segunda-feira, 4 de abril de 2016

O BRIO ÀS URTIGAS

                                        
Farto de ter carros velhos, despesas com oficinas, avarias permanentes e sem aviso prévio, resolvi comprar um pequeno utilitário novinho em folha. Feitas e refeitas as contas, lá chegou o dia em que o fui buscar e contrair uma dívida que levei cinco penosos anos a pagar.

O automóvel estava tapado, tal e qual uma prenda de natal. O vendedor, decerto amante da tauromaquia, tratada a burocracia, num passe de mágica, aproximou-se e efectuou uma chicuelina, revelando o reluzente objecto da minha cobiça.

Fui até Benfica, uma viagem bem curta, e fui surpreendido por um estranho barulho vindo do motor. Mau, pensei, ainda nem sequer estriei o carro e já tenho avarias?

Regressei ao stand e à sua respectiva oficina. Veio ter comigo um senhor de meia-idade, com um bloco na mão, trajando uma impecável bata branca, tão aprumado que me fez recordar um membro do corpo docente dos liceus da minha época.

Queixei-me da avaria e levantei o capô. O senhor olhou, viu uns fios pendurados e diagnosticou:

-Isto são uns fios sem interesse…não têm qualquer função…podem ser retirados…Já volto.

Vi a minha vida a andar para trás. Um carro novo com fios a mais? E nessa altura passou por mim um homem novo com um fato de macaco a quem pedi ajuda e disse o que se estava a passar.

-Fios sem interesse? Este recepcionista tem a mania que é mecânico! – E explicou-me que os” fios” se destinavam ao aproveitamento dos gases do motor “fire”.

Resolveu-me o problema, encaixando os tubos nos respectivos lugares, o que se tinham esquecido de fazer antes de mo entregarem.

Dois dias depois, ao fazer a marcha -atrás, o meu filho alertou-me para o facto das luzes não acenderem. Dirigi-me de imediato à oficina, onde deparei com o mesmo recepcionista.

-Luzes de marcha - atrás? Este modelo não tem!

Nem sequer reagi. Dirigi-me ao mecânico, e ele disse-me:

-Não lhe dê atenção. Este modelo tem duas pequenas peças de plástico deficientes. Não fizeram a revisão antes de lhe entregarem o automóvel!

Em minutos ficou tudo resolvido.

Este carro serviu-me durante anos a mim e também ao meu filho que o “herdou”.

Quanto ao recepcionista, que eu saiba, nunca chegou a ser aprendiz de mecânico.

Jorge C. Chora



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