quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Mamia e os acepipes louletanos

Mamia era doce e rosada como uma amêndoa. Tornar possível o impossível era uma qualidade que lhe estava associada. Claro que havia quem duvidasse, assim como ainda hoje há quem continue a acreditar, que é o sol que roda em torno da terra.

As crianças adoravam o seu modo terno de as tratar e de as levar a bem. Um dia Mamia foi contratada para tratar e brincar com as crianças de uma família muito atarefada. Foi advertida da dureza da tarefa e da enorme dificuldade em dar-lhes de comer, nomeadamente ao lanche.
A prova real tirou-a logo no primeiro dia. Ofereceu-lhes bolo de maçã e a resposta não tardou:

-Não gostamos Mamia…

 -E se for de nozes?

-Também não…

Mamia puxava pela cabeça, variava-lhes os alimentos, dava-lhos a provar e o resultado era o mesmo:

-Não gostamos Mamia…

Ao terceiro dia, quase à hora fatídica, teve de ir ao terraço. De uma chaminé do prédio vizinho, veio-lhe um cheirinho delicioso. Espreitou o edifício donde vinha o aroma e verificou que era o de um restaurante. Passou -lhe pela cabeça uma ideia extravagante. Talvez tivesse viabilidade, pensou. Voltou a entrar em casa, bateu as palmas e exclamou:

-Venham meninos. Hoje não há lanche para ninguém! Venham para o terraço…

Num piscar de olhos apareceram. Mamia convidou-os a sentarem-se e a sentirem o cheirinho que provinha da chaminé do restaurante. Ninguém falou durante alguns minutos.

-Cheira bem, não é… - E inspirava, exagerando a expressão de agrado.

Quando viu que eles estavam rendidos, foi buscar pão, deu um bom naco a cada um e disse:

-E que tal provarmos pão com cheirinho?

Não disseram que não e, todos os dias, à mesma hora, batem as palmas e chamam-na:

-Mamia, está na hora do pão com cheiro…

O pior foi quando começaram a trazer os amigos para a hora do pão com cheiro. Até o filho do dono do restaurante passou a comparecer aos encontros no terraço, à hora sagrada.

PS. Sabem que a Mamia existe e vive em Faro? Sabem que o glutão do pão com cheiro também existe, é louletano, e ainda hoje se lembra da iguaria?

Jorge C. Chora






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