Sentava-se todos os dias, à esquina do jardim, num banco de
ferro forjado que ali existia. Ninguém sabia ao certo desde quando ele para ali
fora. As pessoas tinham a sensação de o terem sempre visto naquele local.
Chegava por volta das oito da manhã e trazia uma caixa de
madeira que depositava no chão, à sua frente.
Raro era o transeunte que não conhecesse. Sabia-lhes os
nomes, as profissões, a morada e os hábitos.
Após breves diálogos, mantidos com quem passava, abria por
vezes a caixa, retirava um parafuso e oferecia-o ao seu interlocutor,
utilizando sempre a mesma expressão:
- Desejo-lhe as melhoras…
Neste momento ofertava a prenda ao dono de um café, que se
habituara a dar a mesma resposta a quem lhe perguntava se os bolos eram
frescos: estão frescos, estão no frigorífico -e impingia-os já com dois e três
dias de existência.
Logo a seguir, a um senhor que falava de assuntos que lhe
eram desconhecidos, criticando-os como se fosse um entendido, deu-lhe dois
parafusos, acrescentando um desejo:
-As duplas melhoras…
Tantas ofertas fez que um dia, alguém que tinha acabado de
receber a prenda do costume, se enxofrou:
-E não se oferece a si próprio um parafuso que lhe falta?
-Claro que sim! Para onde julga que vão os parafusos que
sobram ao fim do dia?
Jorge C. Chora
5/11/19
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