quarta-feira, 5 de outubro de 2022

NO BAIRRO DO FEDE-FEDE


A casa era aceitável, localizada numa pequena praça, com um jardinzinho de margaridas. Alugaram-na para a benjamim da família. Vinha estudar antropologia, seguindo os passos do seu adorado avô, ainda que a contragosto do mesmo: muito esforço para poucas contrapartidas - mas se gostas- e inchava de orgulho pela opção da neta.

Depressa se apercebeu o velho progenitor, de que o bairro não só tinha má fama, como também os próprios moradores a alimentavam, através de uma teia de “mentideiros”. Tudo o que dele se propalava, acaba por ser verdade ou ainda pior.

Deu uma volta pelo bairro da neta. Bebeu um copo aqui e outro ali, pagou umas cervejas e soube que a fonte da má-língua era proveniente da taberna, em frente da casa da sua neta.

Num dia de casa cheia, o velho sábio, acompanhado de outros netos, a maior parte de informática, foi jantar a esse local. A determinada a altura, ligaram o computador em alto som e anunciaram aos clientes, com muito ênfase, que a própria televisão ia falar do restaurante

-Silêncio gritou o dono:

- Estamos na TV! Nem um pio!

E o noticiário relatava que uma instituição tinha atribuído um avultado prémio devido à qualidade de vida, conservação, cuidados dedicados às praças e jardins do bairro, e que a contestação tinha sido imediata por parte de todos os bairros circundantes. O motivo unanimemente alegado, era a má-língua! O prémio tinha sido de imediato retirado!

Nesta altura, o restaurante em peso se virou para o dono, e sem dizer uma palavra fingiu estar a chorar!

-Ah! Grandes canalhas! Quem dá e tira vai para o inferno! Eu logo vi que as bebedeiras e as zaragatas que esses tipos da TV armaram aqui, iam dar mau resultado! - bradava o arruaceiro do taberneiro da má-língua.

 

 

Jorge C. Chora

5710/2022

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