sábado, 1 de agosto de 2015

O PROFETA


Largou o calhamaço em cima da mesa e esta vergou devido ao seu peso. Pousou a mão sobre ele, afivelou um ar sério e num tom de voz tonitruante falou assim à assembleia:

-Com a autoridade que me dão as minhas leituras e reflexões, cabe-me esclarecer, bom povo aqui presente, que há só um modo de vencer a crise: é pelo trabalho árduo, pelo suor derramado. Mas este suor de que venho falar-vos, é mais do que uma figura de estilo. É ele que vos vai ajudar a ganhar, desde este momento, o dinheiro que tanta falta vos faz.

A assembleia agitou-se e redobrou a atenção.

-Como fazer? Tomem o máximo de atenção, pois é preciso cumprir algumas normas. O primeiro passo é inscreverem-se naquela mesa e pagarem uma quantia simbólica. O segundo é comprarem, por um preço acessível, uma proveta com a qual recolherão todas as gotas de suor possíveis, sejam vossas ou de outrem. A que se destinam essas gotas de suor? Devem ser entregues na fábrica de essências, pois com elas se farão perfumes, bastando inscreverem-se como compradores dos mesmos, para constarem na lista de fornecedores da matéria-prima. Os primeiros mil a inscreverem-se, terão direito, mediante o pagamento de uma módica quantia, a serem vendedores da fábrica.

Uma multidão desesperada avançou para a mesa de inscrições de modo desordenado, lançando o cartapácio ao chão. O neto de um dos assistentes, mira o alfarrábio e grita sem parar:

-O livro não tem nada escrito! Nem uma linha!

Quando a multidão tornou a olhar para a mesa do orador, já ele lá não estava e pairava no ar um cheiro a enxofre.


Jorge C. Chora

Sem comentários:

Enviar um comentário