


Levantou-se de madrugada

 para ir às sardinhas à lota.

 Esqueceu-se, de tão apressada,

de vestir as cuecas, escorregou

e duas sardinhas alojou no pipi.

Na subida para o mercado

um cidadão viu-as cair da saia.

- Ó, minha senhora, estão a nascer-lhe

sardinhas debaixo das saias!

- Aproveite-as vossemecê que

estão frescas e cheirosas,

melhor sabor não há, pois estão

agorinha a sair do forno!

 

           Jorge C. Chora

              23/6/2024

sábado, 22 de junho de 2024

FAMA DOS GORDOS(AS E OBESOS(AS)

 


Fossem bolas de Berlim,

ou quaisquer outros assim,

estava sempre afim:

comia-os todos até ao fim,

do mais doce ao mais ruim.

E se mais houvesse,

eram quantos lhe apetecesse,

até que a reserva se esgotasse.

Tudo quanto via,

do bacalhau, à feijoada ou ao cozido, comia.

Na consulta de nutrição,

à obesa perguntavam:

- Tem feito dieta, minha senhora?

- Ela sim, eu não,

- dizia,o trinca espinhas, o marido;

ela engorda só de me ver comer

e eu não sei o que fazer!

        Jorge C. Chora

           22/6/2024

domingo, 16 de junho de 2024

GOSTO

 

Gosto do silêncio,

entrecortado

pelo grasnar das gaivotas.

Gosto do espraiar das ondas

no areal da praia,

recebendo as carícias

da espuma do mar,

num silêncio voluptuoso

de uma penetração consentida

suave e simultaneamente,

 impetuosa e desejada.

Gosto do vento que me eriça os pelos,

roça os pinheiros e as casuarinas,

me areja a mente e infunde respeito,

ungindo-me com salpicos salgados.

Gosto dos mistérios do mar,

dos monstros que alberga

e dos irmãos golfinhos,

saltitando alegres e alheios à tristeza,

afastando-os com os seus assobios

e acenando ao pôr- do- sol.

Gosto do mar e dos seus caprichos.

       Jorge C. Chora

         16/6/2024

sexta-feira, 14 de junho de 2024

A NECESSIDADE DE ATUALIZAR O GOOGLE

 


Não é costume o google estar desatualizado, mas desta vez, talvez por distração, esqueceu-se de criar dois sinónimos para dois verbos que deveriam ser atuais e adequados aos perigosos dias que hoje correm.

Os verbos são: assassinar e massacrar, em que os sinónimos se limitam a chacinar, matar, trucidar, executar, destruir e por aqui ficam.

Para uma atualização, é necessário acrescentar dois novos verbos que arrepiam só de os ouvir: putinar e natahaniar.

Todos estão conscientes do que significam e por isso, está na altura do google não se deixar ultrapassar e completar a lista de sinónimos e fazer jus à forma como é nomeado:  Sr. Dr. Google.

Jorge C. Chora

14/6/2024

quarta-feira, 12 de junho de 2024

O MÊS DOS TRÊS SANTOS

 


   Neste mês dão as mãos

   e abençoados são,

   os amores dos novos casais,

   por Stº António e frei João,

   e recebem da família a saudação

   e os aplausos da multidão.

   Pela Avenida desfilam as marchas,

   os orgulhosos marchantes

   e os famosos padrinhos e madrinhas.

  À noite, saltitam nos assadores,

  bifanas e sardinhas ao som

  de músicas populares, beijinhos

  e bailaricos de pares e amigos

  abraçados, quiçá, candidatos

 a futuros casais de Stº António.

 À espreita já estão os martelinhos

 e os balões de S. João,

e S. Pedro para dar por findos os folguedos!

        Jorge C. Chora

          13/ 6/ 2024

segunda-feira, 10 de junho de 2024

SER E PARECER


Pode ser-se e não parecer

ou parecer-se e não ser.

