sexta-feira, 1 de agosto de 2014

A terra por onde passou o tio de Maria Bonita

Maria Bonita era a menina dos olhos de seu tio. Educado nos melhores colégios do antigo império, homem de brios e honras, era  senhor de muitas viagens e seguidor dos antigos códigos de cavalaria. A sua sobrinha era a filha que nunca tivera. Embora o homem não fosse velho, fora atingido por uma velhice precoce e sofria da doença do “alemão”, como diziam na vila.

Maria não era só bela mas também namoradeira. Sempre que encontrava o tio este apertava-lhe as bochechas e perguntava-lhe:

-Minha linda, como estás ? Tens-te aplicado na escola?

Maria sorria e dava-lhe um beijo repenicado na face e seguia o seu caminho sob o olhar protector do tio. Maria já tinha trinta anos.

Fora perto da praça que ouvira pela primeira vez alusões malévolas acerca do comportamento da sua Maria. O homem que as proferira, ainda hoje não sabe se levou um coice de uma mula ou de um cavalo. Sabe, isso sabe-o bem, que ficou desdentado. Episódios como este repetiram-se várias vezes antes que os linguarudos percebessem que não deviam proferir gabarolices.

Um dia chegou à vila um homem mau e mal-educado, vindo sabe-se lá de onde. Dizem-nos que dos quintos–do-inferno. Postou-se em frente ao tio de Maria e desatou a dizer-lhe mal da sobrinha. Fiado na sua gigantesca estatura, ria-se enquanto debitava as insanidades. Acordou no hospital, com dores violentas nas partes. O médico que o assistiu,  fora aluno do tio de Maria,   perguntou-lhe :

-Se tivermos de lhe retirar os testículos, pode escolher a vagina que quer neste catálogo… - e deixou-lhe um grosso volume para uma escolha mais adequada.

Ainda hoje, quem passar por uma vila com muitos desdentados e malcriados de vozes fininhas, fica a saber que por lá passou o tio de Maria Bonita.


Jorge C. Chora

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