segunda-feira, 6 de abril de 2020

A PROFECIA DA CUCA



Desesperava a taberneira Antónia ao ver a sua casa deserta semanas a fio. Faltavam-lhe os clientes e o que mais gostava de ouvir: o tilintar das moedas a caírem na sua caixa registadora.
À porta viu o primeiro cliente e já passava do meio dia.

-O que é tu queres ó Cuca? -perguntou de modo desabrido.

-Bons modos e alguma simpatia…

Antónia arregalou os olhos e franziu na testa. Até o raio da Cuca se atrevia a falar-lhe assim, pensou.

-Como hei-de estar se o negócio está deste modo… -E apontava o espaço sem vivalma.

-Vou ajudar-te… - prometeu a Cuca.

Antónia arrepiou-se. A Cuca-Bruxa ia ajudá-la? Onde é que a coisa já ia, pensou.
E a Cuca falou assim:

-Basta que subas à pipa atrás do balcão e o primeiro homem que aqui entrar, vai salvar-te a ti ou ao teu negócio… - e dito isto, saiu.

Mal a Cuca acabara de sair, quando a maçã camoesa que Antónia tinha no cimo do pipo a aromatizar o vinho, lhe rolou aos pés. Subiu a um banco, e quando já nele estava empoleirada, o banco caiu.

Agora é que são elas…o raio da Cuca e das profecias…! -exclamou.

E quando estava a resvalar, sentiu-se levantada ao ar e aninhada ao colo de um verdadeiro urso, tão grande e peludo era o homem que a segurava.

-Mas o que está a fazer! - repreendeu Antónia, com a acrimónia habitual.

-A salvá-la minha senhora! Caso queira regressar ao pipo… -E fez menção de a recolocar no mesmo sítio.

Um súbito bem-estar apoderou-se de Antónia. Pôs-lhe a mão no peito e pediu-lhe desculpa, enquanto ele a colocava no chão, de modo suave.

-O que quer beber? - ofereceu Antónia à laia de agradecimento.

-Uma taça de vinho d’amor, do seu amor ao pipo que estava a abraçar…- brincou o senhor.

E quando ela se voltou, já o seu salvador desaparecera e à porta estava a Cuca que lhe perguntou:

-Agora que tens o vinho d´amor, tens de decidir se queres o tilintar das moedas na tua caixa ou o amor do teu salvador.

E a Antónia, com um ar emproado, sem sequer lhe dar troco, dirigiu-se ao exterior da taberna e escreveu no quadro negro:

                        TAÇA DE VINHO D’AMOR EM PROMOÇÃO – O,40

E Cuca sorriu e disse-lhe:

-Quem saúde tem e amor não quer, despreza o que mais lhe convém…

E na casa de Antónia, envolta em solidão, mau humor e ingratidão, nem a Cuca conseguiu que o dinheiro tornasse a tilintar.

Jorge C. Chora

   6/4/2020

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