Em tempos que já lá vão,

vigorava a aliança entre o ser e parecer:

“À mulher de César não basta ser

 honesta, tem de parecer honesta”

dizia César, segundo Plutarco *.

Pompeia era honesta, mas não parecia,

embora sem qualquer culpa,

 e César divorciou-se.

Atualmente há muitos que são

e não parecem, e outros que parecem

e não são, embora se preocupem

em fazer crer ser aquilo que parecem,

ocultando o que verdadeiramente são!

·        Plutarco – Vidas Paralelas (Alexandre e César)

       

                                             //

O grande poeta António Aleixo, mostra de modo acutilante e magistralmente, a diferença entre o ser e o parecer, de uma forma cristalina, na seguinte e conhecida quadra:

“Sei que pareço um ladrão…

Mas há muitos que eu conheço

Que, sem parecer o que são,

São aquilo que eu pareço. “

 

In: “Este Livro que vos deixo”

             28ª edição

 

          Jorge C. Chora

            10/6/2024

 

domingo, 9 de junho de 2024

O PORCO

 

Grunhe de satisfação,

mal a gamela cheia está,

e com a porca se deita,

e adora os momentos de repetição.

Guincha de horror quando o capam

e ainda mais quando o matam.

“Se queres conhecer o teu corpo,

mata o teu porco” é costume dizer,

e os hábitos, como é bom de ver,

para quem com ele tanto se assemelha.

          Jorge C. Chora

               9/6/2024

sexta-feira, 7 de junho de 2024

BEM TE AVISEI

 

Após a asneira cometida,

 a advertência costumeira:

- Bem te avisei…

Não se importam de ouvi-la,

se também beneficiaram:

ficou-lhes o sabor dos beijos,

a maciez das nádegas,

o momento encantado,

o aroma dos seios,

o calor do corpo colado,

e a traição já esperada,

e a advertência repetida:

- Bem te avisei…

-Foi bom enquanto durou -

aceitam os pecadores inveterados,

preparados de antemão,

para o futuro sermão,

depois d’outras traições

e vilanias contra eles cometidas.

      Jorge C. Chora

            7/6/2024

quarta-feira, 5 de junho de 2024

O ESPELHO NUNCA MENTE, MAS AJUDA A MENTIR


 

O espelho não tem qualquer poder,

nem de querer nem de ver,

mas mente sem querer,

e nunca mente mesmo mentindo:

só reflete o exterior como é sabido,

e o interior, é de todos escondido,

menos dos criminosos que se apresentam rindo.

Compõem a imagem de moços queridos.

Irmãos da bruxa má, e da resposta ouvida

à pergunta de quem é a mais bela do que ela:

Espelho meu, espelho meu…

Ah! Manos Grimm, quão atuais e mestres sois,

dos grandes criminosos que todos sabemos que são

e só os próprios querem convencer-nos que não!

                      Jorge C. Chora

                         5/6/2024

segunda-feira, 3 de junho de 2024

A CULPA SALTITONA


A culpa saltita,

hoje é de um,

amanhã é d’outro,

depois de alguém

e a seguir, de ninguém!

Mas com sorte

ou sem ela,

acaba por ser só dele(s).

Chucham no dedo,

porque alguém

já o mel lambeu,

e os culpados são,

de quem com nada ficou:

não tivessem acreditado,

percebessem a marosca,

contratado bons advogados,

conseguido bons atestados!

Quem os mandou serem parvos?

A culpa saltita, hoje é de um,

amanhã é de outro,

e depois de quem a apanhar,

menos de quem a(s) beiça(s)

não se fartou de lambuzar!

        Jorge C. Chora

          3/6/2024

domingo, 2 de junho de 2024

É ASSIM É!

 

                  

Estar apaixonado(a) e ser gozado(a),

por quem não está enamorado(a),

é invejar e estar tramado(a),

por ninguém o querer como namorado(a).

