terça-feira, 5 de abril de 2011

À procura de Afonso

São quinze horas e Manuela sai apressada do metro. Precisa de se dirigir, com urgência, à rua da Joaninha. Leva como missão contactar o sr. Afonso, pessoalmente. Não pode ser de outro modo. As instruções são rigorosas: entregar-lhe a documentação que leva, esperar que ele a analise e trazê-la assinada, se possível.

Desconhece a cidade mas sabe que é naquela estação que tem de sair. Calcula que seja fácil chegar à direcção que procura. O nome da rua é diferente do normal, toda a gente a deve conhecer por aquelas bandas. Tem cerca de uma hora para levar a bom termo o seu trabalho.

Aproxima-se da primeira pessoa com quem se cruza. Vai informar-se onde fica a rua que procura:

-A senhora dá-me … e fica com a pergunta a meio, porque ela se afasta como se estivesse na presença de uma leprosa numa fase terminal.

-O senhor dá-me… o senhor dá-me…por favor … - e um a seguir a outro, todos se afastam sem sequer a olharem, nem dizerem nada.

Começa a desesperar-se. Tinha passado a hora e não conseguira pura e simplesmente, uma reles informação. Entra num estabelecimento e não consegue melhor resultado:

-Tem de esperar pela sua vez… - e ela olha para a longa fila e sai.

De novo na rua, tropeça num homem apressado, que fedia a aguardente ordinária. Cai desamparada e os seus papéis espalham-se pelo chão.

-O senhor dá-me…

-Dou-te uma … - e dispara um chorrilho de asneiras e propostas infames, seguindo o seu caminho.

Levanta-se a custo, com os joelhos esfolados. Coloca as mãos nos rins e ajuda-se a endireitar, quando vê uma placa suja e gasta com o nome que procurava. Dá graças a Deus. Procura o número da porta e encontra-o com facilidade.

Entra pela luxuosa porta e encontra-se numa sala ampla, recheada de secretárias. Ao fundo, rodeado de funcionários, estava o homem que a derrubara, gritando com tudo e com todos e perante o qual todos se curvavam:

- Sim senhor Afonso…

-Será como ordena senhor Afonso…

-Como queira senhor Afonso…´

Manuela ficou estarrecida. O Afonso que procurava era aquele senhor arrogante e todo-poderoso. Tanto trabalho para encontrar o herdeiro de uma pequeníssima herança de uma idosa, tia-avó de Afonso, que ele nunca visitara em vida.

Retira-se. Já na rua, agarra no envelope destinado a Afonso e regista, a vermelho, em letras garrafais: Paradeiro desconhecido. Falecido?

Quem quiser que o descubra de novo, pensa Manuela com os seus botões.

Jorge C.Chora

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