Por volta de 1966,os meus pais tiveram, ao fim de muitos
anos de trabalho, direito a gozar uma licença graciosa. Vieram eles e viemos
nós, eu e o meu irmão.
Logo no início das férias o meu pai teve de tratar de um
assunto em Lisboa, creio que de seguros, numa morada algures no Bairro Alto.
Depois de calcorrearmos ruas e vielas, de subirmos e
descermos, de perguntarmos a muitos transeuntes se sabiam indicar-nos a
malfadada morada, ouvimos quase sempre a mesma resposta:
-Desculpem mas não somos daqui… -E miravam-nos, a mim e ao
meu irmão, enormes(para a época) e eu, um autêntico texugo, mas de pouca idade,
de calções como era o hábito em Moçambique, como se estivessem na presença de
dois extraterrestres.
Nunca tínhamos estado numa terra em que não encontrássemos
os naturais. Continuámos com a busca até que o meu pai, exasperado exclamou:
-Estamos perdidos…se
ao menos soubesse onde estamos!
-Ó pai, mas isso sei eu!
-Então diz, já ajudas em alguma coisa… - e esboçou um sorriso
de esperança.
Não me fiz rogado:
-Estamos na rua dos cansados!
O meu progenitor engasgou-se, abriu os olhos
desmesuradamente e…por fim, comentou:
-Esse teu humor ainda me mata!
E foi quando vislumbrámos, por acaso, o nome da rua que
tanto procurávamos. Encontrado o número da porta, obtivemos uma informação
inesperada: a companhia mudara para um local bem longe dali, para os lados de
Santos, julgo eu.
No dia seguinte, antes de partirmos à descoberta da nova
direcção, fui advertido:
-Não venhas de novo com a história da rua dos cansados…
-O pai tem razão, aqui não é como lá…lá andamos trezentos
quilómetros para beber um café e ajudar a fazer a digestão. Aqui andamos uns
metros e achamos que fizemos uma viagem de circum-navegação…
-Mau..é a nova versão da rua dos cansados?
E não sei se foi por esta e por outras, que eu e o meu irmão
ficámos internos no Colégio de S. José e Stª Maria, em Mangualde, e eles
regressaram felizes e contentes a LM
.
Só dois anos depois é que voltámos a LM e a atenazar os
“velhotes”.
Jorge C. Chora
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