quarta-feira, 8 de dezembro de 2021

A MINHA TIA- AVÓ


A minha tia-avó Ivana, há muito falecida, era pequena e leve como uma pena. O vento só não a levava porque ela não gostava de voar e tinha decidido ficar em terra, custasse o que custasse.

Para além da sua estatura, tinha um sinal no nariz, que lhe dava um ar travesso, talvez, como direi, um aspeto de pequena bruxa boa. Era dotada de um feitio especial e nunca se irritava: resolvia tudo a bem e o que não tinha remédio, remediado estava.

Adorava a criançada e nunca ralhava, aliás, como já disse, mas reforçar este aspeto, no caso dela, não é demais, como fica comprovado no episódio que vou contar e que me contou o meu pai, também há muito falecido.

Um dia a minha tia Ivana, não sei por que razão, teve de dar almoço a uma caterva de netos, sobrinhos e alguns dos seus amigos.

Sabia por experiência própria que a gaiatada adorava bifes, com batatas fritas e ovos estrelados.

À medida que fritava as batatas e as ia colocando numa enorme travessa, os miúdos entravam à vez na cozinha, iam comendo e saindo à socapa ou pelos assim achavam eles.

À hora da refeição, vieram os bifes, os ovos estrelados e a grande travessa de batatas fritas. Ficaram todos a olhar para a travessa: ela só tinha meia dúzia de batatas.

-Só isso? Tão poucas para tantos?

Impávida, a tia Ivana, contrapôs:

-Fritei tantas batatas quantas cabiam na travessa! Os meninos já as comeram na cozinha!

E a miudagem desencadeou um rol de críticas e acusações mútuas:

-Tu é que comeste mais…

-Eu? Só fui três vezes à cozinha…

-O que interessa não são as vezes que foste, mas a quantidade que comeste…

E a discussão ia já longa, quando a tia resolveu intervir:

-O que não tem solução solucionado…

-Solucionado está! - completaram em uníssono os comilões.

Então, para o futuro, para que o problema não se repita, o que é preciso fazer?

-Ninguém entra na cozinha para comer o almoço, antes deste ir para a mesa.

E nunca mais faltaram batatas fritas, nos dias dos bifes, batatas fritas e ovos estrelados.

A sapiência dos antigos era assim.

 

Jorge C. Chora

8/12/2021

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