O “Nove Dedos” era um homem de baixa estatura, mas
encorpado, com cara de limão, de acordo com Luciano Rolão, que o viu inúmeras
vezes e lhe conhecia a fama de malquisto.
Trazia sempre uma chibata numa mão e na outra um livro para
passar multas. Utilizava-o de modo intenso e diário e não cedia a rogos nem
choradeiras: confiscava a mercadoria às vendedeiras e de seguida multava-as sem
dó nem piedade, a bem da nação e da ordem pública. Era o terror das vendedeiras
clandestinas que exerciam a profissão fora do mercado da 24 de Julho,
nomeadamente na Rua da Ribeira Nova ao Cais do Sodré, em Lisboa.
O homem de que Luciano fala era um polícia ou melhor, um
comissário, que se deslocava num jipe, idêntico aos que se utilizavam na 2ª Guerra
Mundial, com capota de lona. Para além do condutor, era sempre acompanhado por
um guarda.
Um belo dia, no exercício da sua actividade fiscalizadora e
confiscadora, uma vendedeira com pêlo na venta, engalfinhou-se com o
comissário, deu-lhe uma tal dentada, cuja consequência foi o homem passar a contar com menos um dedo
e daí em diante ser conhecido como o
“Nove Dedos”.
As dentadas e o puxar de cabelos, faziam parte do arsenal de
algumas varinas e vendedeiras na década de cinquenta e sessenta. Diz-nos
Luciano, que as suspeitas e ciúmes que elas tinham em relação aos maridos e às
outras mulheres, eram o rastilho mais habitual das zaragatas.
Seja como for, o ”Nove Dedos” não deixou de continuar a ser
uma dor de cabeça para os comerciantes, clandestinos ou não. Serafim Milho
também se lembra da fama deste comissário e de na Rua General Taborda, logo que
algum comerciante o via, telefonava aos outros para fecharem as portas.
Jorge C. Chora
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