domingo, 3 de fevereiro de 2013

O solho


À volta de uma mesa, os pescadores do clube discutiam quem tinha apanhado o maior peixe no Tejo.

-Fui eu!- gritaram em uníssono os três amadores.

Esmiuçada a questão, cada um deles enunciou as características do peixe que, segundo eles, era maior e mais pesado do que o dos outros:

-O meu tinha uns dez quilos e um metro e meio de comprimento! – garantiu o “Truta”.

-Logo vi…isso não é nada ao pé do que eu pesquei…tinha uns vinte quilos e para aí uns dois metros… - afiançou o “Barbo”.

-Isso é que vocês são uns convencidos! O que eu pesquei, juro a pés juntos, pesava quase a soma dos vossos e, em comprimento, não sei se não teria  também a soma de ambos… - assegurou o “Achigã”.

A neta do “Boga”, que por acaso estava presente e assistiu à discussão, pediu desculpa e disse:

-As vossas proezas são decerto verdadeiras, mas sei de uma pescaria que ficou nos anais da História. Um só peixe era do dobro do tamanho da soma dos maiores peixes que os senhores alguma vez pescaram.

-Não percebemos nada do que estás para aí a dizer. Se não te importas explica lá isso bem explicado. Estás a dizer-nos que os nossos maiores peixes, todos somados, não chegam a ser metade de um?

-Exactamente! – assentiu a neta do “Boga”- Querem apostar?

-Tudo o que queiras! – berraram ofendidos os pescadores.

-Quero pouca coisa…bastam-me os peixes que pescaram hoje.

-Apostado! E se perderes, pagas e  grelhas os peixes que aqui temos, para todos os sócios. – desafiaram os pescadores.

-De acordo. Mais do que isso, se ganhar, também ofereço o peixe a todos os presentes mas são vocês a grelhá-lo.

A neta do “Boga” abre a pasta que trazia, retira muito devagar um livrinho preto e pede aos apostadores:

-Abram-no na página 15, sentem-se e leiam-na calmamente.

Assim fizeram.
Entretanto, dezenas de sócios tinham cercado o grupo e esperavam para saber quem a ganharia a aposta.

- Leiam-na alto, se não se importam, uma vez que temos aqui muitos interessados na disputa. – propôs a jovem.

À medida que liam, iam ficando vermelhos e chegaram a uma altura que ficaram roxos ao lerem que “D. Guedelha, rabi-mor dos judeus, apresentou ao monarca um solho vivo apanhado no Tejo, que surpreendeu tudo e todos pela suas descomunais proporções, pois o peixe …media17 palmos “de largo” e sete “de grosso”, pesando 17,5 arrobas”pelos pesos de Santarém”.

-E tudo aconteceu no dia 5 de Fevereiro de 1321,uma quinta-feira, dia de Santa Águeda, tal como reza o livro “Documentos de D. Dinis na Torre do Tombo”… - concluiu Marta, com um sorriso de vitória.

Ainda não tinham deglutido a perda da aposta e já ouviam o convite das testemunhas presentes:

-Toca a assar os peixinhos, que a fome aperta e são horas do almoço!

Jorge C. Chora


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