sábado, 30 de novembro de 2019

JUSTIÇA CANINA



O casal sentou-se a ler os jornais do dia, numa confortável sala de uma junta de freguesia. Ela optou pela poltrona e ele sentou-se, a seu lado, mas num sofá de dois lugares.
O sossego e o ambiente de silêncio não opressivo, criavam um bem-estar natural, adverso a snobismos e propício ao que o casal procurava: passar algum tempo de qualidade antes do almoço.
Vozes altas, num diálogo audível em todo o espaço, rasgaram o silêncio e impingiram a todos os presentes, assuntos que, à partida, nada lhes interessavam.
No sofá de dois lugares, atirou-se para o espaço vago, um homem de meia idade, bem vestido e trombudo, sem dizer sequer “ bom dia”. Desfolhou revistas e jornais, afivelando uma máscara seráfica, até que deixou cair uma série de folhas da revista que lia ou fingia ler.
As folhas espalharam-se no chão. A senhora levantou-se, apanhou-as e deu-lhas. O homem continuou a ler, não as recolheu, nem sequer se dignou a agradecer o gesto. A senhora pousou as folhas no sofá, no lugar do seu marido que tinha ido arrumar os jornais.
À saída, quando o homúnculo acabara de transpor as portas, um cão sarnento rosnou-lhe, alçou a perna e urinou-lhe as calças enquanto ele, trémulo, lhe dizia:
-“Tadinho”… “tadinho”…estavas cheio de vontade de fazer chichi…
E o cão sarnento, continuou a sua tarefa, até lhe deixar as calças a pingar.
E a senhora, contendo o riso, consolou-o:
-Não se envergonhe, a incontinência urinária pode atingir qualquer um…

Jorge C. Chora

30/11/19

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