Quando lhe perguntavam o que fazia, Bitri respondia, sem pestanejar: caçador.
Irritavam-se os amigos, os pais, os conhecidos e os parentes, com semelhante
resposta.
-Caçador? Em Lisboa?
-É como disse .-
respondia Bitri- E continuava a fazer o que estava a fazer, ou seja,
nada de nada.
Morava lá para os lados da Madragoa e todos se recordavam de
que a primeira profissão ambicionada por Bitri era o de soprador de peixes.
-Soprador de peixes? Onde foste buscar essa ideia?
-Então não sabem?
-O quê Bitri? Explica-nos!
-Essa era a profissão dos meus bi e trisavôs,que o meu nome
homenageia, ambos casados com ovarinas que aqui se estabeleceram. Eles sopravam
o peixe, para os tornar mais gordos e apetecíveis, para que se vendessem
melhor…
-Mandriões… - comentavam os ouvintes – Mas tu és bem pior do
que eles! Caçador, essa não lembra ao diabo!
Bitri esgueirava-se cerca das dezasseis horas, do seu poiso
habitual. Cosia-se com as paredes, verificava se ninguém o seguia e desatava a
correr para local desconhecido.
Fartos do mistério, um dia postaram-se em sítios
estratégicos e conseguiram segui–lo. Avançou e recuou e não muito longe do
local onde morava, entrou numa pequena praceta com uma árvore ao meio. Ouviu-se
um chilrear ensurdecedor. Debaixo da árvore existia uma mesa e uma cadeira,
pertencente a uma taberna de petiscos.
Bitri dirigiu-se à mesa da praceta. Sentou-se e, sem que
nada tivesse pedido, serviram-lhe um enorme copo de vinho e grande prato de
lentilhas.
Passado um bocado o dono da tasca assomou à porta e gritou:
-Bitri, já temos clientes para os passarinhos.
Bitri alçou a perna e ouviu-se um estrondo medonho. Um cheiro
pavoroso quase os asfixiou e, em simultâneo, viram cair inúmeros pássaros no
chão.
Passado um bocado, um cheiro a pássaros fritos pairou no ar.
Desde esse dia, ninguém mais colocou em dúvida o título
profissional de Bitri. O problema que entretanto surgiu foi o de aparecerem
cada vez mais candidatos a caçadores em Lisboa.
Bitri pensa, seriamente, em abrir uma escola de caçadores na
capital.
Jorge C. Chora
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