Na amurada
do navio estava encostado um homem grande, sem ser enorme. Estava concentrado
em algo e em silêncio. Pensava em qualquer coisa, mas em quê precisamente,
ninguém sabia.
De repente
ouve-se uma gritaria e dezenas de pessoas a alertarem:
-Cuidado
Gabriela, não corras, tem cuidado, não te aproximes…
E a pequena
Gabriela continuou a correr e não parou. Ao aproximar-se da amurada, deu um
salto, não conseguiu manter-se no corrimão e acabou por cair ao mar.
O homem de
grande tamanho, lançou-se ao mar conforme estava.
Nunca fora
grande nadador, detestava saltar, tinha vertigens e a idade já não lhe agourava
quase nenhuma aventura.
Conseguiu
manter-se à tona, agarrou a petiz gritou:
- Está
salva! Venham depressa que eu já não sou grande nadador!
Tendo o pai
por perto, teve direito a socorro rápido, tendo sido recolhida num tempo breve.
O homem grande debatia-se para manter-se à tona. Foram-se embora todos com a
garota, mas deixaram-no a debater-se com as ondas do mar.
Quando
finalmente o retiraram, estava mais morto que vivo. Não se arrependeu de ter
salvo a petiz, mas se tivesse tido tempo de raciocinar, teria esperado um segundo
e o pai, o ajudante, o segurança e todos os que a seguiam aos gritos, ter-se
iam atirado em seu socorro. A petiz teria sido salva e ele não estaria quase
morto.
Só depois
soube que não seria bem assim. Nenhum deles sabia nadar e a garota foi retirada
dos seus braços por dois marinheiros. A pequena teria morrido sem o socorro
imediato.
O pai era bastante
rico e queria recompensá-lo.
- A minha
recompensa é a miúda estar sã e salva e ver a sua alegria- respondia-lhe Tomás.
Incapaz de aceitar a recusa do salvador,
pediu-lhe por tudo que aceitasse algo, para além do seu eterno reconhecimento.
-Basta-me
ver o seu contentamento…não tenho nem quero dinheiro.
Durante a
viagem ficou o milionário a saber que o Tomás, assim se chamava o salvador da
sua filha, se tornara pobre, pois perdera tudo o que tinha para honrar os
salários dos seus trabalhadores numa grande crise, mas não se importava nada
com isso.
Palavra puxa
palavra, ficou a saber qual o desejo do Tomás, caso tivesse dinheiro. Ele
gostaria de poder ter três cozinheiros.
-Três? -
surpreendeu-se o pai da Gabriela- perante tão estranho desejo.
-Sim. Um
seria um cozinheiro africano, de Moçambique. Nunca conheci na vida quem melhor
soubesse assar leitões, cabritos, galinhas… e em relação aos mariscos… hum…nem
se fala…
- E o
segundo?
-Ah! Esse
seria um do norte de Portugal. As comidas, meu Deus, são divinas…
-E o
terceiro meu amigo?
-Bom, esse
teria de ser um “chef” francês!
-E qual a
razão dessa escolha?
- Meu amigo,
depois das comezainas, vem a dieta! deve comer-se só com os olhos e com um pouco
de cheirinho…fazer restrições, entende?
Heitor,
assim se chamava o pai de Gabriela, estalou os dedos e gritou:
- Concedido.
A partir deste momento, terá os três cozinheiros que deseja.
Tomás
arregalou os olhos e reafirmou:
- Meu amigo
Já lhe disse que não aceito nada e não tenho posses para isso! Isto que acabei
de lhe dizer, é uma fantasia minha!
- Um dos
meus negócios é uma cadeia de restaurantes e tenho o pessoal que pretende.
Todos os dias, à sua escolha, um deles irá a sua casa confecionar-lhe as
refeições. E não diga que não, porque eles só estão a fazer o serviço que lhes
compete e já estão pagos!
Tomás ficou
indeciso. E não lhe dando tempo para recusar, Heitor voltou à carga:
-Mas há uma
condição… tem de me convidar a comer consigo, não só porque sou comilão, mas
também pelo facto de saber se nos afogarmos em bom vinho, tenho quem me salve
de morrer afogado! Ah! e nos dias do “chef” francês, passo, dietas não são
comigo!
Jorge C. Chora
2/04/2022
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