quinta-feira, 19 de maio de 2016

MAFALDA E O CONDOR

  
Mafalda tinha uma farta cabeleira negra, repleta de caracóis, atravessados pelos raios solares, que por entre eles brincavam. Os seus olhos eram castanhos cor de mel, e reflectiam a ternura que lhe ia na alma e uma curiosidade imensa pelo que a cercava.

Na varanda, que havia à volta da torre redonda onde vivia, observava os campos e ouvia o chilrear dos passarinhos que a visitavam. Conhecia os piares e entendia-os, tal o hábito que tinha de conversar com eles. Traziam-lhe estes pequenos amigos notícias dos lugares mais distantes, daqueles sítios que a sua vista não alcançava.

Um desejo de ir mais longe, de viajar, de conhecer o mundo apoderou-se de Mafalda. Um dia foi visitada por um enorme condor e entre eles gerou-se uma grande amizade. Este seu novo amigo, ao saber da vontade da menina em conhecer novas paragens, ofereceu-se para a transportar.

Um belo dia, logo pela manhã, Mafalda instalou-se entre as enormes asas do condor e partiram em direcção ao horizonte. Logo na primeira aldeia, lá do alto, viram um jovem senhor que se encaminhava para o povoado, com uma pequena mala na mão. De repente, deixaram de o ver. Perguntou ao condor se o via e ele, passado algum tempo, descobriu-o no fundo de um buraco.
Passado um bocado, ouviram-se gritos de socorro provenientes da cova onde caíra o senhor. Acorreram duas pessoas que, em vez de o auxiliarem, se puseram a interrogá-lo:

-Anda alguém a apropriar-se do dinheiro e de objectos de valor dos habitantes cá da aldeia…

E quando o homem, lá do fundo da cova, se preparava para lhes responder, os aldeões interromperam-no:

-Está calado ladrão, vais ter o que mereces…  - E, acto contínuo, começaram a arremessar-lhe tudo o que tinham à mão, desde batatas a couves.

A gritaria atraiu os moradores da aldeia e as suas respectivas famílias. Ninguém quis ficar sem intervir. Todos lançaram os produtos agrícolas que tinham mais à mão, tendo os mais jovens transportado os víveres necessários à reposição dos que se esgotavam.

Quando menos esperavam, o homem enclausurado, saiu pelos seus próprios meios do buraco, trepando pela pilha de alimentos. Todo sujo, de gravata à banda, com uma das hastes dos óculos partidos, com uma mala de couro na mão, comandou, com uma voz tonitruante:

-Todos em fila! Primeiro as mulheres, depois os homens, e as crianças em círculo à nossa volta!
O condor, reconheceu o professor da vila, embora ele estivesse todo sujo.

Quando os agressores avançaram para o senhor, só o viram abrir a mala, tirar uma régua e desancar os dois que tinham avançado para o maltratarem. No chão ficaram os livros da escola.

Depressa os moradores se aperceberam de quem era o jovem e que, a mal, só arranjariam umas boas reguadas.
A ave encostou a cabeça aos caracóis da Mafalda e disse-lhe:

-Nunca julgues ninguém de forma apressada!

Mafalda sorriu e retorquiu:

-Até porque posso apanhar umas belas e merecidas réguadas!

-Nem mais ! –  confirmou o condor, batendo as suas longas asas e dando por finda esta 1ª  e emocionante viagem da sua passageira.

Jorge C. Chora





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