Farto de ter carros velhos, despesas com oficinas, avarias permanentes e sem aviso prévio, resolvi comprar um pequeno utilitário
novinho em folha. Feitas e refeitas as contas, lá chegou o dia em que o fui
buscar e contrair uma dívida que levei cinco penosos anos a pagar.
O automóvel estava tapado, tal e qual uma prenda de natal. O
vendedor, decerto amante da tauromaquia, tratada a burocracia, num passe de
mágica, aproximou-se e efectuou uma chicuelina, revelando o reluzente objecto
da minha cobiça.
Fui até Benfica, uma viagem bem curta, e fui surpreendido
por um estranho barulho vindo do motor. Mau, pensei, ainda nem sequer estriei o
carro e já tenho avarias?
Regressei ao stand e à sua respectiva oficina. Veio ter
comigo um senhor de meia-idade, com um bloco na mão, trajando uma impecável
bata branca, tão aprumado que me fez recordar um membro do corpo docente dos
liceus da minha época.
Queixei-me da avaria e levantei o capô. O senhor olhou, viu
uns fios pendurados e diagnosticou:
-Isto são uns fios sem interesse…não têm qualquer
função…podem ser retirados…Já volto.
Vi a minha vida a andar para trás. Um carro novo com fios a
mais? E nessa altura passou por mim um homem novo com um fato de macaco a quem
pedi ajuda e disse o que se estava a passar.
-Fios sem interesse? Este recepcionista tem a mania que é
mecânico! – E explicou-me que os” fios” se destinavam ao aproveitamento dos
gases do motor “fire”.
Resolveu-me o problema, encaixando os tubos nos respectivos
lugares, o que se tinham esquecido de fazer antes de mo entregarem.
Dois dias depois, ao fazer a marcha -atrás, o meu filho
alertou-me para o facto das luzes não acenderem. Dirigi-me de imediato à
oficina, onde deparei com o mesmo recepcionista.
-Luzes de marcha - atrás? Este modelo não tem!
Nem sequer reagi. Dirigi-me ao mecânico, e ele disse-me:
-Não lhe dê atenção. Este modelo tem duas pequenas peças de
plástico deficientes. Não fizeram a revisão antes de lhe entregarem o automóvel!
Em minutos ficou tudo resolvido.
Este carro serviu-me durante anos a mim e também ao meu
filho que o “herdou”.
Quanto ao recepcionista, que eu saiba, nunca chegou a ser
aprendiz de mecânico.
Jorge C. Chora
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