O bairro era
habitado por inúmeros larápios: uns roubavam por necessidade, outros por vício.
A maior parte pertencia à segunda categoria, a dos viciados.
Mas era
exatamente nesse local que existia um lendário comerciante, que se intitulava
de vendedor de artigos voadores. Vendia fruta e pequenos tapetes, sempre no
mesmo local, há tantos anos que já
tinha perdido o conto.
Era às segundas-feiras
que a freguesia abundava e havia sempre algum novato a iniciar-se nas lides do
alheio ou um já batido, a tentar a sua sorte na confusão.
O azar
batia-lhes à porta, tão depressa e tão certeiro, que nem eles esperavam. Uma
maçã, laranja ou a fruta que ele estivesse a vender, era arremessada com tal
precisão que se esborrachava nas suas cabeças ouvindo-se quase em simultâneo
dois gritos:
- Ora toma
-gritava o vendedor enquanto atirava.
-Ai –
queixava-se o abafador, após apanhar com a fruta.
Tratando-se
do tal bairro especial, recorde-se de que abundavam os viciados no roubo,
depressa engendraram uma forma mais adequada de se apossarem do que não era
deles.
Os roubos
passaram a ser executados por dois meliantes. Um fazia a vezes de avançado e o
outro de guarda-redes. Roubavam e ainda tinham o bónus da fruta que o vendedor
atirava e o especialista encaixava.
O vendedor
depressa engendrou o contra-ataque. Trouxe o boxer que tinha em casa e à ordem
de avançar, mordia o que os ladrões tinham pendurado no meio das pernas. Com a
atrapalhação, não apanhavam a fruta a tempo e levavam em cheio com ela.
Como a
necessidade aguça o engenho, os viciados rapinaram coquilhas numa loja de
desporto, e lançavam-se à fruta, com todo o à-vontade.
As ordens
para o boxer mudaram:
- Morde o rabo!
E as
reuniões dos meliantes, passaram a ser feitas de pé, numa praça, à vista de
todos, uma vez que não conseguiam sentar-se.
Jorge C.
Chora
22/12/2021
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