sábado, 8 de maio de 2010

O remédio do Mindo

Mindo é homem de muitas viagens. Viajou e trabalhou a bordo dos navios nórdicos. Serviu no bar, aturou este mundo e o outro, viu e calou muita coisa. Entre Cabo Verde, os países do Norte da Europa e o resto do mundo foi ganhando calo e uma filosofia própria e adequada a cada um e às circunstâncias.

Em terra ao fim de uns anos, montou um bar. Sabe com rigor o que os clientes querem.
Atrás do balcão vê um patrício seu .Como é evidente, sabe o que ele deseja, e dá-lhe conversa:

-Está um vento que até nos põe a cabeça zonza …

-É verdade… tem aí o remédio?

-Claro - responde Mindo enquanto agarra no garrafão de grogue, que lhe escorrega da mão, mas logo consegue agarrá-lo com firmeza.

Enquanto isto se passou, a clientela repreendeu-o:

-Bô (você) tem de ter cuidado…

-Dá cá mais um antes que partas…e não fique nenhum…

Mindo volta ao ataque:

-Então e você compadre está melhor dos dentes?

-Nem por isso Mindo. Um grogue daquele para melhorar.

Dá um relance pela pequena sala. Está tudo nos conformes. Zé do gorgomilo alto,bochecha e dirige-se à porta , faz menção de deitar fora o grogue com que diz estar a desinfectar a garganta: o chão está mais seco do que o da ilha do Mindo.

No canto esquerdo da sala, está sentado oTreme-Treme,que está sempre com frio e ordena:

-Mindo, o meu copo está vazio…

-Estou a caminho…

Ao som da “sodade” de Cesária Évora, a clientela vai-se meneando e escorropichando
grogues. Exige que Mindo beba também um.

-Como não estou doente bebo à saúde e às melhoras de todos - e tira de baixo do balcão um copo,supostamente de grogue, previamente cheio de água, que bebe de um gole, e estala a língua com satisfação,enquanto diz - ah! grande remédio!

Jorge C. Chora

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