         Jorge C. Chora 

            2 /6/2024

 

sábado, 1 de junho de 2024

A PIANISTA E O ENGENHEIRO

 

No café que Paulo frequentava, reparou em quatro senhoras que conversavam utilizando a linguagem gestual. Três delas despediram-se e a que permaneceu na mesa chamou o empregado com um sinal.

Ela pediu ao empregado, por gestos, um papel para anotar o pedido onde registou o que queria comer e beber.

Paulo sabia que o empregado era estrangeiro e novo na casa e que conhecia poucas palavras, oralmente, mas ainda não dominava a escrita.

Aproximou-se da senhora e em linguagem gestual perguntou-lhe o que queria.

Ela disse-lhe e informou-o ao mesmo tempo de que ouvia bem, mas era muda. Paulo encomendou oralmente o pedido feito.

A jovem senhora, simpatizou com o Paulo e convidou-o a sentar-se.

Curiosa, quis saber como ele dominava tão bem a linguagem gestual se não era mudo, tendo-lhe perguntado de seguida se era professor desta técnica.

Paulo explicou-lhe, oralmente, que tinha uma filha que era muda   e tinha-a acompanhado nas aulas que ela tivera. Informou-a também que ensinara a sua mulher, pois ela não tinha tido horário compatível para assistir, garantindo assim a comunicação da filha com ambos os pais.

- A sua mulher também domina a linguagem… e não terminou a frase.

Viu o rosto de Paulo entristecer-se de repente. Terminou os gestos e pediu desculpa, por ter entrado numa esfera tão íntima.

Recuperado, Paulo disse-lhe que nada tinha a desculpar e informou-a de que ela morrera esmagada por uma máquina da construção, quando fiscalizava uma obra. Ela era engenheira e tinha-o ido substituir, porque a hora coincidia com as aulas da filha. Chamava-se Helena e a filha Isabel.

Ela esboçou um sorriso, com receio de o magoar e contou-lhe que se chamava Helena e a sua mãe Isabel e, por acaso, muda como ela.

Paulo sorriu e num impulso pegou-lhe na mão e beijou-a.

Isabel, passada a surpresa, afagou-lhe a cabeça, agradecendo o gesto de amizade e respeito espontâneo.

Viram-se mais duas ou três vezes no café e conversaram animadamente, despedindo-se com dois beijos na face.

Um mês depois, Paulo foi assistir a um concerto de piano e qual não foi o seu espanto ao verificar que era Helena, a pianista.

Adorou o espetáculo. No fim, Helena agradeceu em linguagem gestual os aplausos e a presença de todos, aproveitando para anunciar para daí a quinze dias, outro concerto com o mesmo fim deste: angariar verbas para a Associação dos Mudos.

Esperou a oportunidade para ir ter com Helena e quando ela já se encontrava só, para a felicitar pessoalmente e para lhe pedir autorização para lhe beijar as prodigiosas mãos capazes de tal magia.

Helena sorriu e um pouco acanhada perguntou-lhe se o podia beijar.

Aflito, Paulo receou que ela se sentisse obrigada a agradecer-lhe os elogios bem merecidos que lhe dera.

Helena percebeu a hesitação. Puxou-o para si, escondendo-se por trás dos reposteiros do palco e beijou-o de forma pouco hábil, colocando-lhe simultaneamente a mão no interior das calças, dizendo-lhe com uma voz trémula de desejo:

-Quero-te.

Paulo levantou-lhe suavemente a blusa, beijou-lhe o umbigo,

levantou-a ao colo dizendo-lhe:

- Também te quero!

Nesse mesmo dia passaram a viver juntos, oferecendo-lhe Helena a sua pureza e o seu amor, colhendo de Paulo a sua doçura e a sua entrega total.

Um ano depois nasceu a primeira das quatro meninas e qual delas a mais tagarela.

Jorge C. Chora

1/6/2024