Quando Filipe anunciou o seu propósito de ir para academia
de polícia, os pais entreolharam-se e nada disseram. Não eram os seus sonhos. O
pai sonhava vê-lo como um matemático e a mão com um investigador de doenças
raras.
Ficaram triste e calaram a sua tristeza. Afinal, a vida era
dele. No curso ficou conhecido como o coca bichinhos: nada lhe escapava.
Terminou-o com brilhantismo.
Casou-se com uma senhora, por quem se apaixonou, sem
qualquer referência, caída do céu.
Teve como primeira colocação uma bonita e desenvolvida Vila.
Logo no primeiro mês, começou a notar frequentes ausências
da esposa. Achou de mau tom interrogá-la sobre onde ia e o que fazia…
A vila começou a olhá-lo de viés. Algo se passava. Pôs-se em
campo e descobriu um armazém semiabandonado, no meio da vila, donde provinham
gritinhos de prazer que não lhe eram estranhos.
Abriu a porta e o que viu derrubou-o. A sua mulher, nua, a
fazer amor, com um estranho. Nunca mais foi o mesmo.
Na vila já todos sabiam. Afogou quanto pode, as suas mágoas
na bebida do bar da Ermelinda.
Ermelinda simpatizava com Filipe. Arranjou-lhe uma sala no
interior do bar para que não o vissem beber e falou-lhe francamente.
-O senhor chefe não se vai penalizar-se por uma má escolha
que fez. Para a frente é que é o caminho. Cabeça levantada e para próxima, uma
escolha com mais critérios!
Um dia apareceu morta uma jovem mulher. Acorreu ao
acontecimento, oscilando.
-Alguém mexeu no cadáver? - a voz tornara-se imperativa,
-A senhora não transportava nada? Nem mala nem documentos.
-Alguém assistiu ao acidente?
Ninguém vira nada!
Mudou de estratégia. Quantos carros entraram na vila? e dirigiu
a pergunta aos eternos frequentadores do banco, em frente ao bar da Ermelinda.
-Não sabemos. Filipe enfureceu-se:
-Toca a anda a par a esquadra. Uma noite no calabouço
reaviva-vos, a memória.
Ante disso revistou o cadáver. Tinha no bolso um catão
amarrotado, do Sindicado dos Professores.
-Ah! Ela era professora!
-A escola estava à espera de uma professora, informou
Ermelinda.
E quem sabia disso?
- A filha do presidente, que tinha de sair mal chegasse uma
professora habilitada.
Filipe voltou ao lugar do crime. Observou em redor e viu uma
grande árvore com um lenho,
- Isto foi aqui na vila, todos viram e ninguém diz nada. Só
pode ser pessoa grada. A filha do presidente é que tinha mais a perder. Pediu
ao juíz para ir á garagem da Câmara Municipal, com urgência, porque podiam desparecer
vestígios num ápice.
Lá estava o jipe com para-choques amarrotado.
De nada lhe serviu querer endossar as culpas para os motoristas.
Estavam todos no banco da Ermelinda.
Ermelinda foi a primeira felicitá-lo pela resolução rápida e
eficiente do caso.
Nunca mais alguém fez troça do chefe.
Jorge C. Chora.
2/9/ 2022
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