domingo, 13 de junho de 2010

Apanhado

Só por acaso é que não expelia fumo pelas ventas. Estava furioso. Fora apanhado no momento exacto em que enfiava os dedos na gaveta dos chocolates. Em vez de os agarrar, fez barulho ao amarfanhar o papel vegetal no processo de busca.

-O que estás para aí a fazer? Estás à procura dos chocolates! - gritaram os familiares, em tom de repreensão - Não sabes que …

Pura e simplesmente saiu porta fora para não ouvir o que se ia seguir. Vagueou pela cidade e deu consigo na Gulbenkian. Havia uma exposição sobre a natureza morta.

Entrou e foi atraído para as pinturas sobre doçaria. Parou em frente aos quadros de Josefa d`Obidos. Deliciou-se com as queijadas, imaginou-se a comer o pão-de-ló,
as hóstias de ovos, o bolo de chocolate, o folar… Desviou o olhar e deu de caras com as compotas de cereja e figos cristalizados num quadro de Juan van der Hamen.

Começou a babar-se …olhou para um quadro de Flegel e viu uns insectos que se deliciavam com o doce…Levantou a mão, como que para os afugentar, invejoso da sorte dos malditos insectos…

-Peço desculpa mas é proibido comer neste espaço e também tocar nos quadros - disse-lhe um jovem guarda.

Não era um dia sim. Resolveu sair e voltar para casa. Ao chegar, tinha a mulher à sua espera.

-Aposto que foste comer doces e fazer disparates. Importas-te de medir a tua glicemia?

Embora de má vontade mediu-a, até porque era uma oportunidade de demonstrar a sua força de vontade e inocência.

-Parece impossível, olha para isto, olha-me para este valor altíssimo… - disse desgostosa a sua mulher.

Ainda pensou em dizer algo em sua defesa mas desistiu ao imaginar a resposta da sua mulher:

-Pois, diz-lhe que sim, agora basta-te olhar para eles…fazem-te tão mal como se os tivesses comido… Julgas que sou totó…

Jorge C. Chora

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