Saltava no meio da multidão que aplaudia o chefe. Abanava-se, num frenesim, vivendo a apoteose como se ela se destinasse a si próprio. Sentia que um dia podia chegar longe. Argumentos não lhe faltavam. Aprendera a liderar assembleias. Exímio a cortar a palavra a quem incomodava, a desviar assuntos incómodos, a convocar reuniões às ocultas, tornou-se indispensável a quem mandava. A todo esse capital de artimanhas, somava uma boa presença e uma lábia incomensurável. Foi subindo, chegou a um lugar de destaque de uma instituição, infiltrou-se nas autarquias, transformou-se numa pessoa mais ou menos grada mas nunca o deixaram chegar a figura de primeiríssimo plano. Recebeu milhares de euros a que por descaso, ganância, quiçá incompetência, foram sumindo e nunca foram devolvidos a quem lhe pediu reembolsos. Nunca disse que não pagava mas nunca pagou. Desapareceu de circulação.
No meio da festarola dos apaniguados, um credor viu-o aos saltos. Gritou que nem um desalmado mas o barulho impediu-o de ser escutado. Furou pelo meio da multidão. Deu cotoveladas à esquerda e à direita, foi empurrado e empurrou, finalmente chegou ao pé do almejado e não esteve com meias medidas:
- Onde está o meu dinheiro?
-Calma…não o tenho aqui…
-Quando é que me paga o que me deve a mim e aos meus familiares?
-Bom…é que eu não sou o responsável…
Antes que a situação se descontrolasse, o credor contou até dez, respirou fundo, encheu-se de paciência e perguntou:
-Qual é a treta que me vai querer impingir desta vez?
-Acredite ou não, vou dar-lhe a morada do responsável. Está na campa 72…
Nesta fase da”explicação” o credor ponderou seriamente em deixá-lo sem dentes. Apercebendo-se disso o prestidigitador retomou a palavra:
-Sim, morreu e está na campa 72. Ele é o único culpado da situação, se quiser pode…
-Falar com ele? – interrompeu-o, furioso, o credor.
-Sim…tenho uma amiga que é médium …diga-lhe que vai da minha parte…mas não diga a mais ninguém…
Jorge C. Chora
segunda-feira, 18 de abril de 2011
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E assim vai o Mundo... conhece alguém como ele? Só um?Que sorte!
ResponderEliminarA culpa morre sempre solteira, não é?
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