quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

O VENDEDOR DE ARTIGOS VOADORES


O bairro era habitado por inúmeros larápios: uns roubavam por necessidade, outros por vício. A maior parte pertencia à segunda categoria, a dos viciados.

Mas era exatamente nesse local que existia um lendário comerciante, que se intitulava de vendedor de artigos voadores. Vendia fruta e pequenos tapetes, sempre no mesmo local, há tantos anos que já   tinha perdido o conto.

Era às segundas-feiras que a freguesia abundava e havia sempre algum novato a iniciar-se nas lides do alheio ou um já batido, a tentar a sua sorte na confusão.

O azar batia-lhes à porta, tão depressa e tão certeiro, que nem eles esperavam. Uma maçã, laranja ou a fruta que ele estivesse a vender, era arremessada com tal precisão que se esborrachava nas suas cabeças ouvindo-se quase em simultâneo dois gritos:

- Ora toma -gritava o vendedor enquanto atirava.

-Ai – queixava-se o abafador, após apanhar com a fruta.

Tratando-se do tal bairro especial, recorde-se de que abundavam os viciados no roubo, depressa engendraram uma forma mais adequada de se apossarem do que não era deles.

Os roubos passaram a ser executados por dois meliantes. Um fazia a vezes de avançado e o outro de guarda-redes. Roubavam e ainda tinham o bónus da fruta que o vendedor atirava e o especialista encaixava.

O vendedor depressa engendrou o contra-ataque. Trouxe o boxer que tinha em casa e à ordem de avançar, mordia o que os ladrões tinham pendurado no meio das pernas. Com a atrapalhação, não apanhavam a fruta a tempo e levavam em cheio com ela.

Como a necessidade aguça o engenho, os viciados rapinaram coquilhas numa loja de desporto, e lançavam-se à fruta, com todo o à-vontade.

As ordens para o boxer mudaram:

- Morde o rabo!

E as reuniões dos meliantes, passaram a ser feitas de pé, numa praça, à vista de todos, uma vez que não conseguiam sentar-se.

 

Jorge C. Chora

22/12/2021

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