Briolanja seguia, de olhos arregalados, mesmo atrás do
menino um pouco mais velho do que ela. Detestava segui-lo porque o ambiente era
malsão, envenenado e fedorento. A procissão seguia a passo de caracol. Ela
apertava o nariz com toda a força. Cheirava mal que tresandava.
-Curoto…tu matas-me…-gritava , asfixiada e revoltada.
-O quê? – gritava ele, sem conseguir ouvir, abafado pelas
Avé Marias.
E ela repetia, furiosa:
-Curoto, tu matas-me…
-Queres bolachas?-
inquiria o Curoto – mergulhando a mão no bolso, retirando um monte de
bolachas esfareladas.
E Briolanja, com o indicador dizia-lhe que não e
agradecia-lhe:
-Obrigada Curoto, come tu…
Durante anos não escapou à mesma sina desgraçada. À medida
que foi crescendo ia-lhe mandando indirectas, até que um dia lhe disse:
-Amanhã é a procissão. Vê lá se não comes couves e outras
porcarias do género. Quem vai atrás de ti sou eu!
E foi aí que se fez luz no espírito de Curoto.
-Então estes anos todos chamaste-me cu roto?
-Sim, meu menino. Só não morri ainda porque aprendi a
prender a respiração…
-Curoto sorriu-lhe:
-Briolanja, minha
querida amiga, eu também tenho sofrido do mesmo mal estes anos todos ! Só não
disse nada, porque julguei que fosses tu!
-Se não era eu nem tu, quem era afinal?- espantou-se
Briolanja.
Pois aí é que bate o ponto. Descobri agora que era o
sacristão que ia à minha frente! Passo sim, passo não, virava-se para mim e
dizia:
-Ai que alívio…obrigado Senhor por me manteres vivo…
Briolanja e Curoto aproximaram-se um do outro e
cheiraram-se. Descobriram que tinham cheiro a flores: Ela cheirava a rosas e
ele a alecrim.
Nunca mais passaram um sem o outro.
-Onde estás minha Briolanja?
-Aqui, querido Curoto…
E no ar paira sempre um perfume a rosas e a alecrim.
Jorge C. Chora
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