quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

A IMPORTÂNCIA DO CASTELO


Alice achou estranho a importância dada ao castelo naquela localidade. Volta meia-volta, as pessoas diziam que tinham de ir ao castelo.

O mais curioso é que Alice, por muitos esforços que fizesse, não conseguia vislumbrar castelo nenhum.

Caía a tarde quando a pequena Joana pediu à mãe para ir com ela ao castelo.

-Outra vez? Já foste de manhã e depois do almoço!

Alice tomou atenção ao pedido. Desta vez desvendaria o mistério do castelo invisível.

Seguiu a mãe e a Joana pelos caminhos pedregosos da aldeia. Sempre a subir, por uma calçada constituída por pedras irregulares, quer na forma quer no tamanho e na altura, tropeçou a cada passo. O pior foi depois, quando deixou de haver calçada e seguiram morro acima, derrapando a todo o momento.

Joana e a mãe, ao verem a estranha atrás de si perguntaram-lhe:

- Também vai ao castelo?

-Sim quero ir, não se importam que vá convosco?

-De nada, assim fazemo-nos companhia umas às outras, não vá aparecer-nos uma alma penada, que se está a fazer tarde!

E a escalada continuou por um bom bocado mais. Chegados ao topo do morro, encontram três pessoas, dois homens e uma mulher, agachados.

Se quer vá ali atrás da moita e alivie-se. Se não tiver papel, há ali umas folhas…

Estava explicado o mistério das idas ao castelo. Mas castelo por que razão?

A mãe de Joana, após o respetivo alívio explicou-lhe:

- Dizem que aqui houve, em tempos idos um castelo dos mouros… enquanto não fizerem lá em baixo, uma casa de alívio, temos de continuar a vir aqui. Mas nem tudo é mau. Olhe, foi aqui que escolhi o meu marido…

Eis senão quando Alice vê um jovem adulto do qual não conseguiu despregar os olhos. Do lugar onde ela estava, ele não a conseguia vê-la. Achou-o maravilhoso ao lusco-fusco. Ficou encantada, mas recordou-se do fiasco do seu relacionamento anterior. Ficara hipnotizada, na altura, ao vê-lo surgir, numa noite de estúrdia estudantil, todo nu das águas do mar, como um belo ser mitológico e afinal, acabara muito mal porque era tudo menos isso.

 Resolveu conhecer este Adónis, antes de se render. Dirigiu-se -lhe, quando ele já estava composto, pediu-lhe imensa desculpa e formulou-lhe um pedido:

- Estou cheia de medo, posso pedir-lhe para depois me acompanhar até à casa onde estou alojada?

Ele olhou-a surpreso. Deu-lhe o braço e pediu-lhe que tivesse cuidado ao descer porque podia escorregar e aleijar-se.

Inconscientemente, Alice decidira ficar naquele fim de mundo. Era enfermeira e haveria onde trabalhar.

Em conversa com o seu cavaleiro andante, soube que ele era o presidente da Junta local. Referiu-lhe o seu propósito de ficar lá a viver.

- Aqui? Não lhe aconselho, embora fosse muito bom para nós todos!

Se decidir, farei o possível por lhe arranjar alojamento condigno! E uma sala na Junta para trabalhar! Mas pense bem, nem casas de banho públicas temos e a maioria das casas privadas também não! Estou a construir uma casa de alívio que só estará pronta daqui a um mês.

Alice não resistiu. Era impulsiva demais e confiou num segundo sentido que esperava estar certo desta vez:

-Gosto de si, acho-o verdadeiro e gostei ainda mais do que vi lá no castelo…

Mateus, assim se chamava o Presidente, enrubesceu, gaguejou e foi incapaz de dizer uma só palavra que fosse…

À despedida Alice beijou-o na face e disse-lhe.

-Amanhã vou ter consigo para combinarmos melhor a minha permanência…

Dez anos depois, já com três filhos, sempre que Alice se cruzava com a mãe de Joana, piscava-lhe o olho e cumprimentavam-se:

- Abençoado Castelo…

- Abençoado seja!

   

     Jorge C. Chora

       23/02/2022

Sem comentários:

Enviar um comentário