Mamia era doce e rosada como uma amêndoa. Tornar possível o
impossível era uma qualidade que lhe estava associada. Claro que havia quem
duvidasse, assim como ainda hoje há quem continue a acreditar, que é o sol que
roda em torno da terra.
As crianças adoravam o seu modo terno de as tratar e de as
levar a bem. Um dia Mamia foi contratada para tratar e brincar com as crianças
de uma família muito atarefada. Foi advertida da dureza da tarefa e da enorme
dificuldade em dar-lhes de comer, nomeadamente ao lanche.
A prova real tirou-a logo no primeiro dia. Ofereceu-lhes
bolo de maçã e a resposta não tardou:
-Não gostamos Mamia…
-E se for de nozes?
-Também não…
Mamia puxava pela cabeça, variava-lhes os alimentos,
dava-lhos a provar e o resultado era o mesmo:
-Não gostamos Mamia…
Ao terceiro dia, quase à hora fatídica, teve de ir ao
terraço. De uma chaminé do prédio vizinho, veio-lhe um cheirinho delicioso.
Espreitou o edifício donde vinha o aroma e verificou que era o de um
restaurante. Passou -lhe pela cabeça uma ideia extravagante. Talvez tivesse
viabilidade, pensou. Voltou a entrar em casa, bateu as palmas e exclamou:
-Venham meninos. Hoje não há lanche para ninguém! Venham
para o terraço…
Num piscar de olhos apareceram. Mamia convidou-os a
sentarem-se e a sentirem o cheirinho que provinha da chaminé do restaurante.
Ninguém falou durante alguns minutos.
-Cheira bem, não é… - E inspirava, exagerando a expressão de
agrado.
Quando viu que eles estavam rendidos, foi buscar pão, deu um
bom naco a cada um e disse:
-E que tal provarmos pão com cheirinho?
Não disseram que não e, todos os dias, à mesma hora, batem
as palmas e chamam-na:
-Mamia, está na hora do pão com cheiro…
O pior foi quando começaram a trazer os amigos para a hora
do pão com cheiro. Até o filho do dono do restaurante passou a comparecer aos
encontros no terraço, à hora sagrada.
PS. Sabem que a Mamia existe e vive em Faro? Sabem que o
glutão do pão com cheiro também existe, é louletano, e ainda hoje se lembra da
iguaria?
Jorge C. Chora
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