Lia o jornal de fio a pavio. Protegia-o como se de um
tesouro se tratasse. De duas em duas horas relia-o, pois havia sempre uma ou
outra notícia que lhe podia ter escapado.
Detestava os colegas que lhe observavam o jornal por cima do
seu ombro e irritava-se solenemente, quando um lhe pedia os classificados, outro
as páginas do desporto e ainda um terceiro, a parte dedicada à cultura.
Um belo dia entrou um novo colega e esse, batia todos os
restantes nos seus pedidos:
-Já leu, não é! Empresta-mo?
O novato retinha o matutino o resto do dia. Como não tinha
coragem de lhe dizer que não, passou tormentos, por ficar uma boa parte do
tempo sem ele. Após muito pensar, lembrou-se de algo, com o objectivo de se
livrar de tão incómodo hábito.
Quando o novato lhe cravava o jornal, ele estendia-lho de
imediato, com um sorriso nos lábios, como se nada lhe custasse emprestá-lo.
Ao fim de um mês, os pedidos de empréstimo cessaram. O dono
do matutino, como se estivesse muito surpreendido, questionou-o:
-Então…fartou-se de ler as notícias?
-Por incrível que pareça, foi isso mesmo que aconteceu!
Pareciam-me sempre as do dia anterior!
Não fosse o diabo tecê-las e o novato tornar ao velho
costume, o jornal já estava preparado para ser emprestado: a capa era a do
jornal do próprio dia e o interior constituído pelo jornal do dia anterior.
Jorge C. Chora
Sem comentários:
Enviar um comentário