Este fim-de-semana, quando visitava a feira de Belém, ouvi
um casal de certa idade a chamar o seu cão:
-Anda cá Boogie … vem cá Boogie
O nome trouxe-me recordações de há muitas décadas. Elas não
se prendiam com o reino canino mas com alguém que conheci, cuja alcunha era
exactamente essa: Boogie.
O Boogie era um homem de estatura meã, dotado de uma grande
barriga, parecendo dançar com ela. Fazia-se anunciar antecipadamente pela sua
proeminente barriga, sobre a qual cruzava os braços, entrelaçava as mãos e
fazia circular os dedos polegares como se manuseasse um rosário de contas
imaginário entre eles...
Boogie, pelas nossas contas, era mais velho do que
Matusalém. Diziam e ele alimentava a lenda, de ter vivido, não me recordo bem
se por esta ordem, trinta anos em França, vinte na China e quarenta na
Conchichina, fora os que não contara no Brasil, em Portugal e o ror de anos que
vivia no ultramar: tudo somado podia ter sido pai do próprio e vetusto
Matusalém.
Boogie era também um verdadeiro criador de montes,
montanhas, colinas e cordilheiras no cocuruto da gaiatada: ofertava caroladas
de modo democrático, à direita, à esquerda e ao centro.
Era também um verdadeiro apreciador dos lóbulos das orelhas
que puxava e torcia a seu bel-prazer, como castigo, acompanhado em geral pela
expressão:
-Ena rapazola! – e esfregava o dedo indicador no polegar, de
modo enojado, queixando-se de que escorriam gordura -Tens de lavar as orelhas…Esquecendo, de
propósito, a temperatura elevadíssima, típica de um clima tropical quente e
húmido. Os “rapazolas” até se esqueciam da dor, com os ditos do Boogie. Só por
mera acaso não levei carolos ou puxões de orelhas.
O Boogie era assim e acredito que haja quem dele tenha
saudades, pois o tempo pode levar ao esquecimento ou tornar simpático e cómico
personagem daquele calibre. Outros tempos. Livra!
Jorge C. Chora
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