quinta-feira, 13 de maio de 2010

Que azar!

A festa foi pantagruélica. Os convites foram entregues, com a devida antecedência, às figuras gradas do povoado.

A vaca era desmesurada, tenra, suculenta. O espeto em que foi assada teve de ser feito.

Prepará-la foi o cabo dos trabalhos, tendo de ser chamados especialistas para o efeito.

Durante dias banquetearam-se, até enjoarem o pitéu, e concluírem que não conseguiam comê-la toda.

Reuniram-se e decidiram que mais valia partilhar o que sobrava ou tinham de deitar fora o que ainda havia.

As portas do recinto da festa foram abertas de par em par. As pessoas acotovelavam-se, desconfiadas de que o pouco que ainda havia não dava para todos.

A desconfiança era justificada. Alguns felizardos conseguiram, com recurso a empurrões, caneladas e sopapos, afastar os famélicos concorrentes.

Uns gramas de carne e fortes dores nas glândulas salivares foram o que conseguiram.

Mal a festa acabou, os vendedores da vaca apresentaram uma conta astronómica, justificada pela qualidade da vaca, pela forma como fora alimentada, pelas mordomias que lhe tinham sido prodigalizadas: passeios, massagens à japonesa para que a carne fosse tenra, cerveja misturada nos alimentos…

Reuniram-se de novo e decidiram, devido ao preço a pagar, que por uma questão de equidade, todos os habitantes do povoado deviam participar no esforço de pagamento.
Os que nem sequer tinham cheirado a vaca rebelaram-se:

-Que história é essa?

- Vivemos em comunidade, logo temos de fazer um esforço colectivo! - gritaram exacerbadas as figuras gradas.

-Vocês comem e nós é que temos a indigestão? – escandalizaram-se os deserdados do pitéu.

O pior é que, anos a fio, a cena se repetiu e as despesas a dividir foram cada vez maiores.

Hoje, o povo apresentou na assembleia municipal uma proposta para a alteração do nome do povoado: Tresanda a vaca!

Jorge C. Chora

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