segunda-feira, 19 de abril de 2010

A Pega Rabuda

Quando o sol incidia nas suas penas pretas, elas reflectiam uma paleta de azuis, verdes e vermelhos. Os mirones andavam em redor da gaiola, buscando captar-lhe toda a beleza. A pega abria as asas, espreguiçando-se de uma forma dengosa, expondo-se o mais possível, tirando partido do espectáculo dado pelas suas reluzentes penas.

Miúdos e graúdos juntavam-se em redor da gaiola. O dono sorria, olhava para a sua lucrativa pega rabuda e fazia-lhe sinais disfarçados: levantava o polegar direito (muito bem) e pouco depois o polegar esquerdo (continua).
A pega entendia tudo e dava-se ao luxo de lhe responder:

-Tchak tchak (sim) - e deixava que mais pessoas se juntassem para a ver.

Depois lançava outro sinal sonoro:

-Choc…Tchak ( é agora)

O proprietário chegava-se e colocava um cartaz na gaiola: Dá a liberdade à pega só por dez euros.

-O que é que o senhor quer dizer?

-Quero dizer que se fizerem uma recolha entre os que aqui estão, de 10 euros, eu dou a liberdade ao pássaro.

- Dá a liberdade? - surpreenderam-se uns quantos mirones.

-Sim…abro a gaiola e deixo-o fugir.

Logo que o peditório era feito a promessa era cumprida. A gaiola era aberta e o dono despedia-se da pega:

-Adeus minha linda…

E a pega, sem qualquer demora, abria as asas e voava para longe dali. Ia direitinha para casa, ou melhor, para a gaiola onde se encontravam outras pegas, na casa do seu dono.

O negócio ia de vento em popa. A pega era bem recompensada com insectos seleccionados e o dono tinha sempre aqueles dez euros garantidos com a artimanha.

A pega tornou-se, à medida que o tempo passava, cada vez mais conversadora e vaidosa.

Um belo dia, um jovem esperou pelo abrir da gaiola e quando a pega saiu, foi atraída por uma outra pega tão bela como ela, dentro de uma gaiola com a porta aberta.
Mal entrou ,deu pelo logro: não havia nenhum pássaro, mas somente um espelho.

-Tchak…rroach…choc (estou tramada) - lamentou -se.

-E eu também! - desabafou o ex-dono.


Jorge C. Chora

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